Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

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Carnaval 2023 será o embate entre o bloco patrocinado e a espontaneidade

Historiador Luiz Antônio Simas tem grande expectativa de como a folia será nas ruas depois de dois anos interrompida devido à pandemia

Foto: Divulgação
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Conhecedor dos meandros do carnaval de rua e do sambódromo, o professor, historiador, escritor e compositor Luiz Antônio Simas diz que sua expectativa para este ano não está tão voltada para os desfiles das escolas de samba, mas sim para o que vai ocorrer nas ruas durante a folia.

“Mal ou bem a gente retornou ao carnaval de avenida em abril [de 2022]. Mas, para o carnaval de rua, a expectativa é grande”, diz. “A volta do carnaval de rua de fato está acontecendo agora”. 

Para ele, no entanto, o carnaval de rua vai trazer alguns desafios. “Ao mesmo tempo em que na rua tem o impacto da espontaneidade, ele vem sendo acossado pelo mercado. Tem muito bloco que é patrocinado por marca grande. Vai existir um embate entre esse carnaval adequado às perspectivas do mercado e essa pulsão da rua intensa”.

Simas acha tolice a disputa dos megablocos por público cada vez maiores. Por conta disso, ele vê um movimento no sentido contrário. 

“Se a gente pega o que aconteceu com o Bola Preta, que estava inchadíssimo. Surgiram vários microblocos nas ruas próximas. Tenho também observado crescimento do carnaval de bairro, dos blocos de bairro. Eles servem como uma alternativa ao megabloco”, conta. 

Uma das soluções para o inchaço de público em determinados blocos é a descentralização dele, acredita o historiador. No Rio de Janeiro, os megablocos estão concentrados na orla e no Centro. “Essa descentralização é absolutamente fundamental”, afirma, destacando a importância das folias realizadas nas comunidades. 

Para Simas, a questão entra também na discussão do uso da área pública, “se a gente vai encarar como espaço de sociabilidade de encontro ou vai encarar como espaço de circulação de mercadoria”. Ele crê que a descentralização do carnaval pode acontecer à revelia do poder público. 

O livro Samba de Enredo: História e Arte, que foi escrito com Alberto Mussa e publicado originalmente em 2010, será relançado. O pesquisador explica que a obra foi terminada por ele e Mussa, na época, de forma melancólica e no pior momento do samba-enredo.

“O samba depende de um bom enredo. Isso é absolutamente fundamental. Tem-se até bons sambas com enredos ruins, mas não é o que normalmente acontece. O bom enredo leva ao bom samba”, explica.

Ele conta ainda que na década em 1990 e nos primeiros anos de 2000 ocorreu uma decadência muito grande dos enredos. “A crise não foi exatamente do samba-enredo, mas de enredo. Porque começou a ter o enredo patrocinado. O nível do enredo caiu muito. Foi a época que as escolas de samba tiveram mais dinheiro por causa da onda do patrocínio”, ressalta.

Simas lembra que naquele tempo, no Rio, a Beija Flor foi patrocinada por uma companhia de aviação assim como o Salgueiro no mesmo ano. “Tem enredo patrocinado por influencer, celebridades, cidades do agronegócio. Isso não tem como dar samba”, afirma. 

Mas Simas crê que o pior do samba de enredo passou. E isso justificou a atualização do livro sobre o tema. De 2012 para cá, segundo ele, o gênero melhorou. “Acabou ganhando fôlego. A gente começou a ter nomes importantes da música brasileira fazendo samba de enredo”, diz, citando nomes como Moacyr Luz, Paulo César Feital e Altay Veloso.

Para o escritor, a fase profícua do samba enredo foi de 1976 a 1983. “Ainda que não tenhamos a fase áurea, temos uma fase que apresenta novo fôlego”. 

O professor acredita que a crise da escola de samba fez ressurgir o samba-enredo. “Os patrocínios começaram a desaparecer e as escolas de samba tiveram que voltar a fazer enredos, digamos autorais, que tem muito mais sentido”, diz, mencionando a retomada da temática afro-brasileira nos desfiles e também certa desaceleração das baterias.

A Portela completa em 2023 o centenário do movimento que a gerou, com a criação do bloco que deu origem à escola. Trata-se de uma das maiores instituições da cultura brasileira, como bem diz Simas.

“Tem escola de samba em todo lugar, mas em larga medida a Portela inventou boa parte do que a gente entende como desfile de escola de samba. Uma escola de samba não existe porque desfila, mas ela desfila porque existe. A Portela tem no desfile a culminância, mas é uma escola de quadra aberta o ano inteiro”. 

Com ala de compositores do naipe de Monarco, Argemiro, Jair do Cavaquinho, Manacéia, Mijinha, Alberto Lonato, entre muitos outros, a Portela “tem uma história do samba de terreiro que é constituinte da história da música brasileira”. 

Simas está reunindo em mais um livro suas crônicas, vai lançar uma breve historia do jogo do bicho e também um perfil [escrito junto com Diogo Cunha] de Nei Lopes. Mas o projeto que vem se dedicando com mais afinco só vem em 2024 e trata-se de um dicionário da cultura popular brasileira. 

Luiz Antônio Simas – com composições já gravadas por Criolo, Maria Rita, Fabiana Cozza, entre outros – teve música recentemente lançada por Marcelo D2, numa parceria inédita de ambos sobre um tema que tem domínio: as raízes africanas. 

Assista a entrevista de Luiz Antônio Simas a CartaCapital:

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