Economia
Em decisão histórica, Justiça francesa condena multinacional do petróleo por ‘greenwashing’
O termo em inglês se refere ao uso enganoso de argumentos que alegam boas práticas ecológicas; no caso concreto, a TotalEnergies tentou convencer consumidores, com base em dados distorcidos, de que conseguiria atingir a neutralidade de carbono até 2050


O Tribunal de Paris condenou a TotalEnergies na quinta-feira 23 por “práticas enganosas de marketing”. ONGs comemoraram a decisão, considerada histórica. Esta é a primeira vez que uma empresa petrolífera é condenada por greenwashing, o uso enganoso de argumentos que alegam boas práticas ecológicas.
A Justiça decidiu que a TotalEnergies fez alegações ambientais que “provavelmente alterariam o comportamento de compra dos consumidores” e os “induziriam ao erro”, levando-os a acreditar que a empresa conseguiria atingir a neutralidade de carbono até 2050, mesmo com o aumento da produção de petróleo e gás, segundo a declaração judicial.
Em maio de 2021, a Total mudou seu nome para TotalEnergies e lançou uma ampla campanha publicitária para promover “seu compromisso de alcançar a neutralidade de carbono até 2050”. Em cenários com turbinas eólicas, painéis solares e estações de recarga para veículos elétricos, essas mensagens foram amplamente divulgadas, tanto na França quanto no exterior, em outdoors, na imprensa, em seu site, em postos de gasolina, na televisão e em anúncios direcionados nas redes sociais.
As ONGs Greenpeace França, Amigos da Terra França e Notre Affaire à Tous, apoiadas pela associação Client Eath, ingressaram com a ação civil contra a empresa em 2022. Elas denunciaram que a multinacional não fundamentou suas alegações, visto que sua estratégia não está alinhada com o objetivo de “emissão zero” ou neutralidade de carbono até 2050.
Também segundo as organizações, a empresa não apenas omitiu do consumidor pelo menos 85% de suas emissões de gases de efeito estufa em relação à meta declarada, como também apresentou planos de produção que entram em conflito com os requisitos mínimos para atingir a neutralidade de carbono. Os combustíveis fósseis, principais responsáveis pelas mudanças climáticas, representam 90% da atividade da empresa e 80% de seus investimentos.
O tribunal ordenou à TotalEnergies e à TotalEnergies Electricité et Gaz France, responsáveis pela veiculação da publicidade, que cessem as alegações falsas no prazo de um mês, sob pena de multa provisória de 10 mil euros (cerca de 60 mil reais) por dia de atraso. A empresa também deverá publicar a decisão judicial em seu site, de forma visível, durante 180 dias.
Decisão histórica às vésperas da COP30
As ONGs comemoraram o que consideram um precedente importante na luta contra a desinformação climática promovida por multinacionais do setor petrolífero.
“Esta vitória marca um ponto de virada para a proteção do consumidor, a proteção do clima e o combate às práticas de greenwashing“, afirmaram as organizações em comunicado conjunto.
“É a primeira vez no mundo que uma grande empresa de petróleo e gás é condenada pela Justiça por ter enganado o público e por fazer greenwashing de sua imagem em relação à sua contribuição para o combate às mudanças climáticas”, disseram as três entidades.
As associações lamentaram, no entanto, que o tribunal tenha rejeitado suas alegações sobre gás e biocombustíveis, ao considerar que as comunicações sobre esses produtos não estavam “diretamente relacionadas à promoção, venda ou fornecimento de energia da TotalEnergies aos consumidores”.
A decisão, que sai às vésperas da COP30, em Belém, no Brasil, abre precedentes para outras ações semelhantes na Europa e no mundo.
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