Política

O que é o Caso Dreyfus, evocado pela defesa de Bolsonaro durante o julgamento da trama golpista

Diante do STF, a defesa do ex-capitão sugeriu que uma condenação do ex-presidente é injusta e provocará um levante popular, como no caso francês; a comparação, porém, tropeça nos fatos

O que é o Caso Dreyfus, evocado pela defesa de Bolsonaro durante o julgamento da trama golpista
O que é o Caso Dreyfus, evocado pela defesa de Bolsonaro durante o julgamento da trama golpista
Paulo Bueno, advogado do ex-presidente Jair Bolsonaro, durante o 2º dia de julgamento da trama golpista. Foto: Rosinei Coutinho/STF
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No segundo dia de julgamento do núcleo central da trama golpista no Supremo Tribunal Federal, o advogado Paulo Cunha, um dos responsáveis pela defesa de Jair Bolsonaro (PL), evocou o caso Dreyfus, que dividiu a França no final do século XIX, para sustentar que o ex-presidente estaria sendo alvo de uma condenação sem provas.

Cunha alegou que Bolsonaro não participou ativamente do plano para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Argumentou que, se quisesse, teria todos os instrumentos para executar o golpe e não o fez. E, ao pedir que a decisão fosse pautada na “credibilidade” e não em “narrativas ou suposições”, alertou contra a criação de uma “versão brasileira do caso Dreyfus”.

“Nós não podemos permitir que entendam que a esta corte terá faltado atenção a gravidade deste caso e a falta de elementos que possam imputar ao presidente Jair Bolsonaro os delitos que lhe são direcionados”, complementou Cunha. “Senhores ministros, não permitamos em hipótese alguma criarmos neste processo uma versão brasileira e atualizada do emblemático caso Dreyfus.

Cunha complementava a sustentação oral do advogado Celso Vilardi, que defendeu a ausência de provas que liguem o Bolsonaro ao plano Punhal Verde e Amarelo e também insistiu na tese de que o ex-presidente não participou ou instigou qualquer insurreição contra o resultado das eleições de 2022.

A retórica, no entanto, tropeça nos fatos. Alfred Dreyfus, oficial judeu do exército francês, foi condenado em 1894 por espionagem sem qualquer prova, vítima de uma conspiração de generais, juízes, políticos e jornalistas, movidos por interesses de Estado e por um antissemitismo visceral.

Já Jair Bolsonaro não responde a um erro judiciário, mas a um conjunto robusto de acusações que inclui tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Se condenado na ação do golpe, o ex-presidente pode pegar até 43 anos de prisão somando todas as penas aplicáveis.

A comparação entre Bolsonaro e Dreyfus já havia aparecido em postagens do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) em defesa do pai nas redes sociais.

O caso

Capitão de artilharia do exército francês, Alfred Dreyfus foi condenado à prisão perpétua por traição da pátria em 1894, sob a suposta alegação de ter entregue documentos militares à Alemanha em meio à crise da Terceira República Francesa. Dois anos depois, novas evidências vieram à tona, que comprovaram que o verdadeiro espião era o oficial Ferdinand Walsin-Esterhazy.

À época, quatro militares de alto escalão ligados a Ferdinand tentaram suprimir as novas provas, de modo que o tribunal militar absolveu o oficial por unanimidade. No mesmo ano, o Exército francês apresentou acusações adicionais contra Dreyfus, com base em documentos falsos, que levou a um novo julgamento em 1899. A supressão das provas reais e a tentativa do uso de material falso resultou em um grande levante popular e que, junto À pressão da imprensa, levou a Justiça francesa a reabrir o caso em 1906, resultando na absolvição de Dreyfus.

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