Josué Medeiros

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Cientista político e professor da UFRJ e do PPGCS da UFRRJ. Coordena o Observatório Político e Eleitoral (OPEL) e o Núcleo de Estudos sobre a Democracia Brasileira (NUDEB)

Opinião

Preocupação da esquerda com Marçal não deve se transformar em paralisia

Nos próximos 10 dias, a disputa entre Nunes e Marçal na direita promete ser intensa. Enquanto isso, Boulos deve continuar buscando os votos que foram de Lula e Haddad em 2022

Preocupação da esquerda com Marçal não deve se transformar em paralisia
Preocupação da esquerda com Marçal não deve se transformar em paralisia
Foto: Reprodução/Redes Sociais
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O rápido crescimento do candidato a prefeito de São Paulo, o coach bolsonarista Pablo Marçal (PRTB), nas pesquisas de intenção de voto nas duas primeiras semanas de campanha provocou alarme e até pânico. A possibilidade de Marçal chegar ao segundo turno remete ao pleito de 2018, quando Bolsonaro venceu as eleições presidenciais, com todos os traumas políticos e sociais decorrentes desse resultado.

A frente democrática, preocupada com o avanço da força bolsonarista na principal cidade do país, vê a necessidade de combater a normalização de figuras da extrema-direita, como Marçal, e os métodos criminosos que utilizam para ganhar votos. Contudo, é importante dosar esse alerta para evitar que a preocupação se transforme em paralisia. Segundo as pesquisas da Quaest e da FESPSP divulgadas nesta semana, o cenário ainda é favorável a uma possível vitória da esquerda, com Guilherme Boulos (PSOL).

Análise das pesquisas

Na pesquisa FESPSP, divulgada em 26 de agosto, Boulos lidera com 23,1%, seguido por Ricardo Nunes (MDB) com 21,6%, Pablo Marçal com 16,8%, José Luiz Datena (PSDB) com 10,7% e Tabata Amaral com 8,6%. Comparado a julho, Boulos perdeu 2,7%, Nunes caiu 0,6% e Datena, 1,2%, todos dentro da margem de erro. Marçal, por outro lado, subiu 5,4% e Tabata, 3,9%, ambos acima da margem de erro.

Na pesquisa Quaest, divulgada em 28 de agosto, Boulos cresceu de 19% para 22%, um avanço dentro da margem de erro. Nunes caiu de 20% para 19%, passando de primeiro para terceiro lugar. Marçal subiu de 13% para 19%, e Datena caiu de 19% para 12%, ambos fora da margem de erro. Tabata subiu de 6% para 8%, dentro da margem de erro.

Essas pesquisas confirmam a tendência observada nos levantamentos da Atlas e Datafolha na semana passada. O voto em Boulos é consolidado, com 58% dos eleitores afirmando que não mudariam de escolha na Quaest, contra 48% de Marçal e 44% de Nunes. A consolidação de Boulos também é evidente no crescimento de sua intenção de voto espontânea: de 18,5% em julho para 21% em agosto na FESPSP, e de 9% para 12% na Quaest.

Tendências e desafios

O crescimento de Boulos, embora dentro da margem de erro, ocorreu entre os eleitores mais pobres, que são a base do lulismo. Essa tendência provavelmente se consolidará com o início da propaganda gratuita na TV e rádio, e com a intensificação da campanha de rua.

Marçal, por sua vez, consolida seu avanço sobre o voto da direita radical. Ele herdou os votos de Kim Kataguiri, que pontuava 3% na Quaest de julho e 2,8% na FESPSP, além de captar votos bolsonaristas que estavam com Nunes. As menções a Marçal na intenção de voto espontânea cresceram expressivamente, passando de 4% para 10% na Quaest, e de 6,4% para 13% na FESPSP.

O desafio de Marçal será manter essa tendência de crescimento, especialmente sem exposição na rádio e TV, e com suas redes sociais bloqueadas por indícios de abuso econômico. Sua estratégia de fake news, além de gerar punições na justiça, pode aumentar sua rejeição entre eleitores fora da base bolsonarista. Além disso, sua vida e negócios serão cada vez mais investigados pela imprensa e adversários, o que pode revelar aspectos prejudiciais.

Para Nunes, o cenário é alarmante. Se a eleição fosse hoje, ele estaria fora do segundo turno. Sua aposta na força da coligação de 12 partidos, maior tempo de TV e rádio, e na maior chapa de vereadores enfrenta problemas com o crescimento de Marçal. Muitos candidatos a vereador estão escondendo ou apoiando abertamente o coach bolsonarista, enquanto a aprovação da gestão de Nunes é restrita a 1/3 do eleitorado. Na pesquisa FESPSP, 52% dos entrevistados concordam que é necessário mudar os rumos da cidade.

Nos próximos 10 dias, a disputa entre Nunes e Marçal na direita promete ser intensa, culminando na manifestação bolsonarista de 7 de setembro, onde Marçal deverá se destacar com o apoio de Bolsonaro, enquanto Nunes pode enfrentar uma desmoralização.

Enquanto isso, Boulos deve continuar buscando os votos que foram de Lula e Haddad em 2022, com propostas que dialoguem com a vida dessas pessoas e com os resultados do governo Lula. Isso consolidará sua liderança no primeiro turno e pavimentará um caminho de vitória no segundo turno.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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