Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

A falta que faz Beth Carvalho

Cantora, que gravou várias gerações do samba do Rio, São Paulo e Bahia, morreu em 2019 e no próximo dia 5 completaria 76 anos

Foto: Washington Possato/Divulgação

Apoie Siga-nos no

Beth Carvalho gravou samba desde sempre. No seu segundo álbum (Canto Para um Novo Dia; 1973), já circulando em escolas de samba, registrou sambistas que produziam pérolas do gênero, como Mano Décio da Viola e Darcy da Mangueira. Nos lançamentos seguintes, incluiu composição de Gracia do Salgueiro. 

Inseriu ainda no repertório desse segundo trabalho Nelson Cavaquinho, que se tornou grande amigo, e passou a gravá-lo ao ponto de fazer um disco só com músicas dele. Beth conheceu Nelson, um dos mais intrigantes personagens da música brasileira, onde ele sempre esteve com seu violão: nos bares da vida. Cartola entrou no álbum dela de 1976, Mundo Melhor, e seguiu na música de Beth até o fim da vida. 

De família de classe alta, mesmo depois de fazer fama, não abria mão das andanças pelo subúrbio. Foi assim no Cacique de Ramos, bairro em que quase morou, para estar ainda mais próxima do samba e dos compositores de lá.

As gravações de diversos músicos da geração do Cacique de Ramos começaram no disco De Pé no Chão (1978).  A partir dali, passou a gravar uma série de discos com aquele pessoal, de Jorge Aragão a Arlindo Cruz, de Zeca Pagodinho a Luiz Carlos da Vila, ganhando a alcunha de madrinha por apresentá-los ao universo da música.

Mais à frente, registrou sambistas históricas de São Paulo (1993) e, posteriormente, de uma geração que conheceu no Samba da Vela – registrada no álbum Pagode de Mesa Ao Vivo 2 (2000). Registrou também uma geração que floresceu nas inúmeras rodas de samba surgidas na virada do século no Rio, incluindo Wanderley Monteiro, Claudinho Guimarães e Leandro Fregonesi.

Beth se foi no dia 30 de abril de 2019. No dia 5 de maio, completaria 76 anos. Tinha posição política de esquerda. Foi assim também desde sempre. 


Dizia que queria ter feito mais músicas de protesto, como está registrado no livro Canto das Rainhas – O Poder das Mulheres que Escreveram a História do Samba (editora Agir), de Leonardo Bruno, lançado no final do ano passado e dedicada à história de cinco sambistas (Alcione, Beth Carvalho, Clara Nunes, Dona Ivone Lara e Elza Soares). A obra, aliás, é um trabalho muito bom sobre a cantora e várias citações neste texto são lembranças tratadas no projeto literário.

Beth Carvalho cantava bem, deixou discos antológicos, frequentava lugares de compositores de samba. Fez desconhecidos ganharem reconhecimento com sua arte. Beth ia a blocos de carnaval – fez isso até de cadeira de rodas, com dificuldades de ficar de pé, acometida por um problema na coluna que a levou à morte.

Sua vida foi simétrica em todos os aspectos, sem muita firula, com enorme presença física na rotina da música nas camadas mais populares. A voz de bom gosto, para cima, profunda e inesquecível. Foi comprometida e coerente com o samba e a vida. Salve Beth Carvalho!

Para proteger e incentivar discussões produtivas, os comentários são exclusivos para assinantes de CartaCapital.

Já é assinante? Faça login
ASSINE CARTACAPITAL Seja assinante! Aproveite conteúdos exclusivos e tenha acesso total ao site.
Os comentários não representam a opinião da revista. A responsabilidade é do autor da mensagem.

0 comentário

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.