Afonsinho

Médico e ex-jogador de futebol brasileiro

Opinião

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Sem respiro

As manifestações de Tite contra a CBF apontam para um problema grave do futebol atual: o calendário que não permite o descanso adequado

Sem respiro
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Climão. O técnico do Flamengo questionou Julio Avellar – Imagem: Lucas Figueiredo/CBF Oficial
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Terminada a temporada europeia, o massacrado calendário do futebol apresenta a Eurocopa e, por adaptação, a Copa América.

Ambos os torneios seguirão pelo mês de julho, que tem, como grande acontecimento esportivo do globo, os Jogos Olímpicos de Paris.

Vimos, inclusive, na última semana, as disputas pelas últimas vagas das ­Olimpíadas.

A Eurocopa, atração mais empolgante deste período para os apaixonados pelo futebol, entra nas oitavas de final com jogos em “mata-mata”. Perdeu, dançou.

Por conta do famigerado calendário, houve um bate-boca entre o Tite e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Recentemente questionado sobre as expectativas para o clássico contra o Fluminense, pela 11ª rodada do Brasileirão, o treinador do Flamengo reclamou do tempo de descanso diferente para cada clube e citou nominalmente o diretor de competições da CBF, ­Julio Avellar.

No caso, o Fluminense terá um dia a mais de preparação antes do clássico.

Na sequência, a CBF, em nota, definiu a fala de Tite como “despropositada, agressiva e ofensiva”.

Em resumo: o técnico expõe as suas dificuldades e a entidade máxima do nosso futebol alega que a programação segue normalmente e que tudo está sob controle.

A realidade é que no mundo inteiro existem queixas em relação ao ritmo ­veloz que anda sendo imposto às mais diferentes atividades.

As comissões técnicas vivem no fio da navalha, com jogadores no limiar de suas condições físicas e se vendo obrigadas a poupar atletas.

Isso prejudica a estabilidade do conjunto das equipes em disputas acirradas, tanto para os que almejam ganhar o título quanto para os que se veem ameaçados por possíveis rebaixamentos.

Já sabemos, há tempos, que o acúmulo de jogos não permite uma recuperação razoável dos atletas. Não à toa, há clubes defendendo a formação de times com 33 jogadores.

Vem-me à lembrança o tempo em que um técnico, ao assumir um determinado time, exigia um máximo de 18 jogadores.

Sempre fiquei intrigado com esse ­número. Por que 18 e não 20, por exemplo?

O que não se vê são representações coletivas dos jogadores defendendo suas necessidades e mesmo seus interesses.

Uma dificuldade que se apresenta diz respeito à formação dos selecionados nacionais, que não deixa tempo para a preparação de modo a que se aprofunde o entrosamento necessário mesmo entre craques destacados.

Desta vez, o selecionado brasileiro teve um tempo melhor de recuperação e treinos para a Copa América.

Paradoxalmente, no entanto, esse mesmo calendário alucinado faz com que os jogadores não estejam acostumados a períodos longos de concentrações entediantes em locais completamente distintos daqueles comuns à sua rotina de jogos e viagens nos grandes centros em que atuam.

De todo modo, o trabalho da comissão encabeçada pelo ­Dorival Júnior é sério e, a despeito de todas essas dificuldades, torcemos pelo seu sucesso.

No Brasileirão, a saída do ­Fernando Diniz do Fluminense abre espaço para uma discussão sobre os rumos do nosso futebol, já que os métodos adotados pelo técnico presumem a retomada do que se considera nosso modo ­característico de jogar.

Mas Diniz já provou ser técnico de grandes qualidades e vai ter oportunidade de fazer outros bons trabalhos em grandes clubes. •

Publicado na edição n° 1317 de CartaCapital, em 03 de julho de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Sem respiro’

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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