Brasil Debate

A polarização e a derrota do establishment

Os candidatos prediletos da mídia oligopolista e dos líderes empresariais, enfim, das grandes elites, eram outros

Estes não eram os candidatos dos "sonhos" das elites
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A extrema-direita teve uma evidente vitória. Deputados, senadores e talvez governadores. Mesmo que perca as eleições, Jair Bolsonaro afirma-se como líder e conquista grande espaço. Encampa o desejo de mudança contra o sistema.

A última semana trouxe uma onda bolsonarista. Aparentemente, as igrejas evangélicas tiveram influência.

Temos um novo partido com mistos de autoritarismo (político) neoliberalismo (econômico) e protofascismo (político e cultural). Houve força fascista no passado brasileiro, mas não com tamanho enraizamento e representatividade eleitoral. Outros países têm também partidos e mesmo governos fascistas.

As think thanks de direita, financiadas por grandes empresas, colhem os resultados eleitorais. Conquistaram corações e mentes.

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A política tradicional foi derrotada. Todos precisam de uma mea culpa. Inclusive aqueles que, para atacar a esquerda, repetiram a simplista narrativa antipolítica da corrupção. Essa é a maneira mais vazia e rasteira para explicar a complexa crise econômica, social, política e institucional que vivemos.

O establishment foi derrotado. Os candidatos prediletos da mídia oligopolista, dos líderes empresariais, do sistema financeiro, enfim, das grandes elites, eram outros. A ironia do destino é que foram essas elites que alimentaram a força da extrema-direita, associando a esquerda à corrupção. A surpreendente (sic) “descoberta” de que as empresas financiam campanhas por esquemas engoliu o sistema político tradicional.

O grande derrotado das eleições presidenciais é o PSDB. O partido errou em contrariar o liberalismo político ao apoiar a derrubada ilegítima de Dilma Rousseff. Continuou errando ao apoiar Michel Temer e persistiu no erro ao não sair do impopular governo. Frente ao escancaramento da antiga realidade de financiamento de campanhas, seu discurso moralista o deixou desmoralizado diante de seus eleitores.

A centro-direita foi esfarelada. O antigo PSDB mais social vai sendo substituído pelo novo PSDB que surge mais conservador, vide João Dória (SP) e Nelson Marchezan (RS), talvez Eduardo Leite (RS) seja uma exceção, a conferir. O partido ganha um concorrente menor, os ultraliberais do Novo.

Ciro Gomes saiu muito grande da eleição. Se ainda ambicionar espaço, tem condições de obter sucesso à frente.

Marina Silva saiu minúscula desta eleição. A desorganização partidária dificultou seu desempenho. O momento político tampouco é para alguém de seu perfil. Se ela quiser obter cargos eletivos, terá que recomeçar por baixo.

A derrubada de Dilma Rousseff e o desastroso governo Temer fizeram o PT ressurgir das cinzas. Lula levou seu candidato ao segundo turno mesmo preso e mudo. O PT perdeu espaço, mas bem menos do que os outros grandes partidos. A base dos votos é mais popular. A classe média de centro e/ou esquerda votou, majoritariamente, em Ciro Gomes. A centro-esquerda se mantém legalista e democrática, abrindo o flanco antissistema ao protofascismo.

Nem o maior de todos os ingênuos ainda acredita na isenção de nossa grande imprensa. Ela é de centro-direita. Majoritariamente liberal, mas há também conservadores.

O tempo de tevê pode ter feito diferença para Fernando Haddad, mas as redes sociais comandaram o primeiro turno. Com uso e abuso de fake news.

O resultado eleitoral não deve trazer a tão esperada pacificação do País. Assistimos uma grande ruptura da Nova República. A tensão política não dá sinais de ter chegado ao fim.

Caso Bolsonaro vença, os dias serão duros: corte de direitos, restrição de liberdades, redução de salários, aumento da pobreza, redução de serviços públicos, concentração de renda, repressão e, talvez, perseguição política.

Alentos: i) Bolsonaro larga com elevada rejeição na eleição e em eventual governo; ii) eleitos, seus aliados precisarão mostrar serviço e se depararão com a complexa realidade, distinta do simplismo de seus discursos; iii) a política tradicional será forçada a se reinventar, eis a oportunidade; iv) a política é dinâmica e a disputa de poder é constante. Nada é definitivo.

 *Róber Iturriet Avila, professor adjunto do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS

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