

Opinião
As boas e más notícias que emergem do segundo turno em 2024
O bolsonarismo foi derrotado na maioria das capitais onde encampou candidatos diretamente. Mas, apesar de não estar na cédula, o ex-capitão volta a ter protagonismo na política nacional


A principal boa notícia que emerge das urnas no 2º turno é a derrota do bolsonarismo na maioria das capitais onde encampou candidatos: Curitiba, Belo Horizonte, João Pessoa, Fortaleza, Belém do Pará, Manaus e Goiânia. Isso reflete, para uma boa parte do eleitorado, uma rejeição ao projeto extremista semelhante à que prevaleceu nas eleições presidenciais de 2022, quando Lula venceu Bolsonaro. É provável que a estratégia de frente ampla democrática ressurja em 2026, especialmente com a extrema-direita prometendo força, mesmo sem Bolsonaro nas urnas, que dificilmente reverterá sua inelegibilidade.
No entanto, apesar de não estar na cédula, a principal má notícia é que Bolsonaro volta a ter protagonismo na política nacional. Seu PL saiu das eleições como o partido mais votado do país, e seus candidatos radicais polarizaram boa parte dos confrontos no 2º turno. Além disso, partidos da direita tradicional se aliaram a Bolsonaro em capitais como Porto Alegre e São Paulo. Nesse último caso, fica claro que parte da elite política de direita prefere marchar ao lado da extrema-direita, ignorando o golpismo do 8 de Janeiro, a recusa em aceitar a derrota eleitoral em 2022 e a desastrosa gestão da pandemia.
As tentativas da grande mídia de desvincular Ricardo Nunes (São Paulo) e Sebastião Melo (Porto Alegre) da extrema-direita não se sustentarão diante da composição dos governos: em ambas as cidades, o PL tem planos de avançar sobre secretarias de educação, vistas como estratégicas para promover suas pautas morais e de valores. O avanço da extrema-direita nas prefeituras acende um sinal de alerta para as forças democráticas, que agora precisam focar tanto na eleição presidencial quanto na disputa das 54 vagas do Senado em 2026. Bolsonaro e seu grupo já sinalizaram que a prioridade é conquistar a maioria no Senado para eleger seu presidente, posição-chave para travar o Executivo e dificultar as medidas político-jurídicas que o STF vem impondo ao bolsonarismo.
É fundamental que a estratégia da frente ampla democrática evolua para a construção das chapas de senador, com partidos alinhados em lançar candidaturas e estabelecer alianças formais e informais para impedir que o bolsonarismo conquiste maioria no Senado.
Há também vitórias importantes para a esquerda, além dos resultados da frente ampla. A vitória em Fortaleza se destaca: não só marca o retorno do PT ao comando de uma capital, como sela o fim da carreira política de Ciro Gomes, que teve como último ato apoiar um candidato bolsonarista. Esse triunfo fortalece figuras como Camilo Santana como expoente da esquerda, ao lado de João Campos (eleito no 1º turno em Recife). Outras lideranças surgem com bons desempenhos, como Natália Bonavides e Lúdio Cabral, em Natal e Cuiabá, respectivamente.
Mas é Guilherme Boulos, deputado federal pelo PSOL, quem mais se destaca: novamente no 2º turno em São Paulo, ele conseguiu mais de 2 milhões de votos, enfrentando a máquina pública estadual e municipal e uma estratégia intensa de fake news. O ápice foi a declaração criminosa do governador Tarcísio de Freitas no dia da eleição, sugerindo, sem provas, uma suposta ligação entre Boulos e uma facção criminosa de São Paulo. O ato de Tarcísio reforça sua conexão com o bolsonarismo, apesar de parte da direita ainda apostar nele como um rosto para uma “renovada” direita democrática.
A acusação de Tarcísio, embora tenha afetado a eleição, não ofusca a mobilização cidadã que Boulos imprimiu à disputa em São Paulo, com sua “caravana da virada” e presença forte nas periferias. Esse tipo de mobilização é uma das estratégias que a esquerda tem para superar seus impasses, especialmente em um contexto onde a presença de Lula não é garantida.
O entusiasmo que Boulos despertou em São Paulo evidencia os desafios profundos do campo progressista, ainda carente de uma conexão orgânica com setores como evangélicos e trabalhadores informais, e que continua sem compreender totalmente o papel das redes sociais, não apenas nas campanhas, mas na vida das pessoas. A combinação de mobilização intensa e ação territorial que Boulos representa é um ponto de partida essencial para um novo ciclo político à esquerda.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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