Do Micro Ao Macro

A síndrome do vira-lata acabou na internacionalização das startups

Internacionalização deixa de ser exceção e passa a integrar a estratégia de empresas brasileiras que expandem operações e competem em mercados globais

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A internacionalização entrou de vez no radar das startups brasileiras. O avanço de startups e companhias consolidadas em mercados externos mostra que competir fora do país deixou de ser privilégio de grandes grupos e passou a fazer parte do ciclo natural de crescimento de negócios de tecnologia, serviços e produtos digitais.

Impulsionadas por um ecossistema mais maduro, pela busca de novos mercados e pela velocidade dos ciclos globais de inovação, empresas brasileiras ampliam presença internacional e disputam espaço com players europeus, americanos e asiáticos.

Segundo Pedro Waengertner, CEO da ACE Ventures, a internacionalização se tornou requisito competitivo. “Ela deixou de ser opcional. Mas não é pressa, é método. É validar problema, produto e mercado antes de escalar. Quem pula etapas costuma ficar pelo caminho”, afirma.

Mentalidade global desde a origem

Para algumas empresas, a internacionalização não veio depois do sucesso no mercado interno. Ela esteve presente desde a fundação. A Audaces, multinacional de tecnologia para a moda criada em 1992, estruturou cedo sua atuação fora do Brasil e inaugurou sede europeia na Itália em 2017.

De acordo com Matheus Fagundes, CEO da Audaces nas Américas, a diversidade cultural influencia diretamente o produto. “Desenvolvemos tecnologia para o mundo e trazemos aprendizados para o Brasil. Isso só acontece com equipes locais fortes e colaboração entre culturas”, afirma. A empresa atua hoje em mais de 100 países e prevê investimentos de R$ 1 bilhão até 2030.

Infraestrutura e credibilidade fora do país

A Huge Networks seguiu um caminho pouco convencional na internacionalização. Sua primeira infraestrutura física foi construída nos Estados Unidos para atender clientes brasileiros.

Segundo Erick Nascimento, CEO da empresa, o maior desafio foi construir credibilidade em um setor sensível como cibersegurança. “Investimos em compliance, infraestrutura local e cobrança em moeda local. Pensar global desde o início virou diferencial”, explica.

Choque cultural pesa mais que o técnico

Entre os principais obstáculos da internacionalização, executivos apontam a adaptação cultural. Fabio Brodbeck, CGO da OSTEC, destaca que a proximidade geográfica não significa semelhança de comportamento.

“No Chile, por exemplo, o termo ‘pentest’ não funciona, mas ‘ethical hacking’ abre portas. Vocabulário, postura e até vestimenta influenciam negociações”, afirma.

No setor de design e produto digital, a experiência foi semelhante. Guilherme Ferreira, CEO da Atomsix, relata que precisou reposicionar sua oferta. “Lá fora, o valor está em reduzir risco e acelerar lançamentos. Isso exigiu mudar narrativa, contratos e foco em nichos”, diz.

Presença local como parte da estratégia

Na WTM, a internacionalização incluiu imersão cultural. A empresa criou programas de intercâmbio corporativo no Canadá e nos Emirados Árabes.

Segundo Lisandro Vieira, CEO da WTM, entender o funcionamento do mercado local é decisivo. “Participar de eventos, conversar com players e vivenciar a cultura aumenta a assertividade. Equipes diversas ajudam nesse processo”, afirma.

Parcerias aceleram a internacionalização

Entidades de apoio têm papel relevante na expansão externa. A Associação Catarinense de Tecnologia (ACATE) apoiou mais de 150 empresas em missões internacionais em 2025, com foco na América do Norte, Europa e Oriente Médio.

De acordo com Henrique Bilbao, vice-presidente de Internacionalização da ACATE, conexão é fator central. “Abrir portas e criar visibilidade nos ecossistemas certos faz diferença. Nenhuma empresa se internacionaliza sozinha”, afirma.

Esse movimento aproximou startups brasileiras de grupos estrangeiros como Visma, Valsoft e Zucchetti.

O fator Brasil no exterior

A internacionalização de empresas brasileiras carrega estigmas e vantagens. De um lado, há desconfiança inicial sobre preço e qualidade. De outro, reconhecimento da capacidade de operar em um ambiente complexo.

“O Brasil exige soluções robustas. Quem escala aqui consegue escalar em outros mercados”, afirma Lisandro Vieira. Para Erick Nascimento, o volume de ataques digitais no país elevou o nível técnico das soluções desenvolvidas localmente.

Guilherme Ferreira acrescenta que adaptabilidade conta pontos. “O brasileiro resolve problemas complexos com criatividade. Isso chama atenção fora”, diz.

Conselhos para avançar na internacionalização

Executivos que já cruzaram fronteiras destacam que a internacionalização exige planejamento e disciplina. Entre as orientações mais recorrentes estão testar em pequena escala, escolher um mercado e um nicho, contar com parceiro local, adaptar produto e narrativa, conhecer profundamente o novo país e respeitar cada etapa do processo.

A experiência das empresas mostra que competir globalmente envolve menos improviso e mais método, com atenção constante às diferenças culturais, regulatórias e operacionais.

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