Mundo
Especialistas dos EUA criticam relatório climático de Trump
Cientistas acusaram o governo de se basear em autores que utilizaram estudos desacreditados, deturparam evidências e evitaram a revisão por pares


Mais de 80 especialistas dos Estados Unidos denunciaram nesta terça-feira 2 um relatório climático da administração de Donald Trump por reviver as táticas da indústria do tabaco para semear dúvidas sobre o consenso científico.
Em uma refutação de 440 páginas, 85 cientistas acusaram o governo de se basear em um punhado de autores que utilizaram estudos desacreditados, deturparam evidências e evitaram a revisão por pares para alcançar conclusões pré-determinadas.
O relatório de 150 páginas da administração, publicado no site do Departamento de Energia (DOE, na sigla em inglês) no fim de julho, tinha o propósito de apoiar sua proposta para anular a chamada Declaração de Perigo de 2009, a base legal de diversas regulamentações federais sobre gases de efeito estufa.
“Este relatório é um escárnio à ciência”, disse Andrew Dessler, cientista climático da Universidade Texas A&M e coautor do documento que o refuta.
“Ele se baseia em ideias que foram rejeitadas há muito tempo, apoiadas por deturpações do corpo de conhecimento científico, omissões de fatos importantes, vaguidões, anedotas e vieses de confirmação.”
O documento do DOE, intitulado Uma revisão crítica dos impactos das emissões de gases de efeito estufa no clima dos Estados Unidos, apresenta uma série de afirmações surpreendentes e, às vezes, contraditórias.
Estas incluem que eventos extremos relacionados às emissões não estão aumentando, que as temperaturas nos Estados Unidos não estão subindo, que uma maior quantidade de dióxido de carbono atmosférico impulsionaria a agricultura e que a atividade solar poderia explicar as tendências de aquecimento global.
A refutação reúne especialistas de múltiplas disciplinas.
“Assim como a indústria do tabaco financiou cientistas para questionar os danos do fumo, a indústria de combustíveis fósseis realizou uma campanha coordenada durante os anos 90 para financiar cientistas dispostos a argumentar que era o Sol, e não os humanos, a causa da mudança climática observada até aquele momento”, disse Ted Amur, cientista climático da Aon Impact Forecasting, que acrescentou estar alarmado ao ver ressurgirem “argumentos zumbis”.
Desde que retornou ao cargo, em janeiro, Donald Trump foi muito além da agenda pró-combustíveis fósseis de seu primeiro mandato. Os republicanos aprovaram recentemente a lei orçamentária com cortes em créditos fiscais para energias limpas e a abertura de áreas ecologicamente sensíveis para perfuração.
Trump também retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris e está promovendo sua agenda de combustíveis fósseis no exterior, entre outras ações.
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