Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

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Aulas de religião nas escolas: a experiência turca

A formação religiosa por meio do poder público prejudica tanto a fé quanto o Estado

O ensino religioso, comum no passado, volta à pauta também em países muçulmanos
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Quando as palavras escola e religião são citadas ao mesmo tempo, nasce uma alta tensão em alguns grupos na sociedade. É claro que isso não é causado apenas por causa de certas preocupações. Ao contrário. Surge como resultado de alguns casos ocorridos. É uma preocupação que brota da história das sociedades. Durante um tempo, esta tensão foi superada por meio da educação secular, laica.

Este pilar da educação secular significava que todos podem oferecer a orientação religiosa, mas nas escolas públicas não poderia ocorrer. Assim, seria oferecida a oportunidade de conhecimento religioso, e ao mesmo tempo a de manter as escolas públicas fora do ensino religioso. Em resumo, a ideia de “quem quiser pode aprender qualquer religião, mas fora das escolas”. Foi essa a solução durante um certo período.

Agora voltamos ao início e novamente falamos de ensino religioso nas escolas.

A questão de ensino religioso na Turquia surgiu novamente em 1985. O golpe militar, ocorrido após graves disputas entre a esquerda e a direita, abriu o caminho para o ensino religioso nas escolas. Na realidade, a Turquia nunca foi um país completamente laico. Embora não houvesse ensino religioso nas escolas, havia uma rede de escolas públicas para formar teólogos. Os imãs e xeiques se formavam nas escolas públicas e trabalhavam como funcionários públicos nas mesquitas. Assim continua a ser. Ou seja, o Estado não supervisiona a religião, mas a administra. Esta relação se aprofundou mais durante o governo do AKP (Partido de Justiça e Desenvolvimento), atualmente no governo.

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Para que serviu o controle do Estado sobre a religião?

Na realidade, esse controle não serviu ao Estado, tampouco supriu as necessidades do povo. Ao contrário. O povo teve de suprir esta necessidade por meio de instituições e indivíduos cívico-religiosos.

Uma pesquisa feita pela Plataforma de Namaz (orações diárias no islã) feito com os alunos do Ensino Médio nos mostrou a tragédia do resultado do ensino religioso por meio do Estado. Segundo a pesquisa, 18% dos alunos do Ensino Médio praticavam preceitos religiosos regularmente. Estas escolas oferecem uma hora de Ensino Religioso por semana. A mesma pesquisa também foi aplicada nas instituições em que os religiosos se formam, as Escolas de Teologia. O resultado trágico surgiu exatamente neste ponto: apenas 12% dos alunos de escolas de teologia praticavam a religião, ou seja, 6% menos do que nas escolas comuns.

Os alunos destas escolas, que estudam sobre o Alcorão, a jurisprudência islâmica, as questões da fé e afins, se mostraram menos religiosos do que os alunos que não estudam religião regularmente. Estranhamente eles que dirigem as orações nas mesquitas. Isto é, a religião sai do âmbito de crença e começa a ser uma questão profissional.

Qual seria o resultado quando a religião, que precisa ter uma base forte de crença, é praticada por quem a vê como profissão?

Na Turquia, o presidente do país e a maioria daqueles que o administram são formados nestas escolas religiosas. Infelizmente, nunca na história da nação houve uma época em que aconteceram tantos casos de corrupção, propina e injustiça. A religião nunca foi tão explorada tanto quanto foi explorada por aqueles que estudaram nessas escolas.

Eu, que vivenciei o exemplo da Turquia e me formei nas escolas fundadas para formar religiosos, posso dizer o seguinte:

A religião é um conjunto de crenças que busca satisfazer os indivíduos com as suas questões ontológicas. Pois os seres humanos precisam das respostas da religião em alguns períodos da sua vida. Por esta razão, o ensino sobre religiões, em um nível básico, é fundamental para os alunos terem ideias sobre as religiões. Mais do que isso, cabe a cada um individualmente. A formação dos religiosos por meio do poder público prejudica tanto a religião quanto o Estado. 

Tradução: Atilla Kus Revisão: Mustafa Goktepe

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