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Mudança no abono salarial vai aumentar a desigualdade

O abono é pago a quem ganha menos de 2 mínimos e tem pelo menos 5 anos de cadastro no PIS-Pasep. Reforma quer retirar benefício de 93%

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A reforma do abono salarial propõe tirar, em média, 5,7% da renda anual de 24 milhões de trabalhadores que ganham entre 1 e 2 salários mínimos, o que aumenta a desigualdade social medida pelo índice de Gini.

Em nota técnica, o Ministério da Economia questiona “o papel dessa política na redução da desigualdade social” e aponta o “caráter regressivo e concentrador de renda” do abono salarial, baseado apenas na observação de que essa política “exclui os mais pobres e beneficia os decis (sic) intermediários de renda”. Nesse breve estudo mostra-se que, ao contrário do constatado, o abono não é concentrador de renda e a nova regra para o abono vai aumentar a desigualdade social.

O abono é um benefício pago a quem ganha menos de 2 salários mínimos e tem pelo menos 5 anos de cadastro no PIS-PASEP. Esse trabalhador recebe 1/12 do salário mínimo multiplicado pelos meses que trabalhou no ano, assim, quem trabalhou o ano todo, recebe um 14º salário. Isso pode mudar com a PEC 6/2019 da reforma da Previdência que propõe que o benefício seja restrito a quem ganha 1 salário mínimo ou menos.

O abono foi criado na época em que o salário mínimo era bem menor e que não havia outros programas sociais relevantes como o Bolsa Família. Há, de fato, políticas públicas de melhor qualidade.

No entanto, a mudança no abono tem um importante impacto distributivo que não deve ser ignorado.

Em 2017, 26 milhões de trabalhadores tinham direito ao abono, 47% dos trabalhadores assalariados formais de acordo com os dados da RAIS.

Com a reforma, 24,3 milhões de trabalhadores perderiam esse direito por estarem na faixa de um a dois salários mínimos, ou seja, 93,6% dos que têm o direito ao abono perderiam este direito com a reforma. Isso significa, em média, uma redução de 5,7% na renda dessas pessoas.

No agregado, a reforma propõe tirar da economia até 17,6 bilhões de reais por ano, o que tem repercussões negativas no crescimento econômico já que é dinheiro na mão de uma parcela da população com alta propensão a consumir.

Dentre as profissões que mais vão perder com a reforma estão os cozinheiros, trabalhadores de serviços de manutenção, porteiros/vigias e recepcionistas. Mais de 60% dos ajudantes de obras, por exemplo, vão perder essa renda anual como mostra o gráfico.

Os cálculos do Índice de Gini da renda domiciliar per capita (onde se inclui todas as fontes de renda da PNAD Contínua anual de 2017) mostram que a política de abono salarial contribui para a redução da desigualdade. Caso não houvesse a política de abono, o Gini aumentaria de 0,5475 para 0,5497. Ou seja, o abono é uma política progressiva em termos de distribuição de renda quando medida pelo Gini.

Mas a reforma da previdência propõe manter o benefício para quem ganha até 1 salário mínimo, o que ameniza efeito concentrador de renda. Ainda assim, ao aplicar as regras para o abono da PEC 6/2019, o índice de Gini aumenta de 0,5475 para 0,5489.

Portanto, a mudança do abono contribui para o aumento da desigualdade social medida pelo Gini. Se há, de fato, preocupação com a desigualdade social, a mudança na regra do abono dever ser repensada.

Por fim, além do impacto distributivo devem-se avaliar também os efeitos contracionistas da mudança no abono, pois se trata de uma das mudanças propostas pela reforma da previdência com maior impacto negativo sobre a demanda agregada e o crescimento econômico.

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