Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI)

A Petrobras está sendo despedaçada, desnacionalizada e isso é crime

O objetivo é remunerar regiamente os acionistas em detrimento do interesse público. Em menos de dois anos, reajustaram o diesel 229 vezes

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Por Marcelo Zero*

De forma compatível com a escolha estratégica de usar o petróleo como alavanca para o desenvolvimento, a Petrobras, nos governos do PT, praticou política de preços que equilibrava o interesse da empresa com o interesse público.

Petróleo e derivados são insumos estratégicos para a economia e o bem-estar da população. Portanto, tais preços têm de ser módicos, para não prejudicar o desenvolvimento do país e o interesse público. Também não podem oscilar demasiadamente, de modo a não prejudicar a execução das políticas governamentais. Lembre-se que a União é a principal acionista da Petrobras.

Assim, no período Lula, o preço do diesel foi reajustado somente 8 vezes e, no governo Dilma, outras oito vezes. Ao contrário do que os golpistas apregoam, tal política de preços não “quebrou a Petrobras”.

Na realidade, os preços praticados sempre foram acima dos custos de produção e, na média, alinhados com os preços do mercado internacional.

Como se vê, nos governos do PT, há períodos de defasagem dos preços internos do diesel, compensados por outros períodos de preços mais elevados do que os internacionais. Entre 2011 e 2014, o preço do diesel aos produtores e importadores no Brasil oscilou entre 0,88 e 1,02 vezes o preço do diesel no mercado internacional.

Nesse interregno, a geração operacional de caixa da Petrobras sempre foi positiva, como se demonstra o gráfico abaixo:

 

 

Na realidade, os governos do PT fortaleceram muito a Petrobras. Ao final de 2002, a Petrobras tinha patrimônio líquido de apenas 15,5 bilhões de dólares, ao passo que ao final de 2014, a empresa tinha patrimônio líquido 116, 97 bilhões de dólares. 

Mesmo com a grande queda no patrimônio líquido em 2015, em função da diminuição brusca dos preços do petróleo e da Lava Jato, a empresa tinha patrimônio líquido de US$ 66 bilhões. Saliente-se que esse balanço patrimonial não incluía as reservas do pré-sal.

No que tange à dívida, é preciso dizer que, com a brusca oscilação cambial em 2015, quando o dólar subiu de 2,66 reais (Dez/2014) para 3,95 reais (Dez/2015), os débitos da empresa em reais subiram de 351 bilhões de reais para 492 bilhões de reais.

Aproveitando-se desta situação, criaram o mito de que a Petrobras teria uma dívida impagável. Era mera escusa para o desmonte, pois o incremento obedecia a fator conjuntural e, além disso, as reservas do pré-sal, uma das maiores do mundo, davam imenso lastro patrimonial para que a Petrobras rolasse a sua dívida sem maiores problemas. Aliás, a dívida foi gerada justamente para viabilizar a exploração do pré-sal, que agora virou uma gigantesca máquina de produzir divisas.

Ademais, a produção do petróleo no Brasil subiu, no período, de 1,27 milhão de barris, em 2000, para 2,52 milhões barris, em 2015, graças aos planos de investimentos da Petrobras que a levaram a descobrir o pré-sal.

Ou seja, o PT duplicou a produção de petróleo no Brasil. E, até 2013, a gestão do PT quintuplicou os lucros médios da empresa, em relação ao período anterior. Tudo isso estimulando a cadeia de nacional de petróleo e gerando dezenas de milhares de empregos diretos e centenas de milhares de empregos indiretos.

O golpe, no entanto, destruiu tal processo de alavancagem do desenvolvimento nacional e acabou com essa política soberana e desenvolvimentista.

Em primeiro lugar, deu fim à política de conteúdo local, desestruturando toda a cadeia do petróleo.  Atualmente, as petroleiras estrangeiras podem importar plataformas, sondas e tudo o mais diretamente do exterior, gerando empregos no estrangeiro. Mais: graças à absurda MP 745, podem fazê-lo sem pagar impostos. Estamos subsidiando a importação de grandes multinacionais de petróleo.

A segunda grande decisão da gestão golpista foi desestruturar e privatizar a própria Petrobras. Desse modo, retirou-se da Petrobras a condição de operadora única do pré-sal e iniciou-se um processo de “desinvestimento” (venda de ativos) da ordem de 19 bilhões de dólares. Ademais da venda de campos de petróleo a preços irrisórios, o plano de desinvestimentos atinge também distribuidoras e transportadoras (gasodutos), complexos petroquímicos e refinarias. A Petrobras está sendo despedaçada e desnacionalizada.

Mas, além de desestruturar a cadeia nacional de petróleo e a própria Petrobras, com o intuito de privatizá-la, a gestão golpista da empresa pratica uma política de preços irracional, atrelada automaticamente às oscilações cambiais e aos custos internacionais do barril, acrescida de subjetivos “riscos políticos”.

O objetivo é o de remunerar regiamente os acionistas privados da empresa, principalmente os estrangeiros, em detrimento do interesse público e do bem-estar da população. Em menos de 2 anos, reajustaram o diesel 229 vezes.

Na gestão golpista, os preços do diesel ficaram muito acima dos preços mundiais. Neste ano, (2018) ficou, em média, 50% acima do preço internacional. Ao mesmo tempo, a gestão atual reduziu a capacidade interna de refino em 25%. Com tal medida, as importações de óleo diesel e outros derivados foram praticamente duplicadas, desde 2015. Em particular, o diesel importado dos EUA subiu de 41% do total, em 2015, para 80%, em apenas 2 anos.

Por outro lado, as exportações de óleo cru do Brasil aumentaram drasticamente, de cerca de 140 milhões de barris, em 2013, para 360 milhões, em 2017. Desse modo, regredimos a um modelo neocolonial de exploração de petróleo.

Exportamos óleo cru e importamos derivados, ao mesmo tempo em que vendemos nossas jazidas e os ativos estratégicos da Petrobras e destruímos toda a cadeia nacional dos hidrocarbonetos. Ganham com isso as grandes petroleiras dos EUA, os importadores e os investidores interessados na compra de refinarias e jazidas. Perdem, com essa insanidade, o País e a população.

Para completar o desastre, o governo fraco e ilegítimo, ante a justa greve dos caminhoneiros, resolveu subsidiar o diesel com recursos públicos, a um custo de quase 10 bilhões de reais. Ademais, não se mexeu na política celerada de reajustes praticamente diários da gasolina e do gás de cozinha. Cerca de 1,2 milhões de pessoas voltaram cozinhar com lenha ou álcool.

Nada disso era necessário. Os custos dos derivados não têm nenhuma relação com impostos embutidos. No caso do diesel, os impostos que nele incidem são bem inferiores ao que existem no Japão, Reino, Unido, Itália, Uruguai etc.

O problema está nas taxas de lucro (preços de realização) que a Petrobras privatista hoje pratica. Elas chegam a 150%, de acordo com os cálculos do consultor Paulo César Ribeiro Lima. Em país civilizado, isto dá cadeia.

Bastaria, portanto, reduzir as taxas estratosféricas e supervisionar os preços, impondo um regime de reajustes de médio prazo, com bandas amortecedoras. Mas isso significaria mexer com os interesses do grande capital financeiro, dos importadores e das multinacionais petroleiras. Para um governo antipopular como esse, é mais “justo” botar a mão no dinheiro da Seguridade Social, nos recursos destinados aos mais pobres.

A insana política de preços da Petrobras faz parte de um pacote antinacional e privatizante que visa beneficiar grandes empresas estrangeiras e seus sócios nacionais, em detrimento do interesse nacional e do bem-estar da população. Tem gente ganhando muito dinheiro com essa farra privatista. Por isso, a política tresloucada deve permanecer, com nuances, apesar da saída de Parente, o exterminador de futuro.

O dano presente é muito grande, como ficou evidente na greve dos caminhoneiros. Mas o dano maior, muito maior, é o prejuízo ao futuro do Brasil. Os campos do pré-sal, e tudo aquilo que eles poderiam gerar para o país e seu povo, estão sendo apropriados por multinacionais e seus poucos (e ricos) sócios privados brasileiros.

As futuras gerações, que poderiam usufruir desses fantásticos recursos, estão sendo desapropriadas de oportunidades, educação e qualidade de vida. É crime.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais e integrante do Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais/GR-RI

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