Daniel Camargos

Repórter especial na 'Repórter Brasil', venceu diversos prêmios por reportagens, entre eles o Vladimir Herzog. Dirigiu o documentário 'Relatos de um correspondente da guerra na Amazônia' e participou da Rainforest Investigations Network, do Pulitzer Center.

Daniel Camargos

A eleição de BH já tem um vencedor: Rubens Menin

As doações milionárias do empresário influenciam não só o futuro político da capital mineira, mas também devem moldar leis que favorecem seus negócios

A eleição de BH já tem um vencedor: Rubens Menin
A eleição de BH já tem um vencedor: Rubens Menin
Rubens Menin, Presidente do Conselho da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias. Foto: Gustavo Lima
Apoie Siga-nos no

Dona da construtora MRV, do banco Inter, do Atlético-MG, da CNN Brasil, da rádio Itatiaia e de outros negócios, a família do empresário Rubens Menin fez as apostas certas para a eleição de Belo Horizonte, onde vivem e onde estão a maior parte de suas empresas.

Independentemente de quem vença, a família será bem vista pelo próximo prefeito da capital mineira, pois doou dinheiro para as duas candidaturas que chegaram ao segundo turno.

O patriarca, Rubens Menin, doou 500 mil reais para a campanha do candidato à reeleição Fuad Noman (PSD), que vai disputar contra o deputado estadual Bruno Engler (PL). A filha de Menin, Maria Fernanda, e o sobrinho Eduardo Fischer, ambos executivos das empresas da família, doaram parte de suas fortunas para Engler. A filha doou 40 mil reais e o sobrinho 290 mil reais para o candidato da extrema-direita bolsonarista.

As doações do clã Menin são generosas. Somando as quantias doadas pelo patriarca, a filha, o filho e dois sobrinhos, o volume chega a 8,6 milhões de reais considerando as últimas cinco campanhas eleitorais, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Além do meio milhão doado para a candidatura de Fuad Noman, Rubens Menin doou 200 mil reais para a vereadora Fernanda Altoé (Novo), que foi reeleita, sendo a quarta mais votada para a Câmara Municipal da capital mineira. O dinheiro de Menin representa mais da metade do arrecadado pela candidata.

Uma matéria no site da Itatiaia – maior rádio de Minas Gerais e comprada por Menin em maio de 2021 – exalta um projeto de lei apresentado por Altoé e aprovado pelo plenário da Câmara Municipal no final de setembro. A proposta limita os valores das contrapartidas exigidas para as empresas de construção em novos empreendimentos em Belo Horizonte.

Ou seja, o poder público terá menos margem para exigir adequações no trânsito ou plantio de árvores, por exemplo, após a realização de obras privadas que impactam a mobilidade da cidade.

Esse projeto surgiu após uma intensa disputa entre o ex-prefeito Alexandre Kalil (Republicanos) e o empresário Rubens Menin, que construiu a Arena MRV. O estádio é usado pelo Atlético, clube de futebol que Menin e o filho Rafael detêm 67,8% das ações da Sociedade Anônima de Futebol (SAF).

Menin já verbalizou algumas vezes o descontentamento com as contrapartidas exigidas pela prefeitura de Belo Horizonte, quando era comandada por Kalil. “A maioria das cidades no mundo ajudam as arenas e aqui em Belo Horizonte nós fomos o contrário disso, nós fomos prejudicados, a contrapartida deu prejuízo de 250 milhões de reais, foi muito ruim para nós”, disse o empresário, que já esteve na lista de bilionários da Forbes.

Com mais da metade da campanha financiada por Menin, a vereadora reeleita Fernanda Altoé disse à Rádio Itatiaia que: “Sem dúvidas que, se essa lei já estivesse em vigor na época da construção da Arena MRV e de vários outros empreendimentos de Belo Horizonte, alguns absurdos para a construção da Arena MRV não teriam acontecido”.

Para a lei entrar em vigor, precisa ser sancionada pelo atual prefeito, Fuad Noman, que não custa lembrar recebeu 500 mil reais de doação de Rubens Menin.

Em 2016, quando Kalil foi candidato a prefeito pela primeira vez, Menin doou 200 mil reais para ele. A relação, contudo, azedou nos últimos anos. Primeiro, romperam dentro do Atlético, clube que Kalil presidiu e dominava politicamente.

A briga no futebol se estendeu para a política, colocando os dois em lados opostos nas últimas disputas. Menin apoiou a reeleição do governador Romeu Zema (Novo) contra Kalil na última disputa para o governo mineiro. Zema até pegou carona no jatinho do empresário para ir a Brasília selar o apoio a Bolsonaro no segundo turno.

Ao tentar ser governador, Kalil deixou a prefeitura para seu vice, Fuad Noman. Contudo, abandonou Fuad e decidiu apoiar o apresentador do policialesco da Record em Minas Gerais, o deputado estadual Mauro Tramonte (Republicanos). Entrou numa campanha que estava à frente nas pesquisas e terminou com uma derrota acachapante, ficando fora do segundo turno.

Kalil integrou a mesma coligação de Zema, seu rival, que indicou a vice de Tramonte. Ambos saíram como os maiores derrotados das eleições em Minas Gerais. Zema, que, por sua vez, não engajou na campanha de Tramonte, deve colocar o pé na canoa da extrema-direita bolsonarista de Engler, sem nenhum constrangimento e livre da cara emburrada de Kalil.

Já Kalil, se quiser apoiar alguém, vai ter que abraçar um candidato financiado por Menin.

Menin, além de empresário, é um hábil articulador político. Foi ele que comandou o lobby para barrar a publicação da “lista suja” do trabalho escravo, principalmente após a inclusão da MRV no cadastro em 2012.

A “lista suja”, criada em 2003, é um instrumento de transparência pública que expõe empresas flagradas utilizando trabalho escravo, resultando em restrições de crédito e prejuízo à reputação das empresas listadas.

Menin utilizou a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), que ajudou a criar, para pressionar o governo e o judiciário contra a lista. Sob sua liderança, a Abrainc entrou com duas ações no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a constitucionalidade da lista, alegando que ela violava o devido processo legal e feria a presunção de inocência das empresas.

A primeira ação, em 2014, resultou na suspensão da publicação da lista por quase dois anos. A segunda ação, em 2018, também visava derrubar a lista, mas o STF, em 2020, confirmou a constitucionalidade da “lista suja”.

Ao todo, a MRV foi autuada sete vezes por trabalho escravo, com a última autuação ocorrendo em 2022. Apesar das acusações, a construtora conseguiu firmar um acordo com o governo Bolsonaro que a mantém fora da “lista suja”.

Em um dos resgates, em uma obra em Macaé (RJ), a auditora-fiscal do Trabalho que comandou a fiscalização descreveu assim a condição dos trabalhadores: “A moradia era ruim. Os sanitários, péssimos, com fezes escorrendo. Os trabalhadores tinham de tomar banho usando botas. O refeitório ficava em cima dos sanitários. O cheiro era insuportável. Ninguém consegue fazer sua refeição em um local cheirando a urina”.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Muita gente esqueceu o que escreveu, disse ou defendeu. Nós não. O compromisso de CartaCapital com os princípios do bom jornalismo permanece o mesmo.

O combate à desigualdade nos importa. A denúncia das injustiças importa. Importa uma democracia digna do nome. Importa o apego à verdade factual e a honestidade.

Estamos aqui, há 30 anos, porque nos importamos. Como nossos fiéis leitores, CartaCapital segue atenta.

Se o bom jornalismo também importa para você, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal de CartaCapital ou contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo