Educação

Dificuldade de acesso deixa 2,3 milhões de crianças fora de creches, aponta estudo

Apesar de não ser obrigatória, a etapa é um direito das crianças de 0 a 3 anos; levantamento do Todos Pela Educação mostra lentidão na expansão

Dificuldade de acesso deixa 2,3 milhões de crianças fora de creches, aponta estudo
Dificuldade de acesso deixa 2,3 milhões de crianças fora de creches, aponta estudo
Créditos: EBC
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Cerca de 2,3 milhões de crianças de 0 a 3 anos estão fora das creches no País por dificuldades de acesso. Os dados constam em um relatório divulgado nesta segunda-feira 11 pelo Todos Pela Educação, que ainda escancara o aumento da desigualdade à educação infantil (que compreende creche e pré-escola) entre as crianças de famílias mais pobres e mais ricas.

A creche, embora não seja obrigatória, é um direito previsto para todas as crianças dessa faixa etária. Isso significa que cabe ao Estado garantir vagas e condições para atender a demanda. Mas o ritmo de expansão está longe de ser suficiente: a taxa de atendimento chegou a 41,2% em 2024, contra 31,8% em 2016 — um avanço de apenas 1,2 ponto percentual ao ano. Assim, o País ficou aquém da meta do atual Plano Nacional de Educação, que previa cobertura de pelo menos 50% das crianças de até 3 anos até 2024.

O estudo revela ainda que 35,2% das crianças de 0 a 3 anos estão fora da creche por decisão das famílias. Mas cresce o grupo que fica sem atendimento mesmo querendo vaga — por falta de espaço, distância ou recusa por idade. Em 2016, essa era a realidade de 18,2% das crianças; em 2024, subiu para 19,7%.

O desafio é mais agudo entre os bebês de 0 a 1 ano: quase um quarto (24,8%) não consegue vaga por dificuldade de acesso — aumento de quase seis pontos percentuais desde 2016. Para crianças de 2 e 3 anos, a proporção é de 15%, e neste grupo houve ligeira melhora.

Pobreza e geografia pesam no acesso

A desigualdade de acesso se aprofunda conforme o nível socioeconômico das famílias. Entre os 20% mais pobres, só 30,6% das crianças estão em creches — dez pontos abaixo da média nacional. Já entre os 20% mais ricos, a taxa chega a 60%. Quanto maior a renda, maior a chance de conseguir vaga.

Também há distorções regionais. Embora, nos últimos 5 anos, todos os estados ampliaram sua oferta de creches, essa ampliação ocorreu de forma bastante desigual. Em 2024, São Paulo e Santa Catarina foram os únicos a superar 50% de cobertura, mas ainda com bolsões de exclusão: 9,4% e 12,1% das crianças, respectivamente, seguem fora por falta de acesso. No outro extremo, as menores taxas estão no Norte e Nordeste.

Em números absolutos, Minas Gerais, Bahia, São Paulo, Pará, Pernambuco e Maranhão são, respectivamente, os estados com maior número de crianças de 0 a 3 anos com dificuldade de acesso à Educação Infantil. Juntos, os seis representam mais
da metade (51,1%) da demanda por creche não atendida no país, que atualmente é de mais de 2,28 milhões de vagas.

Pré-escola: quase universal, mas não para todos

A situação da pré-escola, voltada a crianças de 4 e 5 anos e obrigatória por lei, é menos dramática, mas não resolvida. Em 2024, a taxa de atendimento chegou a 94,6%, mas 329 mil crianças seguem fora da sala de aula.

O recorte por renda mostra que, ao contrário das creches, a desigualdade diminuiu nos últimos anos — em parte porque caiu o atendimento entre as famílias mais ricas. Ainda assim, entre os mais pobres, a dificuldade de acesso é o principal obstáculo, enquanto nos mais ricos ela praticamente não existe.

O levantamento também chama atenção para um dado preocupante: mesmo com a obrigatoriedade, 2,6% das crianças de 4 a 5 anos estão fora da pré-escola por decisão das famílias. Os pesquisadores defendem busca ativa articulada com a assistência social e o sistema de justiça para efetivar o direito.

As desigualdades regionais seguem marcantes. Só o Piauí universalizou o acesso; no outro extremo, o Amapá atende apenas 69,8% das crianças dessa faixa etária. Em números absolutos, São Paulo lidera com 61,4 mil crianças fora da pré-escola, seguido por Rio Grande do Sul (28 mil) e Minas Gerais (24,4 mil).

O que precisa mudar

O estudo conclui que expandir a educação infantil com foco na equidade deve ser prioridade nacional. Isso exige políticas indutoras robustas, financiamento adequado e maior colaboração entre União, estados e municípios. Entre os avanços recentes, cita a criação do Compromisso Nacional pela Qualidade e Equidade na Educação Infantil (Conaquei) e da Política Nacional Integrada para a Primeira Infância, lançados pelo governo federal em 2025.

Mas o desafio será ainda maior: o novo Plano Nacional de Educação, em tramitação, eleva a meta para 60% das crianças de 0 a 3 anos em creches na próxima década.

“Garantir o direito à educação infantil de qualidade, com foco na redução das desigualdades, é imprescindível para a construção de um país mais justo, com oportunidades para todas as crianças desde o início de suas trajetórias escolares”, reforçam os pesquisadores.

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