Do Micro Ao Macro
Lixo urbano pode agravar ou frear o aquecimento: veja o que estudo internacional revelou no Brasil
Dados do Brasil apontam que políticas de Resíduo Zero podem cortar em até 40% o aquecimento até 2060


Um estudo conduzido pela Aliança Global por Alternativas à Incineração (GAIA) demonstrou que a queima de resíduos domiciliares amplia emissões de dióxido de carbono e agrava a crise climática. A pesquisa comparou três estratégias de gestão de lixo em Lagos (Nigéria), Quezon City (Filipinas) e Barueri (Brasil): aterros, incineradores e sistemas de Resíduo Zero.
No caso brasileiro, o Instituto Pólis foi responsável pela coleta e modelagem dos dados de Barueri. As projeções até 2060 apontaram que a compostagem e a reciclagem poderiam reduzir em 40% o aquecimento climático em relação à incineração, equivalente à retirada de 650 mil carros das ruas por um ano.
Cenários projetados
Em Barueri, a comparação de cenários estimou 11,4 milhões de toneladas de CO₂ equivalente em aterros, 10,2 milhões em incineradores e 6,7 milhões em sistemas de Resíduo Zero até 2060. A diferença está relacionada à capacidade de compostagem e reciclagem de cortar emissões de metano e dióxido de carbono.
Enquanto o metano é mais potente no curto prazo, o CO₂ permanece por séculos na atmosfera, exigindo soluções que enfrentem ambos os gases. A análise também mostrou que reciclagem e compostagem são mais baratas, criam mais empregos por tonelada de resíduo e fortalecem a economia circular.
Avanço da incineração
Apesar das evidências, Barueri avança na instalação do primeiro incinerador de lixo do Brasil. Uma Ação Civil Pública questiona a obra por irregularidades no licenciamento e riscos para a população. O pedido de licença entregue à CETESB em 2024 foi baseado em estudo simplificado, sem audiência pública atualizada nem relatório completo de impacto ambiental.
Em São Paulo, a Prefeitura prevê investir R$ 80 bilhões em incineração nos próximos 20 anos, valor que poderia ser destinado a programas de reciclagem, compostagem e reúso.
De acordo com Victor Argentino, coordenador de projetos do Instituto Pólis, “esses projetos drenam o orçamento público e aumentam custos para a população, além de gerar menos empregos do que alternativas de Resíduo Zero”.
Impacto social
Além do efeito climático, a instalação de incineradores ameaça o trabalho de catadores, já que prioriza a queima de resíduos recicláveis. Para Rafael Eudes, da Aliança Resíduo Zero Brasil, “a estratégia de Resíduo Zero é a via mais rápida e econômica para reduzir emissões de metano e sustentar uma transição justa”.
Segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG, 2022), a disposição de resíduos orgânicos em aterros e lixões responde por quase 10% das emissões de metano no Brasil.
Iniciativa nacional
O Instituto Pólis coordena o programa Brasil Composta Cultiva, voltado a apoiar prefeituras, cooperativas e técnicos municipais na gestão de resíduos orgânicos. A iniciativa busca reduzir o envio de material orgânico a aterros, ampliar práticas de compostagem e diminuir emissões de gases de efeito estufa no setor.
A plataforma reúne ferramentas, dados e estudos de caso e promove a troca de experiências entre gestores e catadores, com foco em justiça ambiental e em uma transição justa para o setor de resíduos.
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