A casa-grande em pânico

O patronato brasileiro reluta em aceitar os mais básicos direitos de suas empregadas domésticas

Herança escravocrata. No Brasil, há quem se rebele contra qualquer tentativa de limitar o horário do trabalho serviçal – Imagem: iStockphoto

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No início de junho de 2020, no Recife, uma dona de casa mandou a empregada doméstica passear com o cachorro na rua. O filho pequeno da moça ficou no apartamento da patroa, mas esta não tomou conta do pequeno. Teria pensado que não tinha nada a ver com aquele menino? O fato é que o garoto entrou no elevador e foi do quinto ao nono andar, onde se debruçou numa janela, caiu e morreu. Imaginem o desespero da mãe ao voltar. Imaginem a dor, desse tipo de dor que não tem cura. Imaginem também que a mãe deve ter se sentido culpadíssima pela tragédia, cuja responsável não tinha sido ela, mas sua patroa. Que, talvez, tenha racionalizado a situação, pensando que a criança não era problema dela.

Não conseguiria escrever esta página se não começasse com a tragédia acima. Não porque ela aconteça todos os dias, espero que não, mas por ser representativa do lugar que as empregadas domésticas, sobretudo as que moram no local de trabalho, ocupam diante dos patrões. Até 2013, estavam continuamente à disposição deles, sem nenhuma perspectiva de regulamentação de seu tempo de trabalho ou de padronização legal dos salários. Uma continuação soft da vida de seus antepassados escravizados.

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3 comentários

EDUARDO LUIZ VIVEIROS DE FREITAS 29 de julho de 2023 18h17
Sensacional. Depois do cursinho do chá, viriam os seminários I e II lavar/secar a louça guardar a louça, o curso de extensão sobre arrumar a cama com ou sem troca de lençóis, a conferência sobre como ir, voltar e guardar as compras do supermercado e por aí agora. Quanta formação e informações novas nossa elite do atraso, ou suposta elite, absorveriam!!!
PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 30 de julho de 2023 23h47
Resposta à altura para a irmã de Nara Leão, prezada articulista Maria Rita Kehl. Isso mostra que a burguesia brasileira fede mesmo, como disse Cazuza. As empregadas domésticas, assim como os empregados domésticos são trabalhadores e acima de tudo seres humanos com os mesmos sentimentos que os seus patrões. Que o patronato brasileiro mire-se no exemplo do patronato europeu em que as empregadas domésticas são tratadas com dignidade, muito mais dignidade que aqui no Brasil, embora tenhamos exceções. Os trabalhadores domésticos, aliás, deveriam ter um capítulo próprio na CLT como os bancários, motoristas profissionais, jornalistas, professores, químicos, pois são trabalhadores e trabalhadoras que devem ter os seus direitos trabalhistas e sua dignidade respeitados a despeito do que pensam algumas pessoas da chamada Casa Grande.
ricardo fernandes de oliveira 31 de julho de 2023 11h07
E bom Atacar uma pessoa falecida, que não pode mais se defender. Danuza nunca foi elitista nem preconceituosa e suas colunas sempre foram de um Humor muito sutil. Mas sempre houve um grupo de pessoas limitadas que nunca entenderam seu humor e sua sutileza e preferiram atacá-la sem motivos. Várias das colunas que ela escreveu foram mal interpretadas e ela sofreu perseguições, até mandarem ela embora da folha, por causa de grupelhos que não sabem interpretar textos e gostam de posar de falsos moralistas

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