Diálogos da Fé

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Brasil coração do mundo? Os ataques aos venezuelanos desmentem

Esta seria a “missão coletiva” do País, segundo o Espírito Emmanuel, mentor espiritual de Chico Xavier. Mas tem acontecido o contrário

Roraima é a porta de entrada e passagem de venezuelanos pelo País
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Roupas queimadas, barracas de campings destruídas, lágrimas, pedras e paus, crianças em estado de choque, lágrimas.

Mulheres gritando enquanto com uma das mãos tentavam segurar os filhos e, com a outra, apertavam firme as sacolas com seus pertences que eram rasgados e arrancados, lágrimas.

Homens agredidos e uma turba, enfurecida, cantando o hino nacional, lágrimas. Gente pobre perseguindo, ofendendo, xingando, hostilizando gente pobre, lágrimas. Pausa. 

Pausei o vídeo para secar as lágrimas. Meu coração estava a ponto de sair pela boca. Um misto de decepção e incredulidade. Olha só no que estão transformando nosso querido Brasil, pensei.

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Mais gente – desta vez de fora do País – começou a compartilhar esses vídeos. Deletei sem assistir. Não tinha mais coragem para ver aquele festival bestial. Imediatamente, lembrei-me dos primeiros cristãos lançados nas jaulas dos leões para o regozijo da plateia.

Lembrei também do Cristo refugiado, perseguido e, ainda criança, arrancado de sua terra natal, juntamente com seus familiares – Maria e José –, obrigados a atravessar inúmeras fronteiras até chegar ao Egito, onde fizeram nova morada.

Não falamos da Europa xenofóbica nem de seitas racistas norte-americanas. Falamos do Brasil, de Roraima, que recebeu nos últimos 18 meses pela fronteira de Pacaraima, principal porta de entrada para os moradores do país vizinho, cerca de 128 mil venezuelanos.

Vale lembrar que uma parte deles, 31,5 mil, voltou para a Venezuela pela mesma porta de entrada, e os outros 37,4 mil saíram do país de avião ou por outras fronteiras terrestres.

Falamos da ascensão do fascismo tupiniquim, filho legítimo do racismo, pai da desesperança e do medo e, portanto, contrário à moral cristã.

Para espíritas, o Brasil tem sido preparado há séculos, desde a sua invasão, que alguns chamam de “Descobrimento”, para se tornar “o coração do mundo e a pátria do evangelho”.

Mas isso desde que você não seja um refugiado, imigrante, sem teto, sem terra, negros, LGBT+, mulher, indivíduos com deficiência, idosos, segundo a lógica de alguns “cidadãos de bem”.

Essa crença ficou muito forte a partir do lançamento, pela Federação Espírita Brasileira, em 1938, da obra mediúnica de mesmo nome, psicografada pelo médium mineiro Francisco Cândido Xavier – já desencarnado – e assinada pelo espírito Humberto de Campos, que, após batalhas judiciais entre os familiares do autor desencarnado, a FEB e o próprio Chico, passou assinar Irmão X.

No livro, o autor espiritual (Humberto de Campos) narra fatos marcantes da história brasileira, revelando planos de falanges espirituais sob o comando de Jesus e do Anjo Ismael (protetor do Brasil) no desenrolar da história mundial. É “a revelação da missão coletiva de um país”, segundo o Espírito Emmanuel, mentor espiritual de Chico Xavier.

Mas estamos bem longe de nos tornamos essa pátria abençoada se continuarmos nos dividindo por etnia, classe, raça, gênero, por escolhas político-partidárias ou por religião (ou não religião).

O que lamentavelmente ocorreu em Roraima nos revela como estamos adoecidos – física e espiritualmente – e como reproduzimos o senso comum para justificar nossas maldades, nossos preconceitos e nossos medos. 

É o que Hanna Arendt vai chamar de “banalidade do mal”, conceito cunhado por ela após o julgamento em Jerusalém do nazista Adolf Eichmann.

Entre outras coisas, Arendt defende que, em resultado da massificação da sociedade, se criou uma multidão incapaz de fazer julgamentos morais, razão porque aceitam e cumprem ordens sem questionar.

Kardec também nos alerta sobre esse assunto, por meio da questão 121 do Livro dos Espíritos: “Por que alguns Espíritos seguiram o caminho do bem, e outros, o do mal?” E a resposta foi: “Não têm eles o livre arbítrio? Deus não criou espíritos maus, criou-os simples e ignorantes, ou seja, tão aptos para o bem quanto para o mal, os que são maus, assim se tornaram por sua vontade”.

Que país queremos deixar para nossos filhos e netos, para nossas futuras gerações? O país da justiça, da paz, da união e da acolhida ou o país do ódio, da intolerância, da xenofobia?

Ou paramos o horror ou o horror irá nos parar: “A maldade aumentará de tal maneira que o amor de muitos se esfriará” (Mateus 24:12). 

Pedimos, amorosamente, aos companheiros espíritas de Roraima que abram os seus centros espíritas para acolher esses irmãos e irmãs, vítimas da fome, do desamparo e do ódio.

“Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me” – Mateus 25:35

Toda solidariedade ao povo venezuelano.

O amor triunfará sobre o ódio e a esperança há de vencer de novo.

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