3ª Turma

Com negociata por vaga no STF, Moro se mostra pior que caciques do MDB

Para Moro, o Ministério da Justiça foi o pagamento da primeira parcela pelos bons serviços que prestou ao seu chefe durante a campanha

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Na semana passada foi a vez do jornalista Gilberto Dimenstein, criador do site Catraca Livre, se juntar ao diretor José Padilha no time dos decepcionados com Sérgio Moro. Enquanto o responsável por Tropa de Elite fez uso de seu espaço na Folha de S. Paulo para tornar público que errou ao jogar suas fichas no ex-juiz, a mea culpa de Dimenstein ocorreu em sua conta no Twitter, lamentando as brigas que arrumou com amigos para defender alguém que chegou a considerar um herói nacional.

A gota d’água foi a revelação de Jair Bolsonaro de que teria se comprometido com Moro a lhe presentear com a próxima vaga no STF. Pegou mal, como bem apontou o ministro Marco Aurélio, assustado com a naturalidade com que o mandatário anunciou ter colocado o cargo de juiz da suprema corte no varejo.

Apesar de Moro – tanto o da 13ª Vara como o titular do Ministério da Justiça – ter dado inúmeras demonstrações de antipatia quanto a valores republicanos e democráticos, parece ter ido além da conta sua participação em uma negociata da qual saiu sua integração definitiva às hordas do bolsonarismo.

Episódios como a liberação da delação de Palocci nas vésperas do primeiro turno e a abjeta prisão de Lula denunciam a elasticidade da tolerância de Dimenstein e Padilha – além, naturalmente, da ingenuidade acerca da condição de agente do bolsonarismo ostentada pelo ex-juiz antes mesmo de chegar ao Planalto.

Para Moro, o Ministério da Justiça foi apenas o pagamento da primeira parcela pelos bons serviços que prestou ao seu chefe durante a campanha, conforme Mourão e Bolsonaro já reconheceram publicamente. A próxima está no outro lado da Praça dos Três Poderes.

Talvez fuja à percepção de Padilha e de Dimenstein que não dá para se decepcionar com Moro por causa de sua politização sem que se olhe para o retrovisor. É provável que nenhum dos dois acredite que o Moro da atualidade é diferente do Moro da Lava Jato – apesar de verem problema no político que não age como o juiz e não no juiz que agiu como um político. Há um certo cinismo em suas “respeitosas escusas”, termo utilizado pelo ex-magistrado após a puxada de orelha que levou do falecido Teori Zavascki por ter divulgado os grampos de Lula e Dilma.

Revelar algo é tornar público o que já existe.

Se o Moro de hoje é rigorosamente o mesmo de ontem, um simples exercício de lógica nos leva a concluir que suas ações de hoje são agendadas pelos idênticos propósitos, valores e métodos de ontem.

Assim, questionar a legitimidade e a validade da condenação de Lula deve ser consequência direta da revelação divina sobre sua verdadeira natureza.  É esta a necessária reflexão que deve vir na esteira de desculpas como as de Padilha e Dimenstein.

Parece ser consenso que o ex-magistrado não se tornou um “político tradicional” tão somente após primeiro de janeiro.  Para os incautos, havia a expectativa de que o Moro ministro seria uma versão anabolizada do Moro juiz, investido de poderes imperiais outorgados pela carta branca dada por Jair Bolsonaro. Época em que Moro, o Samurai Ronin (forma com que um deslumbrado Padilha chegou a se referir a ele), conseguia enganar muita gente. Não mais.

No fim das contas, a ida de Moro ao Ministério da Justiça serviu para revelar a face degenerada de alguém adepto de um fisiologismo capaz de corar o mais pragmático cacique emedebista.  “Aqui o nacional se constrói por subtração”, disse o crítico literário Roberto Schwarz.

Se seu nome ainda consta em algum verbete como sinônimo de moralização da coisa pública ou de combate à corrupção, convém retirá-lo o quanto antes.

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