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A moda pela floresta

A moda pela política, contra o desmonte ambiental com a internacionalista, mestranda em Direito e ativista ambiental Patricia Zanella

Foto: Greenpeace/ Daniel Beltra Foto: Greenpeace/ Daniel Beltra
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Desde o ano passado, com as queimadas e o desmonte ambiental proposital acentuado pelo Ministro do Meio Ambiente e as reações negacionistas do Presidente, faz os olhares de todo o mundo se voltarem para a Amazônia.

A atividade majoritária que causa o desmatamento na Amazônia é o pasto para criação de gado para atividades pecuárias, o que inclui a produção de carne e COURO. Outros fatores de impacto na Amazônia, se dá pela mineração, como seu ouro. Ou seja, se por um lado você pode ter algum item com borracha natural (látex) produzido exclusivamente com látex da Amazônia, com toda uma preocupação de valorizar os pequenos produtores, por outro, a peça de couro ou que possui algo de origem animal do seu guarda-roupa, só existe porque uma área foi desmatada para aquele animal pastar antes de ser assassinado. Cruel, eu sei. E se você pensa que não possui nada de couro e por isso está isenta dessa culpa, quero lembrar que mesmo seu sapato não sendo de couro, ele pode conter cola de origem animal – produzida com as sobras dos animais para a produção de carne.

A nível internacional, o mercado do couro teve reflexos com as queimadas. Em 2019, mais de 18 grandes marcas – de Dolce & Gabbana a Vans, que compram o couro brasileiro pediram esclarecimento sobre a procedência do mesmo, alegando possibilidade de cancelamento da compra devido as notícias sobre as queimadas na região amazônica serem relacionadas ao agronegócio do país, com o objetivo de terem segurança em relação aos materiais que estão comprando e transparência para garantir que eles não contribuíssem para o dano ambiental no país. O que convenhamos, sabemos que é bem ilusório, uma vez que toda a produção de couro gera um dano ambiental.

Você sabia que os alertas de desmatamento da floresta amazônica cresceram 63,75% em abril deste ano? (dados do INPE comparativos ao mesmo mês de 2019).

Isso ocorreu porque com os olhos voltados para os impactos da pandemia a nível global mostrou ao governo federal a oportunidade perfeita para “passar a boiada”, segundo o próprio Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Essas falas se refletem nas ações concretas do ministro e do Presidente desde o início do seu mandato O exemplo que ganhou visibilidade no último mês, foi a legitimação da prática ilegal de ocupação de terras públicas, mais conhecida como GRILAGEM, termo que surge porque o desmatador ilegal forjava uma escritura da terra deixando esse papel numa caixa com grilos para envelhecer a folha e fazer com que esse documento falso tivesse a aparência do verdadeiro.

Contamos essa história porque é exatamente isso que está sendo legitimado pelo governo federal, ao produzir instrumentos legais para anistiar esses criminosos. O primeiro instrumento legal foi a publicação da Medida Provisória 910 (MP 910), pelo Presidente Bolsonaro em dezembro de 2019. A Medida Provisória (MP) é um instrumento com força de lei que somente o presidente da República pode utilizar, mas esse mecanismo existe para casos de relevância e urgência porque ela passa a valer ao ser publicada e o Congresso possui 60 dias para aprová-la e transformar em lei, com 60 dias de prorrogação caso ela não entre em pauta no Congresso. Entenda a tramitação completa de uma MP.

A MP 910 visava alterar a lei de regularização fundiária em ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, ou seja, flexibilizar uma legislação já existente que foi feita em parceria ao Programa Amazônia Legal e que já possui desafios de execução para gestão de todos os pedidos, facilitando um colapso no sistema de registros com a autodeclaração de terra e outros mecanismos que diminuem a fiscalização da veracidade de quem ocupa essa terra, aumentando o conflito no campo.

Seus três objetivos centrais são: anistiar as invasões depois do período máximo permitido pela lei atual (2011) permitindo obter o título das terras ocupadas até 2018, permitir a obtenção da titulação sem vistoria em campo, apenas com a imagem em satélite e a Declaração do Interessado para identificar a ocupação, ou seja, a terra desmatada porque tudo deveria ser floresta e alterar a quantidade de terra que pode obter esse título, de 1.5 hectares para 2.5 hectares (como podemos ver, bem focada no pequeno-produtor).

Com a pressão da sociedade civil que se mobilizou para impedir sua aprovação contando com artistas globais, apoio de representantes do Ministério Público contrários a sua aprovação e a união de diversas frentes ambientais, foi substituída pelo Projeto de Lei 2633/2020 (PL 2633).

A PL 2633 tenta fazer parecer verdadeira e até mesmo “legítima” a flexibilização das ocupações de terras públicas favorecendo o desmatamento enquanto usa o discurso de que está tentando ajudar o pequeno-produtor. No período de pandemia, com milhares de mortes, deputados federais que nunca se comprometeram com a sustentabilidade, decidirem apresentar um projeto com viés socioambiental, é no mínimo, suspeito. Saber que o governo está ao seu lado aumenta a sensação de impunidade, incentivando essas práticas e acentuando o conflito no campo, uma vez que ao forjar a ocupação de terras, o grileiro se aproveita da confusão na demarcação de territórios de pequenos agricultores, povos indígenas e populações tradicionais pelo governo federal ou estadual e usa da violência para expulsar essa população de suas terras, pois, elas não tiveram seu direito reconhecido, enquanto ele forjou o seu direito.

Neste mês, as redes sociais do Fashion Revolution irão contribuir para a disseminação de informações de como é possível se mobilizar para que estes instrumentos legais não sejam aprovados. Mas você pode começar desde já atuando para salvar a Amazônia, para isso eu separei 5 sugestões:

1. Agir para conscientizar mais pessoas: comece compartilhando essa notícia.

2. Vá além das suas redes sociais: no site oficial da Câmara dos Deputados é possível se posicionar votando contra ou a favor dos projetos de lei, além de ter o recurso “Cadastrar para acompanhamento” – um alerta para receber por e-mail cada trâmite ou avanço que o projeto pode ter, para isso acesse.

Faça pressão social online, através do site Saldão da Amazônia, uma articulação das maiores ONGs de defesa da Amazônia.

Traga protagonismo a quem está combatendo na linha de frente, conheça líderes indígenas e pequenos produtores da sua região e contribua para sua visibilidade.

Faça sua parte como indivíduo: reduza seu consumo de produtos de origem animal, priorize na medida do possível produtos certificados para não contribuir com o desmatamento, faça doações para iniciativas que estão ajudando esses empreendedores locais e comunidades vulneráveis.

Lembrem-se que todos os eleitos devem prestar um serviço em prol da população e de um Brasil melhor. É nosso direito e dever fiscalizar suas práticas, mantendo-se atentos e informados. A luta pela floresta é de todos.

Patricia Zanella
Internacionalista, mestranda em Direito e ativista política-ambiental

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