Augusto Diniz | Música brasileira
Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.
Augusto Diniz | Música brasileira
O sertanejo não foi capaz de impedir o avanço da viola, diz Ivan Vilela
Violeiro e pesquisador aponta a tradição popular como contraponto à força dominante


A tradição da viola resiste. E, segundo um de seus maiores praticantes e estudiosos, teve um crescimento promissor nos últimos tempos, atraindo inclusive um público feminino.
“O movimento das violeiras no Brasil cresceu muito, sobretudo no período da pandemia”, diz Ivan Vilela, professor da USP e autor do livro Cantando a Própria História – Música Caipira e Enraizamento (2013). Ele também já gravou diversos álbuns de viola, incluindo o referencial Paisagens (1998).
“A gente tem um movimento fortíssimo. Foi uma das razões pelas quais vim de Portugal pesquisar no Brasil durante o período em que estava lá fazendo uma pesquisa (sobre instrumentos de cordas portugueses introduzidos no Brasil) do movimento das mulheres violeiras. Elas estão tomando conta do espaço. É outra expressão de musicalidade de altíssimo nível”, diz.
Pelas pesquisas históricas que já fez, Ivan conta que a viola sempre trafegou pelas classes mais pobres da população. Segundo ele, há vários indicativos históricos, como em imagens, livros e relatos, de que a viola fazia parte do cotidiano, mantida por gerações nas camadas mais humildes.
Justamente para dar lugar a instrumentos musicais preferidos da burguesia dos grandes centros, ainda no período do Império ela foi tomando o rumo do interior do País.
“Tudo indica que a viola andou mesmo pelos estratos mais baixos. E é a principal razão pela qual ela se mantém viva, porque ela foi se retroalimentando da cultura na qual ela vivia.”
Nem o sertanejo conseguiu sufocar a cultura da viola, que cresceu alheia ao movimento da indústria fonográfica.
“A viola tem alçado voos à revelia (do mercado)”, afirma. “Esse sertanejo universitário, essa música pop, mais voltada ao mercado, já vinha andando. Veio antes com o nome de sertanejo romântico dos anos 80, quando a gente teve uma grande virada no mercado fonográfico brasileiro, que é a instalação de uma mentalidade neoliberal.”
Segundo Ivan Vilela, a mentalidade neoliberal mudou a lógica das gravadoras, que trocaram o seu elenco de grandes artistas por atuação em segmentos musicais mais imediatistas e lucrativos, além da institucionalização do jabá, que é o pagamento para emissoras de rádio e televisão executarem selecionadas músicas.
“É interessante entender a vitalidade da música brasileira”, prossegue. “No fim, são os extratos mais baixos da sociedade que estão empunhando a bandeira da voz dissonante, na ordem cruel que está imposta.”
Ele cita como exemplo o funk, que, embora rejeitado por parte da sociedade, expõe a realidade de forma crua da periferia.
Assista à entrevista de Ivan Vilela a CartaCapital na íntegra:
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