Do Micro Ao Macro
Efeito-tesoura pressiona caixa das PMEs no início de 2026
Entre dezembro e março, o efeito-tesoura combina alta de custos e retração de receitas, ampliando o risco de caixa negativo para pequenas e médias empresas
O efeito-tesoura já aparece nos números que cercam o início de 2026. Dados do Sebrae e da CNC mostram que 41% das PMEs entram no primeiro trimestre com caixa negativo, enquanto 7 em cada 10 não mantêm reserva para três meses de custos fixos. O período reúne despesas concentradas e menor consumo, cenário recorrente para negócios de menor porte.
Além disso, despesas típicas do fim de ano se acumulam. Entram na conta 13º salário, férias, encargos trabalhistas e reforço de estoques. Ao mesmo tempo, as vendas tendem a recuar após dezembro, abrindo a tesoura entre custos e receitas que marca o efeito-tesoura.
O calendário que aperta o caixa
Em seguida, a carga tributária do começo do ano amplia a pressão. Entre janeiro e março, vencem obrigações como DAS, IRPJ, IPTU, IPVA, Simples Nacional e recolhimentos federais. Também ocorrem reajustes contratuais anuais, o que reduz a folga financeira em um momento de faturamento menor.
Segundo Patrícia Bastazini, especialista em gestão contábil e fundadora da Bastazini Contabilidade, o problema se repete por falta de projeção. “Todos os anos, vemos empresas chegando a dezembro sem planejamento financeiro estruturado e encontrando em janeiro um acúmulo de obrigações. Esse ciclo poderia ser evitado com controle de fluxo de caixa e antecipação tributária”, afirma.
Dezembro define o efeito-tesoura
Na prática, dezembro funciona como ponto de partida do ano seguinte. “Dezembro não é fechamento; é diagnóstico. É quando o empresário avalia liquidez, mede a elasticidade de custos e projeta impactos tributários dos meses iniciais. Quem espera janeiro já perdeu tempo”, diz Bastazini.
Na mesma linha, estudos da Serasa Experian indicam que os pedidos de renegociação de dívidas empresariais crescem entre 20% e 28% no primeiro trimestre. Parte desse movimento ocorre pela ausência de um calendário financeiro detalhado, o que reduz poder de negociação com fornecedores e credores.
Planejamento reduz exposição
Diante desse quadro, a recomendação é agir antes da virada do ano. A Bastazini orienta revisar margem de contribuição, recalcular o ponto de equilíbrio, definir prioridades de pagamento e projetar tributos para os quatro primeiros meses. Essas medidas ajudam a reduzir a exposição ao efeito-tesoura logo no início do ciclo financeiro.
Por fim, o efeito-tesoura não surge de forma repentina. Ele se constrói nos meses anteriores, quando decisões são adiadas e números deixam de ser acompanhados com regularidade. Quem chega a janeiro com projeções claras mantém espaço de manobra; quem improvisa passa o ano administrando a falta de caixa.
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