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Bolsonaro destrói a possibilidade de milhares de famílias terem um teto

O substituto do Minha Casa Minha Vida não é um programa social, é simplesmente uma linha de crédito imobiliário

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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O Senado aprovou recentemente o projeto de lei do Programa Casa Verde e Amarela, o “plano” de Jair Bolsonaro para a habitação. Dificilmente poderia se conceber algo tão desastroso e num momento tão inoportuno. O substituto do Minha Casa Minha Vida não é um programa social, é simplesmente uma linha de crédito imobiliário.

E digo isso como alguém que sempre teve fortes críticas ao Minha Casa Minha Vida. O programa, iniciado em 2009, no governo Lula, carecia de uma visão de cidade mais inclusiva. Ergueu boa parte dos conjuntos habitacionais populares nas periferias, onde há menos infraestrutura urbana e falta de serviços públicos.

Ao deixar a definição de localização na mão das construtoras, reproduziu a lógica histórica de jogar os mais pobres para os extremos. Mas teve também um importante mérito, ainda mais se considerarmos as políticas habitacionais nacionais feitas anteriormente, particularmente aquelas conduzidas pelo Banco Nacional da Habitação (BNH).

O Minha Casa Minha Vida investiu pesadamente em subsídios para os mais pobres. Na chamada Faixa 1 do programa, o valor subsidiado (que o beneficiário recebia do poder público) chegava a até 90% do total do imóvel. Além disso, foi criado um fundo garantidor que permitia o acesso à moradia por aqueles que não tinham como comprovar sua capacidade­ de pagamento.

Esta questão é decisiva quando se trata da moradia popular. De acordo com a Fundação Getulio Vargas, dos 7,8 milhões de brasileiros que compõem o déficit habitacional, 92% têm renda familiar inferior a três salários mínimos. Ou seja, quem mais precisa de casa no Brasil não tem condições de obter um financiamento imobiliário, por não atender aos critérios bancários. Não são sujeitos de crédito. Foi justamente esse foco que fez do Minha Casa Minha Vida um programa social e não uma mera linha de crédito habitacional. Isso permitiu o atendimento de 1,5 milhão de famílias de baixa renda em dez anos.

É justamente aí que está o principal retrocesso do Casa Verde e Amarela de Bolsonaro. Deixa de haver subsídio no valor do imóvel, limitando-se a subsidiar as taxas de juro. A taxa subsidiada pode ser uma alternativa para famílias que têm maior estabilidade financeira. Mas bate a porta na cara da enorme massa dos que não possuem casa no Brasil. É uma iniciativa voltada para quem pode acessar o mercado imobiliá­rio, não para os milhões de excluídos. O próprio texto da lei aprovada não deixa dúvidas, quando coloca como diretriz do programa o “estímulo a políticas fundiárias que garantam a oferta de áreas urbanizadas para habitação, com localização, preço e quantidade compatíveis com as diversas faixas de renda do mercado habitacional”. O “Grupo 1” do programa não tem qualquer paralelo com a Faixa 1 do Minha Casa Minha Vida.

E o fim do programa social de moradia foi formalizado justamente no momento em que enfrentamos uma das maiores crises da nossa história. A pandemia da Covid-19 agravou a crise econômica e social que o Brasil vive há anos. Chegamos no fim de 2020 com a maior taxa de desemprego da série histórica do IBGE: 14,1 milhões de brasileiros estão desempregados e mais 5 milhões foram atirados ao desalento, sem qualquer perspectiva de trabalho. O que evitou até aqui um cenário socialmente mais desastroso foi o auxílio emergencial de 600 reais, aprovado pelo Congresso, contra a vontade do ministro Paulo Guedes, e agora cortado pelo governo Bolsonaro.

A crise social, obviamente, tem impacto direto na crise habitacional. Quem fica desempregado ou deixa de receber o auxílio perde a renda que – para milhões de famílias brasileiras – era destinada ao pagamento de aluguel. Temos visto nos últimos tempos os efeitos desse fenômeno nas grandes cidades, com o aumento da população em situação de rua. Os despejos individuais­ são um drama silencioso para muita gente, que não deixa outra alternativa a não ser a rua ou as ocupações.

Bolsonaro, que se elegeu e mantém seu público com a bandeira da “defesa da família”, está destruindo a possibilidade de milhões de famílias brasileiras de terem um teto com dignidade.

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