Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

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‘MPB Ano Zero’ apresenta nova geração da canção brasileira e revisita 60 anos de história da sigla

Diferentes artistas estão envolvidos na iniciativa, que inclui o lançamento de singles, minidocumentários, shows e um álbum

‘MPB Ano Zero’ apresenta nova geração da canção brasileira e revisita 60 anos de história da sigla
‘MPB Ano Zero’ apresenta nova geração da canção brasileira e revisita 60 anos de história da sigla
O cantor e violonista fluminense Caxtrinho (Rafael Meliga / Divulgação)
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MPB é uma sigla polêmica e abrangente. O pesquisador, jornalista e escritor Hugo Sukman não a coloca dentro de um compartimento musical. “É a canção brasileira atravessada pela história e um tipo de música que abarca todos os gêneros e ritmos brasileiros”, define.

Segundo ele, a origem da sigla remonta ao início de um dos períodos mais conturbados da história do país: a ditadura militar de 1964. Sukman identifica naquele momento uma atualização da música brasileira, quando “o amor, o sorriso e a flor da bossa nova” deram lugar a uma canção mais politizada, agregando gêneros e ritmos diversos, sem abrir mão do lirismo musical.

A sigla, que significa Música Popular Brasileira, foi cunhada pelo MPB4, também em 1964, dando nome ao grupo. O primeiro disco de Nara Leão, lançado nesse mesmo ano, é exemplar desse novo momento, com a cantora gravando afro-sambas, sambistas do morro e músicas de protesto. Sukman lembra ainda que os três primeiros álbuns da carreira de Chico Buarque, lançados entre 1966 e 1968, funcionam como um inventário de ritmos e gêneros, retratando as transformações da música brasileira naquele período.

A partir dos anos 1980, a sigla MPB acabou se banalizando, passando a abarcar um número excessivo de artistas. Ainda assim, o pesquisador acredita que, nos últimos tempos, surgiu uma geração de músicos, cantores e compositores que traduzem bem o espírito original da MPB dos anos 1960.

“Tem uma geração dando continuidade e atualidade à MPB”, avalia, acrescentando que o recente contexto de turbulência política vivido pelo país impulsionou essa retomada. Além disso, os atuais artistas da MPB, assim como os das décadas de 1960 e 1970, vêm não apenas tratando a canção sob uma vertente sociopolítica, mas também pesquisando novos e antigos estilos musicais para incorporá-los ao próprio trabalho.

Aproveitando esse momento, Sukman idealizou o projeto MPB Ano Zero, em parceria com o produtor Marcelo Cabanas e o cantor Augusto Martins.

A iniciativa inclui o lançamento de 22 singles — um por semana — gravados por artistas que representam diferentes vertentes da MPB. A previsão é o lançamento de um álbum pela Biscoito Fino reunindo todas as faixas. Os singles são recriações de canções clássicas da música popular brasileira, como Construção (Chico Buarque), Romaria (Renato Teixeira), Começar de Novo (Ivan Lins e Vitor Martins) e Disparada (Theo de Barros e Geraldo Vandré), entre outras.

Além dos lançamentos sonoros, o projeto conta com minidocumentários sobre os artistas participantes e espetáculos semanais no Espaço Cultural Sérgio Porto, no Rio de Janeiro. Nesses shows, os artistas apresentam também parte de sua obra autoral. Todas as etapas do projeto já estão em andamento e têm previsão de término em novembro.

“Todos esses artistas são muito consistentes, atuais e referenciados na tradição. Depois de uma terra arrasada na cultura dos últimos anos, a gente mostra uma exuberância. Nunca vi uma geração tão consistente nesse sentido da canção”, afirma Sukman. Segundo o pesquisador, muitos nomes ainda ficaram de fora, e a ideia do projeto foi buscar representatividade.

O nome MPB Ano Zero é, segundo ele, uma “provocação”. “Pensei muito no filme Alemanha, Ano Zero (1948), de Roberto Rossellini, filmado em uma Berlim destruída pela guerra. É uma referência aos últimos anos do Brasil, quando se tentou destruir a cultura e se alimentou a falsa percepção de que a canção brasileira havia morrido”, explica.

A canção símbolo do projeto é Bedengó, de Claudia Castelo Branco e Renato Frazão, interpretada justamente pelo MPB4, padrinho da iniciativa e ponto de partida do projeto. O meteorito Bendegó, peça central do Museu Nacional do Rio de Janeiro, sobreviveu ao incêndio de 2018 que devastou a instituição — e tornou-se um símbolo da resistência cultural diante do descaso dos últimos anos.

Os artistas envolvidos no projeto MPB Ano Zero são: Cláudia Castelo Branco e Luísa Lacerda, Augusto Ordine e Mauro Aguiar, Alice Passos e Renato Frazão, Andréa Dutra e Augusto Martins, Breno Ruiz, Gabriel Versiani, Aline Paes e Bondesom, Ilessi, Bena Lobo, Camila Costa, Luiza Borges e Thiago de Melo, Bernardo Diniz, Marcelo Menezes, Thiago Amud, Vidal Assis, Alfredo Del Penho e Moyseis Marques, Miguel Rabello, Caxtrinho, Marina Íris e Manu da Cuíca, Juliana Linhares e Fred Demarca, e Gabriel da Muda.

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