Paulo Artaxo

Cientistas e pesquisador do Centro de Estudos Amazônia Sustentável da USP.

Opinião

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Sinergia climática

A reunião de cúpula dos BRICS avança em temas sensíveis para a COP30 no Brasil

Sinergia climática
Sinergia climática
Créditos: Ricardo Stuckert / PR
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O documento final da cúpula dos BRICS menciona 20 vezes a questão climática, destacando a posição do bloco sobre pontos críticos que serão tratados pela 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP30. Intitulado Fortalecendo a Cooperação do Sul Global para Uma Governança Mais Inclusiva e Sustentável, o texto ressalta já em sua primeira página a importância das finanças climáticas e reafirma o compromisso com o fortalecimento da governança global e do multilateralismo, elementos essenciais para o sucesso da COP30. O documento também deixa claro que todos os países devem cumprir suas obrigações no âmbito do Acordo de Paris. No entanto, um tema estratégico foi deixado de fora: o fim da exploração e do uso de combustíveis fósseis.

Fazem parte dos BRICS 11 economias emergentes, entre elas China, Índia, Rússia e Brasil, responsáveis por mais de 60% das emissões globais de gases de efeito estufa. Cada um adota estratégias distintas para lidar com a crise climática. A China, maior emissora mundial, também lidera os investimentos em energia solar e eólica, avançando em sua transição energética. A Índia, embora seja um emissor relevante, apresenta emissões per capita muito inferiores às da Europa e dos EUA.

A Rússia, assim como Irã, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita, mantém uma economia fortemente baseada no petróleo e não vem adotando estratégias significativas de redução de emissões. Já Brasil e Indonésia têm no desmatamento de florestas sua principal fonte de emissões, com promessas de redução significativa desse vetor. Trata-se de uma situação complexa dentro de um grupo que exerce um papel cada vez mais relevante, e que exigirá negociações intensas na COP30.

Apesar de omitir-se na questão do abandono dos combustíveis fósseis, a cúpula dos BRICS demonstrou que o grupo de economias emergentes pode desempenhar papel relevante nas negociações da COP30, em novembro, especialmente em temas como financiamento e preservação das florestas tropicais. Os líderes do bloco reafirmaram o multilateralismo como elemento essencial para enfrentar os desafios que a crise do clima impõe ao mundo.

A Declaração-Marco sobre Finanças Climáticas dos BRICS é um documento inédito que defende com ênfase a criação de mecanismos para que os países desenvolvidos financiem a transição energética e a adaptação climática nos países em desenvolvimento. A declaração também articula posições práticas sobre créditos e financiamentos concessionais, riscos cambiais, finanças de transição, taxonomias e cooperação Sul-Sul.

Certamente, esta será uma das principais disputas políticas da Conferência do Clima. Os BRICS defendem uma reforma do sistema financeiro internacional e apoiam a presidência da COP30 na meta de alcançar 1,3 trilhão de dólares para que os países em desenvolvimento possam enfrentar os desafios climáticos. Para garantir o acesso a financiamentos sustentáveis no Sul Global, os países do bloco enfatizam a importância de recursos concessionais “para facilitar transições justas, baseadas em prioridades de desenvolvimento nacionalmente determinadas, que combinem a ação climática com o desenvolvimento sustentável”.

O documento destaca o papel da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) como principal espaço de cooperação internacional nessa agenda, e reforça a necessidade de empenho na implementação “plena e efetiva” do Acordo de Paris. O texto também conclama os países a fortalecerem suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) para 2030.

Além disso, o texto discute o desequilíbrio no acesso a recursos para adaptação climática nos países em desenvolvimento. Ressalta-se que essa disparidade afeta de forma particularmente negativa os segmentos mais vulneráveis da população diante dos impactos das emergências climáticas. A adaptação, segundo o documento, deve ocorrer de forma a reduzir as desigualdades sociais, com foco na erradicação da pobreza.

Há ainda uma sessão intitulada “Meio Ambiente, COP30 e Saúde Global”, que reforçou o compromisso do grupo com a equidade em saúde, especialmente no Sul Global. Nesse contexto, foram firmadas parcerias para eliminar as Doenças Socialmente Determinadas (DSDs).

Os BRICS também podem exercer um papel decisivo no fortalecimento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). China e Emirados Árabes Unidos estão avaliando investir no fundo, que deverá contar ainda com aportes de capital privado, segundo o modelo em desenvolvimento pelo Ministério da Fazenda, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.

São avanços importantes tanto para a COP30 quanto para a consolidação dos BRICS como atores relevantes na nova geopolítica global. •

Publicado na edição n° 1370 de CartaCapital, em 16 de julho de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Sinergia climática’

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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