Entrevistas
Após julgamento, ‘chororô’ da anistia se reduzirá até a insignificância, diz ex-chanceler
Aloysio Nunes vê a decisão do STF como a afirmação do poder civil sobre o despotismo militar, mas teme reação dos EUA


A decisão do Supremo Tribunal Federal de condenar Jair Bolsonaro (PL) e outros sete integrantes do núcleo crucial da tentativa de golpe reafirma o poder civil na contenção do despotismo militar, avalia o ex-chanceler Aloysio Nunes. Segundo ele, embora não elimine a tensão política no Brasil, o julgamento ajudará a enterrar a anistia articulada pelos bolsonaristas.
Ao longo da votação na Primeira Turma, ministros enviaram um recado direto ao Legislativo: a Corte declarará inconstitucional qualquer tentativa de perdoar os condenados. O relator do processo, Alexandre de Moraes, afirmou não caber indulto presidencial, anistia via Congresso Nacional ou perdão judicial a sentenciados por crimes contra a democracia.
Para Aloysio Nunes, a tensão permanecerá no ar, uma vez que o bolsonarismo tem influência na política e na opinião pública.
“Continuarão os esforços por parte de Tarcísios e Malafaias para deslegitimar o Supremo”, projeta o ex-ministro. “Mas penso que, à medida que a miragem da anistia se dissipe diante da posição expressa por vários ministros do STF, esse chororô acabará por se reduzir até a insignificância.”
O resultado do julgamento também contribui, de acordo com Aloysio, para arquivar a ideia de que o artigo 142 da Constituição autorizaria a intervenção das Forças Armadas como uma espécie de poder moderador. Trata-se de uma interpretação à qual os bolsonaristas recorreram diversas vezes ao longo dos últimos anos.
Assim, diz o ex-chanceler, a condenação pela trama golpista também representa um alento para os setores legalistas e democráticos da caserna. “O julgamento empurra o golpismo da extrema-direita para a lata de lixo da História. Mas de dentro da lata de lixo ele continuará a exalar o seu mau cheiro em nossa atmosfera por um bom tempo.”
A conclusão do processo ocorreu dois dias depois de a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, defender as sanções contra o Brasil e afirmar que o presidente Donald Trump não tem medo de utilizar o poder militar para “proteger a liberdade de expressão ao redor do mundo”.
Nos últimos meses, os Estados Unidos já aplicaram uma sobretaxa contra a importação de produtos brasileiros e recorreram à Lei Magnitsky para punir Alexandre de Moraes, na tentativa de intimidar o STF e livrar Bolsonaro da condenação.
Aloysio Nunes teme a imposição de novas sanções ao País, devido especialmente à afinidade ideológica entre o trumpismo e o bolsonarismo. “Nossa extrema-direita se constitui em um agente dos Estados Unidos, como ficou evidenciado no desfraldar daquela imensa bandeira norte-americana na manifestação golpista de domingo passado, de modo que essa ameaça continuará a pairar.”
Nunes também já foi vice-governador paulista, deputado, senador e ministro da Justiça. Atualmente, trabalha no escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, a ApexBrasil, na Bélgica.
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