Olho na COP
Veterano das grandes conferências mundiais, o repórter Maurício Thuswohl acompanha os preparativos e bastidores e desafios da Conferência do Clima em Belém.
Olho na COP
Carlos Minc: ‘Se o Brasil, que é a terra do sol, do vento e da biomassa, não começar a cortar as energias fósseis, quem vai?’
O ex-ministro do Meio Ambiente fala sobre as expectativas para a COP30, os dilemas do Acordo de Paris e o balanço da política ambiental do atual governo.
        
        Ex-ministro do Meio Ambiente de Lula (2008–2010) e ex-secretário do Ambiente do Rio de Janeiro, Carlos Minc (PSB) conhece por dentro o labirinto diplomático das Conferências do Clima da ONU. Foi um dos líderes da delegação brasileira na COP15, em Copenhague, em 2009 — quando começaram as negociações que resultariam na renovação do Protocolo de Kyoto.
Em entrevista ao Olho na Cop, o deputado estadual fala sobre as expectativas para a COP30, os dilemas do Acordo de Paris e o balanço da política ambiental do atual governo.
CartaCapital: Qual a sua expectativa em relação à COP30?
Carlos Minc: Média expectativa. Os países do petróleo fazem um lobby pesado, os Estados Unidos estão fora do Acordo de Paris e as guerras estão absorvendo dinheiro. O lado positivo é que irão avançar o fundo de florestas e o financiamento através de fundos internacionais de previdência, que movimentam trilhões. Aloizio Mercadante e Fernando Haddad estão ajudando muito a ministra Marina Silva nesse ponto.
Outro avanço muito importante poderá acontecer nos programas de adaptação voltados às pessoas mais vulneráveis, aquelas que moram nas margens dos rios e nas encostas, que são as que mais sofrem os efeitos do aquecimento. Esses programas vão avançar porque independem do lobby do petróleo e da vontade dos Estados Unidos. E são muito relevantes.
CC: A concessão de licença para exploração na Margem Equatorial mina os esforços do Brasil para assumir o desejado lugar de liderança no enfrentamento às mudanças climáticas?
CM: Mina, sim. Com a concessão da licença nesse momento, ficou ruim para o Brasil. Mas, vamos combinar que quem define a política energética não é o Ibama, mas sim o Conselho Nacional de Política Energética. Eu sou contrário a essa exploração por várias razões. Pela vulnerabilidade da área em questão e também porque se o Brasil, que é a terra do sol, do vento e da biomassa, não começar a cortar as energias fósseis, quem é que vai começar a cortar? Agora, não é um desastre absoluto. O Brasil continua tendo uma matriz entre as mais renováveis do mundo e tem avançado no combate ao desmatamento e nos biocombustíveis. Em resumo: é um revés sim, mas não uma desgraça absoluta desde que o Brasil consiga realmente liberar o fundo de florestas, o financiamento e a adaptação.
CC: O Brasil conseguiu retomar de forma satisfatória as políticas ambientais desenvolvidas durante os primeiros dois mandatos de Lula?
CM: Eu entendo que sim. A ministra Marina tem uma equipe qualificada, com nomes como João Paulo Capobianco e Tasso Azevedo, entre outros. O Tasso foi uma pessoa importantíssima na minha gestão de dois anos no MMA, onde a gente reduziu à metade o desmatamento da Amazônia. Na nossa gestão foram criados o Fundo Clima e o Fundo Amazônia, e o Brasil foi o primeiro país em desenvolvimento a ter meta de redução das emissões de gases-estufa. Depois da desgraça Bolsonaro, a Marina foi retomando e ampliando as políticas. E sua equipe passou a olhar mais o Cerrado, onde estava avançando o desmatamento enquanto o da Amazônia caía. Ela conseguiu esses 63 vetos do Lula ao PL da Devastação. Agora, o nosso desafio é manter esses vetos que os ruralistas querem derrubar. Mas, é claro que a Marina não controla tudo. Infelizmente, o Brasil continua liberando muitos agrotóxicos.
CC: Existe um caminho possível fora do espaço oficial das COPs para fazer avançar o Acordo de Paris?
CM: Sempre existe. Um exemplo são os Estados Unidos. O Trump é negacionista, porém mais de 20 estados americanos têm políticas climáticas. Os empresários que investiram bilhões em solar e eólica não vão desfazer seus investimentos só porque o Trump é um fã do carvão. Eu acho que as cidades são um fulcro muito interessante. A questão do reflorestamento urbano, das cidades-esponja e dos transportes integrados com biocombustível e ciclovias, tudo isso pode avançar. A questão do lixo também pode avançar porque é independente das COPs, é uma questão que diz respeito às cidades. Eu participei de várias COPs e digo que seu resultado é limitado. É angustiante que a Europa não tenha ainda apresentado suas novas metas de redução das emissões. São várias as questões: o avanço da direita, as guerras. Mas, eu digo que sim, que é possível avançar fora das COPs, que têm as limitações que já conhecemos.
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