Economia

Como é a proposta brasileira de taxação de super-ricos que está em pauta no G20

Projeto que prevê imposto global para combate à desigualdade é uma das principais bandeiras da presidência brasileira no grupo, mas enfrenta resistência do argentino Javier Milei

Como é a proposta brasileira de taxação de super-ricos que está em pauta no G20
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Foto: ERIC LEE / POOL / AFP
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Um imposto global mínimo de 2% sobre a fortuna de bilionários ao redor do mundo poderia gerar uma arrecadação anual de 250 milhões de dólares (cerca de 1,3 trilhão de reais), fortalecendo o combate à desigualdade. Esse é o eixo central da proposta brasileira para a chamada “taxação dos super-ricos”, e que estará em discussão na reunião de cúpula do G20, que teve início nesta segunda-feira 18, no Rio de Janeiro.

A proposta se baseia em um estudo de cinquenta páginas elaborado pelo economista francês Gabriel Zucman, professor da Universidade da Califórnia, em Berkeley, nos Estados Unidos, e diretor da European Tax Observatory.

Zucman esteve em São Paulo no início do ano, a convite do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Na ocasião, deu detalhes sobre a sua proposta e sintetizou aquilo que seus estudos já vinham indicando: que os ‘super-ricos’ do mundo, por hábito, armazenam dólares em paraísos fiscais, fugindo de uma tributação efetiva sobre as suas fortunas.

Segundo a proposta, o imposto seria direcionado a bilionários (em dólares) que não pagam o equivalente a 2% das suas fortunas em impostos sobre a renda. Segundo cálculos do economista e da própria presidência brasileira do G20, esse seleto grupo seria composto por cerca de três mil pessoas no mundo. 

O cálculo é complexo, mas o panorama que a proposta aponta é elementar: as fortunas dos ricos crescem, mas a tributação segue aquém do que deveria ser. Segundo o projeto, a riqueza dos chamados ‘super-ricos’ avança, em média, 7,5% ao ano. Enquanto isso, a tributação equivale, atualmente, a um percentual irrisório de 0,3%.

O próprio presidente Lula (PT) já lançou críticas à concentração de renda global, ao dizer, em julho, que “nunca antes o mundo teve tantos bilionários”. 

“Estamos falando de três mil pessoas que detêm quase 15 trilhões de dólares em patrimônio. […] É mais do que se estima ser necessário para os países em desenvolvimento lidarem com a mudança climática”, afirmou o petista. Naquela ocasião, o governo brasileiro conseguiu obter, entre os ministros das Finanças do G20, uma declaração consensual em que o colegiado reconhecia a necessidade de taxar os ‘super-ricos’.

Haddad, que tem tido voz ativa na defesa da proposta, já sustentou que a medida poderia fazer com que os bilionários deixassem de mandar seus capitais para países com isenção fiscal ou carga tributária menor.

O discurso brasileiro, encampando o projeto, vai no sentido de que os valores arrecadados pela eventual taxação sejam destinados ao combate à fome e à pobreza. Ainda não há detalhes, por exemplo, sobre como os recursos seriam geridos e sobre os mecanismos que seriam utilizados para destiná-lo ao combate à desigualdade. Essas pautas estão na mesa dos líderes mundiais reunidos no Rio.

Resistência

A diplomacia brasileira já considerou uma vitória declaração consensual do último mês de julho, principalmente porque, até antes, o principal foco de resistência vinha dos Estados Unidos. Entre os negociadores, ficou prometido que o tema seria discutido na reunião do G20 no Rio, mas, de lá para cá, um outro bastião de resistência à proposta ganhou força.

O peso com maior força contrária à taxação dos ‘super-ricos’ ainda vem dos EUA, mas, agora, de maneira indireta. Por lá, a vitória de Donald Trump na eleição presidencial mudou a distribuição das peças no tabuleiro do jogo. Trump é abertamente contrário à taxação global, sinalizando, sem filtros, como os EUA devem se portar sobre o tema, a partir de janeiro do ano que vem.

Apesar de não poder estar presente no encontro do G20 – afinal, só assume a presidência daqui a dois meses -, Trump tem um representante indireto da sua contrariedade à proposta: Javier Milei, o histriônico presidente da Argentina.

O país vizinho até participou da declaração consensual do meio ano, mas agora, promete barrar o projeto de taxação. Escancarado admirador de Trump, Milei esteve reunido com o republicano na semana passada, e chegou ao Rio disposto a armar o palco para as suas próprias ideias ‘ultraliberais’ e, no limite, atuar como uma espécie de ‘ponta de lança’ trumpista.

O documento final do G20 deverá citar a proposta, inclusive, mencionando o consenso entre a maioria dos participantes, com exceção da Argentina. O endurecimento do governo Milei se justifica pela ideia de que ele ganhou a força com a volta de Trump ao poder.

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