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Deu a louca no mundo

Yorgos Lanthimos procura espelhar, em Bugonia, uma realidade social que se apresenta no limite do absurdo

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Poderes. Emma Stone, em seu quinto trabalho com o diretor, vive uma CEO sequestrada por uma dupla que a vê como alienígena – Imagem: Focus Features
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“Boa parte do que parece distópico, neste filme, não é exatamente ficcional. É, em grande parte, um espelho do nosso tempo.” Foi assim que Yorgos Lanthimos definiu seu novo longa-metragem, Bugonia, em entrevista à Hollywood Reporter, ao ­exibi-lo no último Festival de Veneza.

O diretor grego explicou que, enquanto a palavra distopia remete ao futuro, o filme mostra algo que está acontecendo conosco agora: “Muito em breve, a humanidade vai encarar um ajuste de contas”.

Bugonia, em cartaz no Brasil desde a quinta-feira 27, é, de fato, mais uma subversão da onda de filmes distópicos do que um retrato da distopia.

Em seu quinto trabalho com ­Lanthimos, a atriz Emma Stone dá vida a Michelle, CEO de uma empresa de bioengenharia. A alucinante trama começa quando ela é sequestrada por Teddy ­(Jesse Plemons), um apicultor desempregado, e seu primo Don (Aidan Delbis), um jovem emocionalmente vulnerável.

Teddy tem certeza de que a poderosa executiva é uma alienígena e de que foi responsável pelo experimento que deixou sua mãe em coma.

Lanthimos, diretor de Pobres Criaturas (2023), leva a trama a lugares surpreendentes e improváveis. Embora seja o remake de um filme sul-coreano de 2003, Save the Green Planet!, Bugonia está absolutamente colado a estes anos 2020.

O abismo social, as teorias da conspiração amplificadas pelas redes sociais e a crise climática servem de motor para ações e diálogos que, como bem diz o cineasta, espelham uma realidade que se nos apresenta no limite do absurdo.

A principal chave de interpretação para o filme tem sido a de que ele trata do colapso das grandes narrativas. Palavras e fatos parecem tão sujeitos a interpretações díspares que, talvez, resida aí a nossa verdadeira distopia. Ao site de Roger Ebert, o cineasta disse que o filme é, no fundo, sobre pessoas que estão tentando convencer umas às outras de sua visão de mundo.

“Fala-se muito, mas, na prática, nada acontece. A ‘conversa’ torna-se, desse modo, o fato em si, a própria inação”, afirmou. “E isso é deprimente e confuso para alguém que vem de uma situação menos favorecida, como Teddy. Ele foi abusado por um sistema que continua falando, sem fazer nada – ou fazer algo que o ajude de alguma forma.”

A despeito da sobreposição de temas densos e do potencial reflexivo, Bugonia é tudo, menos sisudo. A mistura de gêneros – comédia satírica, thriller e ficção científica – cria uma atmosfera marcada por um senso de irrealidade que é a um só tempo perturbador e divertido. •

Publicado na edição n° 1390 de CartaCapital, em 03 de dezembro de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Deu a louca no mundo’

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