Política
Braga Netto aprovou plano que incluía matar Lula, Alckmin e Moraes, conclui a PF
O documento detalha a participação do general na articulação de ações clandestinas, disseminação de desinformação e no planejamento de um ‘gabinete de crise’ pós-golpe


O general Walter Braga Netto, ex-ministro e candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro (PL), emerge como figura central no esquema que buscava manter o ex-capitão no poder e impedir a posse do governo eleito, segundo o relatório final da Polícia Federal que indiciou Bolsonaro e mais 36 pessoas pela conspiração de 2022.
O documento, tornado público pelo STF nesta terça 26, detalha a participação de Braga Netto na articulação de ações clandestinas, disseminação de desinformação e até no planejamento de um “gabinete de crise” para um cenário pós-golpe, além de tentar obstruir investigações.
Segundo a polícia, o ex-ministro não só tinha conhecimento, mas aprovou o plano intitulado “Punhal Verde Amarelo”, que previa até o assassinato do então presidente Lula (PT), do vice Geraldo Alckmin e do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.
Diz o relatório:
“(…) os elementos probatórios obtidos ao longo da investigação evidenciam a sua participação concreta nos atos relacionados a tentativa de Golpe de Estado e da Abolição do Estado Democrático de Direito, inclusive na tentativa de embaraçamento e obstrução do presente procedimento.”
Moraes encaminhou o inquérito à Procuradoria-Geral da República. Cabe agora à PGR decidir entre denunciar os indiciados, arquivar o caso ou solicitar novas diligências.
Participação ativa na trama golpista
Segundo as conclusões da PF, Braga Netto aprovou pessoalmente ‘ações clandestinas’ cujo objetivo era dar suporte às medidas necessárias para tentar impedir a posse do governo eleito e restringir o exercício do Judiciário. O ponto de partida dessas ações foi uma reunião ocorrida no dia 12 de novembro de 2022 na casa do general, em Brasília.
Diz a PF:
“A investigação identificou que, após a elaboração do planejamento operacional, realizado pelo general MARIO FERNANDES, para prender/matar o ministro ALEXANDRE DE MORAES e, da mesma forma, os integrantes da chapa eleita LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e GERALDO ALCKMIN, o núcleo de militares com formação em forças especiais do Exército, os denominados ‘FE’, realizaram um encontro no dia 12 de novembro de 2022, na residência do general BRAGA NETTO, para apresentar o planejamento das ações clandestinas com o objetivo de dar suporte às medidas necessárias para tentar impedir a posse do governo eleito e restringir o exercício do Poder judiciário. A reunião contou com o tenente-coronel MAURO CESAR CID, o Major RAFAEL DE OLIVEIRA e o Tenente-Coronel FERREIRA LIMA, oportunidade em que o planejamento foi apresentado e aprovado pelo General BRAGA NETTO“
Articulação para o ‘pós-golpe’
Os militares presos projetavam a criação de um “gabinete de crise” após executarem Lula, Alckmin e Moraes. O comando do grupo ficaria a cargo de Walter Braga Netto e do general Heleno.
O plano golpista delineava a atuação de um “gabinete de crise” em múltiplas frentes, incluindo o monitoramento e repressão de opositores por meio de prisões arbitrárias e perseguições políticas, controle da informação com censura à imprensa e disseminação de propaganda pró-golpe, além da busca por apoio internacional.
A principal evidência da existência do gabinete é um documento encontrado na residência do general Heleno, detalhando sua estrutura e objetivos.
Ataques coordenados e disseminação de desinformação
As investigações concluem que Braga Netto orientou e coordenou ataques contra comandantes das Forças Armadas que se opunham ao golpe, incluindo o general Freire Gomes, líder do Exército à época, o tenente-brigadeiro Baptista Júnior, então comandante da Aeronáutica, e o general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, que se tornaria comandante do Exército em 2023.
Ele também incentivou a disseminação de notícias falsas para atingir a reputação desses militares. Braga Netto teria ordenado a seus subordinados que elogiassem Garnier e, ao mesmo tempo, atacassem Freire Gomes e Baptista Júnior por sua recusa em participar do plano golpista.
Em mensagens enviadas ao o capitão reformado Ailton Gonçalves Moraes Barros, Braga Netto diz: “Santa[sic] o pau no Batista Junior (…) traidor da pátria. Dai para frente. Inferniza a vida dele e da família” e “Elogia o Garnier e fode o BJ [Baptista Junior].”
O relatório destaca que Garnier, ao contrário dos homólogos na Aeronáutica e no Exército, demonstrava anuência com o plano golpista. Ele seria, segundo o relatório, o único comandante das Armadas a não se opor à apresentação do decreto que visava a abolição do Estado Democrático de Direito.
Essa tese é corroborada por mensagens trocadas entre investigados e apoiadores do golpe. Diversas mensagens trocadas entre os membros do grupo golpista mencionavam a “coesão” da Marinha, indicando que a força estaria alinhada com o plano de Bolsonaro. Noutro trecho, investigados e apoiadores do golpe, que afirmavam que Garnier era um “PATRIOTA” e que havia tanques prontos para serem utilizados.
Participação em reuniões com o ‘núcleo jurídico’ do golpe
O relatório confirma a participação de Braga Netto em reuniões com o chamado ‘núcleo jurídico’ da organização criminosa, responsável pela elaboração da minuta do decreto para instauração de um estado de exceção.
Os integrantes do núcleo jurídico eram:
- Filipe Martins: ex-assessor especial para assuntos internacionais da Presidência da República no governo Bolsonaro.
- Anderson Torres: ex-ministro da Justiça e Segurança Pública durante o governo Bolsonaro.
- Amauri Feres Saad: advogado, doutor e mestre em Direito pela PUC/SP, apontado como autor da “minuta do golpe”.
- José Eduardo de Oliveira e Silva: padre da Diocese de Osasco, São Paulo.
- Mauro Cid: militar e ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro.
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