Economia

Descontextualização de trecho da entrevista de Lula à ‘Record’ irrita Haddad

Declarações foram antecipadas ao mercado por uma consultoria que tem como sócia a repórter responsável pela entrevista

Descontextualização de trecho da entrevista de Lula à ‘Record’ irrita Haddad
Descontextualização de trecho da entrevista de Lula à ‘Record’ irrita Haddad
Brasília - 28/06/2023 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante anuúncio do Plano Safra da Agricultura Familiar 2023/2024 Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reclamou nesta terça-feira 16 da descontextualização de declarações do presidente Lula (PT) à Record TV.

A emissora optou por antecipar no início da tarde trechos específicos da entrevista, cuja íntegra foi ao ar nesta noite, mas rumores sobre o teor das respostas já circulavam no mercado desde o fim da manhã.

A agência Bloomberg revelou, em sua edição em inglês, que as afirmações de Lula já constavam de um documento da Capital Advice mais de uma hora antes de a Record divulgá-las. A empresa diz trabalhar com “informação e análise política para investidores”.

O veículo também noticiou que a repórter Renata Varandas, responsável por conduzir a entrevista, tem ligação direta com a empresa. No LinkedIn, ela se apresenta como “repórter política do Jornal da Record e sócia da Capital Advice Análise Política”.

Em nota a CartaCapital, a Record afirmou ter tomado conhecimento do vínculo da repórter com a Capital Advice somente após a divulgação da notícia.

“A emissora deixa claro que condena qualquer vazamento de informações, principalmente com recorte parcial do que é apurado em entrevistas feitas por nossas equipes”, acrescenta a emissora. “Medidas cabíveis serão tomadas com a apuração dos fatos.”

CartaCapital também entrou em contato com a Capital Advice e atualizará este texto se obtiver uma resposta.

Os vazamentos, segundo Fernando Haddad, geraram uma especulação desnecessária sobre a política fiscal do governo.

Nas últimas semanas, setores do mercado criticaram Lula pela ofensiva sobre o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e por uma suposta falta de sinalização quanto à disposição de cortar gastos. A área econômica tenta a todo custo evitar uma nova escalada do dólar, como a que ocorreu entre o fim de junho e o começo de julho.

Em um dos recortes que geraram repercussão, Lula diz: “É apenas uma questão de visão. Você não é obrigado a estabelecer uma meta e cumpri-la se você tiver coisas mais importantes para fazer. Este País é muito grande, este País é muito poderoso. O que é pequeno é a cabeça dos dirigentes deste País e a cabeça de alguns especuladores”.

Haddad afirmou, porém, que Lula reforçou seu compromisso com o arcabouço fiscal, desenhado pelo atual governo como substituto do teto de gastos de Michel Temer (MDB). Ato contínuo, o Ministério da Fazenda divulgou outro trecho da entrevista, em que Lula declara:

“Vamos fazer o que for necessário para cumprir o arcabouço fiscal. Eu dizia na campanha que íamos criar um país com estabilidade política, jurídica, fiscal, econômica e social. Essa responsabilidade, esse compromisso — posso dizer para você como se tivesse dizendo para um filho meu, para a minha mulher —, responsabilidade fiscal eu não aprendi na faculdade, eu trago do berço.”

No início de julho, Haddad anunciou um corte de 25,9 bilhões de reais em despesas obrigatórias no Orçamento de 2025, a fim de cumprir o arcabouço. Nesta terça, o ministro afirmou que o Planejamento, pasta comandada por Simone Tebet (MDB), divulgará nos próximos dias os detalhes sobre essa redução.

O ministro da Fazenda também declarou que se reunirá com Lula nos próximos dias para tratar do Orçamento deste ano e indicou a possibilidade de anunciar bloqueios e contingenciamentos para respeitar a regra fiscal.

O arcabouço prevê déficit zero em 2024 e em 2025. Na prática, significaria um resultado neutro nas contas do governo, sem considerar os juros da dívida pública. A regra oferece, no entanto, uma tolerância de 0,25% do PIB para mais ou para menos, margem citada por Lula na entrevista à Record.

“Este País não tem nenhum problema se é déficit zero, se é déficit 0,1%, se é déficit 0,2%. Não tem nenhum problema para o País. O que é importante é que este País esteja crescendo, que a economia esteja crescendo, que o emprego esteja crescendo, que o salário esteja crescendo”, disse o presidente.

Esse trecho reforçou a estratégia de “panos quentes” de Haddad:  “Ele falou que pode ser zero, 0,1. Isso está, inclusive, dentro da banda”.

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