CartaCapital
Livro/ Sem fé nem medo
Um mergulho na trajetória de Mino Carta e na história do jornalismo


Mino Carta é o protagonista do segundo volume da série Memória do Jornalismo Brasileiro Contemporâneo, que acaba de ser lançado pelo Centro de Memória do IREE. Durante os cinco encontros que resultaram na alentada entrevista de 72 páginas, o jornalista compartilhou ao colega Lira Neto histórias que atravessam nove décadas, da infância na Itália em meio à Segunda Guerra à fundação de grandes revistas como Veja e CartaCapital, da qual é diretor de redação. Entre lembranças de bastidores do ofício e momentos tensos sob a censura, refletiu sobre as transformações do jornalismo nas últimas décadas e fez um retrato crítico da realidade nacional, “eternamente marcada pela lógica da Casa Grande e Senzala”.
Do fortuito início da trajetória profissional, aos 16 anos, motivado pelo desejo de ganhar algum dinheiro para comprar um terno azul-marinho, “o rei dos ternos”, até a criação de CartaCapital, Mino falou dos artifícios e ambiguidades que usava para driblar a censura durante a ditadura, dos entreveros com os antigos patrões das famílias Mesquita e Civita, da amizade com Claudio Abramo e Dom Paulo Evaristo Arns, e do constante assédio de agentes da repressão, que batiam à porta das redações para abduzir críticos do regime militar em suas viaturas C-14. “Fui interrogado duas vezes pelo delegado (Sérgio) Fleury, que me ameaçava: ‘Se eu quiser, fecho sua revista’. Eu dizia: ‘Minha não, dos Civita’”, rememora.
Mino falou ainda sobre sua relação com uma fonte graduada do regime, o general Golbery do Couto e Silva, de quem se tornou próximo. “Ele era contra a censura à imprensa, enfaticamente contra. Sua verdadeira função no governo era conter Geisel, que não desejava o processo de abertura, ao contrário dele.” Outra passagem destacada na entrevista é o envolvimento do jornalista nas Diretas Já, quando ficou responsável por levar Lula ao comício no Anhangabaú, a convite de Ulysses Guimarães.
As transformações trazidas pelo jornalismo digital são analisadas com ferino ceticismo. “A internet, na verdade, matou as melhores ideias e as criações mais brilhantes. Ela limitou o jornalismo de uma maneira francamente daninha. A internet passou a pautar os jornais”, lamenta. “Em lugar de praticar um jornalismo realmente ativo, na busca corajosa pela verdade, a imprensa está sendo engolida e escravizada pelas novas mídias.”
A entrevista está disponível, em formato PDF, no site do Centro de Memória do IREE (https://iree.org.br/cmb/), no qual também é possível acessar o primeiro volume da série, com o jornalista Ricardo Kotscho.
Rogério de Andrade é preso no Rio
O bicheiro Rogério de Andrade, padrinho da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel, foi preso no Rio de Janeiro, na terça-feira 29, a pedido do Ministério Público Estadual. Na denúncia do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado, ele é acusado de encomendar a morte de Fernando Iggnácio, executado a tiros em uma emboscada em 2020. O crime teria relação com uma disputa pelo espólio de Castor de Andrade. Iggnácio, Rogério de Andrade e Paulo de Andrade – genro, sobrinho e filho de Castor, respectivamente – teriam dividido a herança e o controle dos negócios do patriarca em 1997, após a morte do contraventor. Um ano depois, Paulo foi assassinado. Desde então, Iggnácio e Rogério travam uma sangrenta batalha pelo controle de pontos do jogo do bicho, que teria causado mais de 50 mortes, segundo os investigadores.
Lava Jato/ Dirceu livre
O ministro Gilmar Mendes anula as condenações do ex-ministro
De volta ao jogo – Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil
De todas as manipulações da República de Curitiba, os processos contra o ex-ministro José Dirceu atingiram o grau máximo de falsificação. Dirceu experimentou a exceção da exceção ao longo da última década, como se manter suas sentenças ou restringir seu direito à defesa fossem o último fio de esperança das viúvas da Lava Jato. Assim foi até a segunda-feira 28, quando o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, anulou todas as condenações do ex-ministro da lavra do ex-juiz Sergio Moro. Mendes fez questão de lembrar, pois recordar é viver, a “confraria formada” pelo ex-magistrado e a força-tarefa do Ministério Público. Moro e associados, escreveu Mendes na decisão, encaravam “a condenação de Dirceu como objetivo a ser alcançado para alicerçar as denúncias que, em seguida, seriam oferecidas contra Luiz Inácio Lula da Silva”. O juiz curitibano, prosseguiu, almejava “impulsionar movimentos sociais e forças de oposição ao partido político liderado pelo paciente – forças a que ele mesmo, em seguida, viria a aderir, quando aceitou o convite para integrar o governo de Jair Bolsonaro”. Mais: “A extensão, assim, legitima-se como uma medida geral, que aproveita a qualquer outro investigado, mas devido a indicativos de que o juiz e procuradores ajustaram estratégias contra esses réus, tendo a condenação de um deles como alicerce da denúncia oferecida contra outro”. Com a decisão, Dirceu recupera os direitos políticos.
Morales no alvo
A comitiva do ex-presidente Evo Morales, em campanha para recuperar o direito de disputar a eleição na Bolívia, foi atingida por 18 tiros. A emboscada ocorreu durante o deslocamento de Morales de Villa Tunari para Lauca, na região de Cochabamba. O motorista que levava o ex-presidente acabou ferido. O atual mandatário, Luis Arce, ordenou a investigação dos fatos. Antigo pupilo de Morales, Arce, candidato à reeleição, está em guerra “fratricida” com o ex-padrinho pelo controle do MAS, o partido governista.
Publicado na edição n° 1335 de CartaCapital, em 6 de novembro de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’
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