Cultura
Morre o cineasta Silvio Tendler, aos 75 anos
Um dos maiores documentaristas brasileiros, ele se notabilizou por filmes que contaram histórias de personagens como João Goulart, Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves


Morreu nesta sexta-feira 5, aos 75 anos o cineasta Silvio Tendler, um dos maiores documentaristas da história do cinema brasileiro. A morte foi confirmada pela produtora da família, que informou, ainda, que o velório acontecerá no domingo 7.
Tendler enfrentava há anos uma neuropatia diabética, doença que ataca o sistema nervoso. O hospital Copa Star, onde ele estava internado, informou que a família não autorizou a divulgação de detalhes.
Com mais de cem obras, Tendler ficou conhecido como “o cineasta dos sonhos interrompidos”. Ele iniciou a carreira na década de 60, no Rio, como integrante do movimento cineclubista. O primeiro filme que produziu foi em 1968, ano do AI-5, e contava a história da Revolta da Chibata, após conhecer o marinheiro João Cândido.
Chegou a iniciar a faculdade de Direito após o primeiro filme, mas decidiu dedicar-se ao cinema. Teve postura firme contra a ditadura militar no país, e foi réu de um inquérito após seu amigo Elmar de Oliveira sequestrar um avião e levá-lo a Cuba. Partiu para o exílio em 1970. Viveu no Chile, depois da posse de Salvador Allende, e seguiu produzindo. Presenciou o golpe que derrubou o presidente socialista e levou Augusto Pinochet ao poder.
Tendler viveu ainda na França, onde integrou um coletivo que produziu um filme sobre a situação no Chile. Em Paris, formou-se em história e fez mestrado em Cinema. Retornou ao Brasil em 1976, ainda durante a ditadura, e iniciou o trabalho para seu primeiro longa-metragem, Os Anos JK – Uma Trajetória Política. Fez ainda Jango, sobre a carreira de João Goulart, e, anos mais tarde, Tancredo – A Travessia, que contou a história de Tancredo Neves.
Foi um militante das Diretas Já, e ainda teve atuação na política institucional, como secretário de Cultura no governo de Cristovam Buarque, no Distrito Federal, entre 1995 e 1996. Em 1997, se tornou coordenador de Audiovisual para o Brasil e o Mercosul da Unesco, braço das Nações Unidas para a Educação e a Cultura.
Em 2001 fez os filmes Marighella, Retrato falado do guerrilheiro e Milton Santos, pensador do Brasil. Foi, por décadas, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Recebeu dezenas de prêmios, no Brasil e no exterior.
Tendler tem as três maiores bilheterias de documentários na história do Brasil: com os filmes sobre JK e Jango e O Mundo Mágico dos Trapalhões, sobre o grupo humorístico de Renato Aragão, Dedé Santana, Mussum e Zacarias, em 1981.
Repercussão
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em nota de pesar, disse que Tendler foi “um dos maiores documentaristas do Brasil”. Lula lembrou que condecorou o cineasta com a Ordem de Rio Branco, em 2006, e com a Ordem do Mérito Cultural, neste ano.
“Em seus filmes, soube resumir e explicar importantes momentos de nossa história, como os governos de Juscelino Kubitschek e João Goulart e a trajetória de Tancredo Neves durante a redemocratização”, afirmou o presidente, que ofereceu solidariedade aos familiares e amigos.
A atriz Julia Lemmertz, que trabalhou com Tendler em filmes como O Veneno Está na Mesa e Alma Imoral, postou nas redes sociais uma homenagem ao cineasta, que, segundo ela, era dono de “um incansável olhar sobre o Brasil e suas batalhas”. “Uma falta imensa ele vai fazer. Por mais Silvios Tendlers no mundo”, escreveu a atriz, que prestou condolências à filha Ana Rosa Tendler.
A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) disse que os filmes de Tendler estão entre os “mais refinados exercícios de Memória que o Brasil possui – e lembrar, aprender e refletir sobre o passado é peça-chave para a construção do futuro que Tendler sonhava para o nosso país e nosso povo”.
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