Jandira Feghali

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É deputada federal (PCdoB-RJ), vice-líder do governo Lula na Câmara dos Deputados e vice-presidente nacional do PCdoB

Opinião

O Brasil do futuro x o Brasil de sempre

O levante contra a PEC da Blindagem e a anistia não é pauta de governo, e sim da democracia

O Brasil do futuro x o Brasil de sempre
O Brasil do futuro x o Brasil de sempre
A deputada federal Jandira Feghali. Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados
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Na semana passada, parte expressiva da Câmara dos Deputados comemorou, com muitos gritos, abraços e até orações coletivas, a aprovação de dois projetos. Não festejavam a garantia de mais recursos para as universidades e a educação de base, nem o incentivo às Artes e à Economia da Cultura, tampouco a promoção da Ciência e da Inovação Tecnológica, muito menos a isenção do IR, a ampliação do Sistema Único de Saúde ou o combate à crise climática. Eles celebravam a própria impunidade. 

Na terça-feira, diante de uma série de demandas urgentes da sociedade brasileira, 353 deputadas e deputados (de um total de 513) votaram “sim” a uma proposta de emenda constitucional que literalmente os coloca fora do alcance da Lei. Na noite seguinte, 311 parlamentares aprovaram a urgência para a tramitação de um projeto de lei que anistia os golpistas de 2022 e 2023. Em especial, o líder de organização criminosa Jair Bolsonaro, já condenado a 27 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal. 

Enquanto 70% dos votos contrários à blindagem de parlamentares de processos criminais vieram dos partidos de esquerda, 93% dos votos “a favor de proibir punir político”, como sintetizou o sociólogo Celso Rocha de Barros, foram de partidos de direita e extrema-direita. Ou seja, é um problema localizado no bolsonarismo (radicalizado a ponto de viver num Brasil paralelo) abraçado à maioria do Centrão em torno de uma das agendas mais dissociadas da realidade de que já se teve notícia. 

O resultado de tamanha ousadia em causa própria foi uma reação popular inequívoca como a que vimos neste domingo nas ruas do Brasil. As multidões indignadas que tomaram todas as capitais e dezenas de cidades em todo o país disseram em alto e bom som: queremos o Brasil do futuro, não o de sempre, que alivia para o andar de cima e deixa generais de quatro estrelas e ex presidente livres para planejar o próximo golpe. A voz das ruas já ecoa forte: não aceitamos perdão para golpistas nem im(p)unidade para políticos.

Esta pode ser uma semana de inflexão no Congresso. O povo mostrou que está ao lado do governo e do STF. Parlamentares insistirão em legislar contra os interesses da população? Ao paralisarem a Câmara para forçar pautas que, além de impopulares, são inconstitucionais, a oposição confessou que não quer a isenção do imposto de renda para quem recebe até 5 mil reais, não pensa em garantir o direito a uma vida livre da escravização moderna da escala 6×1, não liga para regulação das big techs que ameaçam nossa soberania (até trabalham a favor delas) – e nem fale em taxação dos super-ricos e justiça tributária perto deles. 

A PEC da Blindagem e a anistia não são pautas de governo ou oposição. São pautas da democracia (ou da ausência dela). As prerrogativas constitucionais para parlamentares já existem. Temos imunidade para opinião, voz e voto. Mas não podemos compactuar com crimes sem processo, investigação e condenação, protegidos por um corporativismo inaceitável. Essas votações jogam a Câmara dos Deputados na lama e isso é péssimo para a democracia brasileira. O Parlamento é o único poder completamente derivado do voto popular e não pode ser desmoralizado.

Precisamos de uma agenda positiva de pautas que melhorem a vida das trabalhadoras e dos trabalhadores brasileiros, que previnam e punam crimes no ambiente digital, valorizem o desenvolvimento sustentável, reforcem a nossa identidade e pluralidade. Já passou da hora. Estas são demandas contemporâneas, complexas e inadiáveis, e não podem ficar a reboque dos interesses privados (por vezes obscuros) de parlamentares que deram as costas para a sociedade brasileira. 

Ao se aglutinarem em torno de assuntos que a população rejeita, estes políticos escancaram o desprezo pelo próprio ofício de legisladores. E demonstram a importância de se escolher bem os parlamentares na próxima eleição. Antes disso, esperamos que as ruas tenham lembrado aos ocupantes desta legislatura que eles foram eleitos para elaborar projetos que tragam desenvolvimento ao país, justiça social e tributária para o povo e a defesa incontestável da soberania brasileira. Precisamos superar os motins, o bullying, as grosserias, a violência política, ameaças e agressões e impor, pelo debate político e democrático, as pautas que o povo brasileiro espera ver apreciadas e aprovadas no Congresso. 

Vamos em frente, com serenidade, fé no Brasil e amor no coração. Ao lado do povo.  Por soberania, democracia e direitos. E sem anistia.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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