Diálogos da Fé

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Diálogos da Fé

“Não tenham medo”

O velho argumento ‘não voto em ninguém, porque nenhum político presta’ não cabe mais em nossa realidade

FOTO: FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL FOTO: FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL
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Quem dentre nós não sentiu medo de algo ao longo da vida? Por vezes, o medo que sentíamos era posto em nós por meio de ameaças que sofríamos por parte da mãe e do pai, ou ainda dos avós, que usavam até mesmo o nome de Deus para nos convencer a não praticar certas coisas. Por quantas vezes ouvimos: “não faça isso, Papai do céu não gosta”. “Olha fulano se você fizer isso de novo Deus vai te castigar”. Estes são exemplos inocentes de determinados medos que sentíamos.

 

Mas, o que é o medo? Como ele atua em nossas vidas? Que mudanças ele pode provocar em nosso modo de pensar? São perguntas que filósofos, sociólogos, psicólogos e outros profissionais buscam responder há muitos anos.

Os dicionários apontam que a palavra “medo” significa uma espécie de perturbação diante da ideia de que se está exposto a algum tipo de perigo, que poder ser real ou não. Pode-se ainda entender o medo como um estado de apreensão, de atenção, esperando que algo ruim vá acontecer.

Indo além das definições da palavra, o medo é uma sensação ligada a um estado em que o organismo se coloca em alerta, diante de algo que se acredita ser uma ameaça. E é sobre este tipo de “medo” que pretendemos tratar.

Não é segredo para ninguém a campanha feita pelos veículos de comunicação em tempos recentes, que, a partir do medo, acabaram disseminando a propagação do ódio como instrumento de defesa aos “males” que estavam por vir e que atingiriam diretamente ao povo brasileiro.

As campanhas publicitárias, os fake news espalhados nas redes sociais tendo por trás empresas especializadas em produzir notícias mentirosas com objetivo de apavorar –amedrontar-, as pessoas serviram como instrumentos para dividir o Brasil numa polarização jamais vista.

De um lado, tínhamos grupos considerados de direita no que se refere à ideologia política, que se sentiam ameaçadas pelos avanços alcançados pelos grupos de esquerda. Aqueles, recorreram ao “fantasma do comunismo” como instrumento para suas campanhas, condenando sumariamente qualquer pessoa ou ideologia que não coadunavam com seus ideias e/ou princípios. Não obstante, serviram-se também dos lamentáveis episódios de corrupção envolvendo políticos, autoridades públicas e civis que assolam nosso país há muitas décadas.

O que assistimos, na verdade, foi o desespero de uma elite conservadora, exploradora e preconceituosa que não se conformou com o fato de que os mais pobres, pela primeira vez na história, estavam tendo acesso à educação, a melhores salários, a moradia, ao lazer. A isso chamaram de comunismo, acusando políticos e autoridades comprometidas com a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, de comunistas que queriam destruir a sociedade brasileira.

Não estamos, de modo algum, defendendo qualquer tipo de corrupção considerando-a como algo necessário para que haja justiça social. Isso seria um absurdo. A corrupção instaurada em nosso país é uma doença que precisa ser extirpada, eliminada, e isso se dará com investigações sérias levadas à cabo pelo judiciário. Em qualquer sistema de governo, uma vez comprovadas as práticas de corrupção, corruptos e corruptores devem ser levados à justiça. Contudo, não podemos admitir a politização do judiciário e seu uso como instrumento de condenação sumária de adversários políticos, enxergados como ameaças à um sistema desumano de divisão de rendas e radicalmente injusto para com os trabalhadores, aposentados e população de baixa renda.

No seio do comunismo está a proposta de uma sociedade mais justa, solidária e igualitária onde todos os cidadãos tenham seus direitos e deveres garantidos pelo Estado e possam viver com dignidade tendo moradia, trabalho, educação, saúde e segurança pública, dentre outros.

A campanha do medo soube como utilizar os episódios de corrupção amplamente divulgados e os transformaram em algo exclusivo da esquerda política, taxada de comunista. Parece-nos, que a elite brasileira jamais se preocupou em saber, de verdade, o que o comunismo prega e defende. Ainda vivem sobre a influência de campanhas feitas no passado contra este sistema de governo, que elaboradas com esmero, orientados, inclusive, por órgãos internacionais de repressão à democracia, que transformaram o comunismo e o socialismo como “piores dos mundos possíveis”. Sem nenhum pudor, condenaram pessoas e instituições a um estado de exceção que dividia o país entre bons e maus, sendo os bons, obviamente, os defensores do capitalismo selvagem que hoje assola o mundo e condena milhões de pessoas à fome e ao total desamparo.

Como resultado desta campanha, tivemos a eleição de um grupo de ultradireita comprometido com o capitalismo extremo proposto pelo neoliberalismo que defende a lei do Estado mínimo e incentiva a privatização de serviços públicos essenciais para a população.

Esse grupo, alega que “empresas privadas” são melhores administradas e por isso podem oferecer melhores serviços. Considera os programas sociais que tiraram milhões de famílias da miséria, como instrumentos comunistas geradores de “preguiçosos”. Promoveram reformas como as da Previdência e Trabalhista alegando que os trabalhadores tinham muitos direitos e que os empresários não aguentam pagar tantos impostos. A campanha feita por eles foi capaz de convencer muita gente de que estavam certos e que, para garantir emprego, tinham que reduzir os direitos trabalhistas conquistados havia anos. Prometeram gerar milhões de empregos a partir das reformas realizadas. Onde estão os empregos? Hoje, o Brasil conta com mais de 40 milhões de pessoas sem trabalho e o atual governo não faz nada para mudar este quadro.

Continuam agindo de modo a garantir a permanência no poder, usando como argumento acabarem com a corrupção e banir os comunistas para fora do país. Que comunistas são esses? Onde estão? Com qual corrupção conseguiram acabar? Nenhuma! Ao contrário, deram proteção aos verdadeiros corruptos que continuam se beneficiando da máquina pública para enriquecerem ainda mais.

As ações do atual governo, em todos os seguimentos, são vexatórias e dotadas de total incapacidade administrativa

Não precisamos de grandes esforços, basta acompanhar o noticiário cotidiano, para enxergarmos o que está sendo feito em relação a corrupção e ao uso da máquina pública para defender verdadeiros grupos –para não dizer quadrilhas-, formados por pessoas que debocham das instituições públicas responsáveis pelo bom andamento político-social do país.

Hoje, práticas de corrupção recebem nomes interessantes como a tal “rachadinha”. Grupos políticos formados por famílias inteiras, escarnecem da população com suas justificativas quando intimados a esclarecer atos de corrupção e desvio de dinheiro público a eles atribuídos. A corrupção e seus causadores não foram e não está sendo combatidos, ao contrário, estão se sentindo protegidos.

As ações do atual governo, em todos os seguimentos, são vexatórias e dotadas de total incapacidade administrativa. Gostaria que alguém nos apontasse, dentro do quadro administrativo do governo federal, um verdadeiro estadista. Não existe. O que temos, lamentavelmente, são pessoas que ideologizaram o governo com sua sede de poder e de ganhos, a ponto de defenderem o uso inescrupuloso da máquina para aprovarem suas propostas no Congresso Nacional –propostas estas chamadas de boiada-,” enquanto o país está assustado com a pandemia do Covid 19.

Mas isso não é tudo. Enquanto mais de 5.7 milhões de pessoas sofrem contaminação e mais de 160 mil sucumbiram vitimadas pelo Covid -19, o presidente da república e seus asseclas tentam politizar a ciência. Não tiveram o menor pudor ao tentarem usar a morte de um dos voluntários para testar a eficácia do imunizante contra a Covid 19 “CoronaVac” desenvolvido na China e cuja pesquisa no Brasil é realizada pelo Instituto Butantan para, através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), suspenderem os estudos sem sequer aguardar a análise científica do caso, que determinaria se a morte do voluntário teria sido causada pela vacina, o que dias depois, ficou provado não haver nenhuma ligação.

Com suas costumeiras verborragia e arrogância, na manhã de terça-feira (10/11), o presidente da república mencionou o episódio ao responder a um usuário do Facebook, que perguntou se o “Brasil compraria a vacina desenvolvida em parceria do Instituto Butantan, ligado ao governo do Estado de São Paulo e a empresa chinesa Sinovac.” Bolsonaro aproveitou para atacar seu adversário político, o governador de São Paulo João Dória: “Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Dória queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la.” E, para fechar com chave de ouro, o presidente acrescentou: “Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”. Sem comentários.

Numa demonstração clara do descaso com o qual (des) governa o país, o presidente da república chamou de “maricas” as pessoas amedrontadas com o risco de serem contaminadas pelo vírus do Covid 19, usando como argumento o clichê “todos vão morrer um dia”.

Diante de todas essas (e de incontáveis outras) demonstrações claras de que o Brasil foi vítima de uma campanha embasada no ódio e no medo, capaz de convencer milhões de brasileiros a elegerem um presidente da república totalmente incapaz para governa-lo, chegamos a mais uma eleição. Desta vez, iremos eleger Prefeitos e Vereadores em todo o país.

Os candidatos afinados como o atual governo federal –e outros que apoiaram sua candidatura nas eleições de 2018, mas agora se posicionam como contrários a ele-, novamente tentam convencer os eleitores de que os candidatos comprometidos com as causas populares e a realização de uma administração mais justa para todos e todas, são “comunistas” tentando chegar ao poder.

As mensagens trazem em si, mais uma vez, o medo. A direita, composta em sua maioria pela elite das cidades, dos estados e do país, com medo da esquerda ataca veementemente seus candidatos e propostas, novamente taxando-os de comunistas ou socialistas. A esquerda, por sua vez, aponta os desmandos dos governantes de direita e seus correligionários face às reais necessidades da população. E no meio disso tudo estamos nós, eleitores.

Cabe a nós, sem medo, escolhermos aqueles que realmente apresentam propostas condizentes com a realidade das cidades. Temos de ter coragem suficiente para não anularmos o nosso voto ou votarmos em branco. Quando adotamos uma postura como estas, estamos abrindo mão de nosso direito primordial de escolhermos quem irá nos representar e governar nossa cidade nos próximos quatro anos. Votando em branco ou anulando o voto, estaremos adotando uma postura irresponsável, uma vez que deixamos em outras mãos a decisão que é nossa.

O velho argumento “não voto em ninguém, porque nenhum político presta” não cabe mais em nossa realidade. Se hoje temos maus políticos e administradores públicos, uma das principais razões que proporcionaram esta situação, foi a nossa omissão. Ao não manifestarmos nossa escolha através do voto, estamos delegando a outros o poder de fazê-lo e abrindo mão do nosso poder de decisão. Não faça isso. Votemos com consciência e com destemor. Elejamos o candidato que mais se identifica com a nossa realidade e que apresenta propostas concretas e possíveis de serem realizadas.

A propaganda eleitoral está recheada de propostas infundadas. Para prefeito de São Paulo, temos até um candidato que afirma ser “amiguinho do presidente da república” e por isso trará dinheiro do governo federal para investir na cidade. Temos um outro que promete “distribuir dinheiro para o povo”, mas não diz de onde vai tirá-lo. Outros que se apresentam como “pais” de projetos que foram realizados por terceiros quando estiveram à frente da administração municipal. Isso só para citar alguns exemplos.

Para o cargo de vereador, temos inúmeros candidatos que não se identificam com nenhuma corrente ideológica ou com movimentos sociais envolvidos na luta por melhores condições de vida para a população paulistana. Normalmente, concorrem ao cargo filiando-se a partidos políticos de baixa representatividade, que lhes possibilitem chegar à Câmara Municipal com pequeno número de votos. São os partidos sem identidade política, “partidos fisiológicos”. Esses candidatos adotam um comportamento relacionado com uma visão negativa da política e de partidos maiores e com uma crítica –nas mais das vezes-, desprovida de argumentos concretos contra propostas e programas de governo com apelos ideológicos.

Não podemos nos deixar levar pelo medo. Devemos escolher e eleger àqueles e àquelas que estejam comprometidos em fazer um governo “com o povo” e não “para o povo”. Governar com o povo significa dar ouvidos às suas reivindicações e a partir delas tomar as decisões e fazer os encaminhamentos necessários para que sejam atendidas.

Quem sabe o que é melhor para o bairro é quem nele mora e trabalha. São os idosos com suas experiências de vida; os adultos pais de família que convivem diariamente com as carência e necessidades de seus familiares e vizinhos; os jovens ávidos por políticas públicas que lhes garantam um futuro melhor.

Assim, observe e procure conhecer de perto a vida pregressa dos candidatos que se apresentam como “salvadores da pátria”, prometendo mundos e fundos. Identifique aqueles que realmente estiveram ao lado do povo trabalhando para que todos tenham melhores condições de vida e seus direitos respeitados.

Não tenhamos medo de decidir! Votemos com consciência, coragem e esperança. Não nos deixemos levar por propagandas bonitas e bem elaboradas por marqueteiros profissionais contratados exclusivamente para este fim –na maioria das vezes-, dos candidatos com autopoder econômico. Votemos naqueles com os quais nos identificamos e que sempre estiveram ao lado das lutas sociais defendendo melhorias para todos nós.

Lutemos por uma Cidade, um Estado e um País mais justos e humanizados para todos e todas. O primeiro passo para esta realidade perfeitamente possível, devemos dar nas eleições do dia 15 de novembro, quando elegeremos nosso(a) Prefeito(a) e vereadores.

Não podemos –em nome das futuras gerações-, abdicar do dever de participar ativamente da vida pública e política de nossas cidades para, a partir delas, transformarmos a triste realidade desigual, injusta e preconceituosa que hoje assola nosso país.

São João Paulo II, nos ensinava que todos somos destinatários e protagonistas da política dizendo:

A caridade que ama e serve a pessoa nunca poderá estar dissociada da justiça: uma e outra, cada qual à sua maneira, exigem o pleno reconhecimento efetivo dos direitos da pessoa, a que é ordenada a sociedade com todas as suas estruturas e instituições.

Para animar cristãmente a ordem temporal, no sentido que se disse de servir a pessoa e a sociedade, os fiéis leigos não podem absolutamente abdicar da participação na “política”, ou seja, da múltipla e variada ação econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum. (EA “Christifideles Laici, 42)

As palavras de São João Paulo II, configuram não apenas um chamado, mas uma convocação feita a todas e todos fiéis leigos (nós) para participarmos da política, pois tudo passa por ela, especialmente nas questões da administração pública-social.

Repetimos aqui o que já dissemos anteriormente: o futuro de nossa Cidade, do nosso Estado e do nosso País, está em nossas mãos.

Sigamos em frente na nossa trajetória neste mundo, tendo como base as palavras de Jesus de Nazaré, quando nos diz: “Não tenham medo” (Mt 14,26) “Neste mundo vocês terão aflições, mas tenham coragem: eu venci o mundo”.(Jo 16,33)

Que possamos exercer com destemor e coragem nosso direito de eleger nossos representantes e governantes. Que tenhamos a sabedoria necessária para fazermos uma boa escolha, pois como nos ensina nosso querido Papa Francisco: “envolver-se na política é uma obrigação para o cristão. Nós cristãos não podemos nos fazer de Pilatos e lavar as mãos, não podemos!

Shalom!

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