Cultura
Morte de Silvio Santos é também o fim de uma era na TV brasileira
Carismático, polêmico e visionário, o apresentador tentou criar sucessores, como Gugu, mas não conseguiu forjar uma verdadeira continuidade
Senor Abravanel, o Silvio Santos, faleceu aos 93 anos, encerrando uma era que ele próprio criou e dominou por décadas na televisão brasileira. Nascido em 12 de dezembro de 1930, no bairro da Lapa, Rio de Janeiro, o jovem camelô se converteu no maior comunicador de massas brasileiro.
Apesar de suas falhas e declarações e escolhas questionáveis, Silvio Santos transcendeu o homem Senor Abravanel. Se tornou um símbolo de uma era, de uma televisão construída em torno de seu carisma inigualável. Sua morte deixa um vazio difícil de ser preenchido.
Direto, espontâneo e carismático, Silvio Santos redefiniu o conceito de programas de auditório e a relação entre apresentador e público. Em 1963, estreou o “Programa Silvio Santos”, já com o icônico microfone sobre o peito. Duas décadas depois, em 1981, fundou o SBT, consolidando-se como um dos mais longevos e pioneiros comunicadores do país.
Silvio era, ele próprio, a atração principal. Suas piadas e bordões, os aviõezinhos de dinheiro e seu carisma mantiveram o público cativo por gerações. Ele tentou, ao longo dos anos, criar sucessores, como Gugu Liberato e Celso Portiolli, mas não conseguiu forjar uma verdadeira continuidade.
Silvio fez do SBT um reflexo do país: uma mistura de caos e alegria que, apesar das crises de audiência, manteve-se querida e popular. A emissora ficou conhecida por sua programação eclética, misturando desde Chaves e novelas mexicanas até reality shows como Casa dos Artistas. Silvio não hesitava em mudar regras ou reprisar sucessos para manter a audiência, sempre com uma honestidade desarmante com o público. As famosas “grades voadoras”, onde programas mudavam de horário sem aviso prévio, eram um exemplo de seu estilo de gestão imprevisível.
Para além da TV, Silvio construiu um império comercial que incluía o Baú da Felicidade e os cosméticos Jequiti. Seu tino para os negócios o ajudou a superar crises significativas, como o escândalo do banco PanAmericano.
Sua relação com o poder, por outro lado, foi sempre estratégica e ambígua. Silvio Santos recebeu todos os presidentes desde a redemocratização em seu programa, independentemente de ideologias. Apoiou Lula e Dilma, abraçou Michel Temer e, mais recentemente, demonstrou entusiasmo por Bolsonaro. A habilidade remonta à época da ditadura militar, período em que seu SBT floresceu.
Em matéria de política, Silvio repetia que sua intuição era correta em cerca de 95% das vezes. Uma das exceções mais notáveis veio no palco do Programa Silvio Santos após as eleições de 2018, quando previu que Bolsonaro governaria por dois mandatos consecutivos, sendo sucedido por Sérgio Moro. Ledo engano.
Silvio Santos não apenas se destacou na TV, mas a redefiniu. Sua trajetória, cheia de altos e baixos, é digna dos melhores roteiros. Por décadas, ele foi mais que um apresentador – era um membro querido da família brasileira, trazendo alegria e leveza para milhões de lares.
Seu falecimento marca o fim de uma era dourada que ele dominou sozinho, deixando um legado indelével na cultura e na mídia brasileira. Silvio Santos não será apenas lembrado, mas celebrado como o homem que personificou e transformou a televisão no Brasil.
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