Do Micro Ao Macro

A Neurociência por trás dos ambientes de trabalho disfuncionais

As pesquisas não deixam dúvidas a respeito de como os ambientes de trabalho estão disfuncionais

A Neurociência por trás dos ambientes de trabalho disfuncionais
A Neurociência por trás dos ambientes de trabalho disfuncionais
A Neurociência por trás dos ambientes de trabalho disfuncionais
Apoie Siga-nos no

Em um cenário de rotina corporativa, imagine que todos os dias você começa a trabalhar às 9h da manhã, sem saber exatamente quando seu expediente vai terminar. Mesmo planejando suas atividades, tudo pode mudar ao iniciar o trabalho, pois seu gestor traz uma série de demandas urgentes que precisam ser atendidas imediatamente. Reuniões intermináveis e improdutivas impedem você de cumprir suas prioridades, que acabam sendo empurradas para o final do dia. Embora precise encerrar o trabalho às 18h para cuidar de assuntos pessoais, você não se sente à vontade para discutir isso com sua liderança ou colegas, temendo que julguem sua capacidade de priorizar o trabalho. O dia termina por volta das 20h, deixando você exausto, pouco produtivo e irritado com a comunicação falha entre equipes, que gera retrabalho. Frequentemente, você se pergunta se poderia encontrar um lugar melhor para trabalhar, se seu salário compensa e se sua vida poderia ser mais equilibrada.

De acordo com a neurocientista Thaís Gameiro, esse cenário ilustra o que ela chama de “ambientes de trabalho disfuncionais”. “Pouca autonomia, baixa previsibilidade, estresse, conflitos, baixa confiança, pouca segurança psicológica, perda de performance, frustração, desengajamento, ausência de bem-estar e equilíbrio de vida são ingredientes tóxicos que contribuem para essa disfunção”, destaca Thaís.

Pesquisas corroboram a percepção de ambientes de trabalho disfuncionais. Segundo dados da Gallup, estamos enfrentando uma crise de confiança nas lideranças. Em uma pesquisa de 2023, apenas 21% dos entrevistados disseram confiar em suas lideranças, um índice menor do que o observado durante os períodos críticos da pandemia de covid-19.

“A confiança e a segurança psicológica são elementos essenciais para um ambiente de trabalho saudável e produtivo”, explica Thaís. Uma pesquisa da Universidade da Carolina do Norte revelou que a rotina de trabalho da maioria dos profissionais é ineficiente, com 71% dos entrevistados considerando suas reuniões improdutivas e 65% afirmando que o tempo perdido em reuniões impede a conclusão de suas tarefas. Essa ineficiência gera frustração, sobrecarga e desequilíbrio na vida pessoal.

A neurocientista ainda destaca o impacto desses ambientes na saúde mental dos trabalhadores. Dados recentes da Deloitte mostram que 62% dos líderes no Brasil, em cargos de C-level, relataram ter sofrido burnout.

Além do impacto direto no ambiente corporativo, esses ambientes disfuncionais afetam a vida pessoal dos profissionais. Um estudo citado no livro “Work Matters: How Parents’ Jobs Shape a Child’s Wellbeing” encontrou uma relação entre as experiências profissionais dos pais e o bem-estar de seus filhos. Autonomia, flexibilidade e liderança empática influenciam positivamente as interações entre pais e filhos, sugerindo que ambientes de trabalho saudáveis contribuem para um desenvolvimento infantil saudável.

“Ambientes de trabalho saudáveis não só beneficiam o desempenho empresarial, mas também impactam a vida pessoal dos profissionais e suas famílias, influenciando gerações futuras”, ressalta Thaís.

A Neurociência Organizacional, segundo Thaís, oferece uma perspectiva única para resolver problemas de gestão. “Nosso comportamento e tomada de decisão são governados pelo cérebro, através da ativação de sistemas neurais conhecidos como Sistemas Motivacionais”, explica. O sistema apetitivo é ativado em contextos positivos, enquanto o sistema defensivo é acionado em situações negativas, gerando comportamentos de afastamento e fuga.

“A falta de autonomia, a sensação de insegurança e desconfiança, julgamentos, conflitos e sobrecarga de trabalho são percebidos pelo cérebro como ameaças, elevando os níveis de estresse. Quando esses elementos estão presentes na rotina, o estresse se torna crônico, causando desgaste e esgotamento”, detalha a neurocientista.

Thaís Gameiro sugere que um ambiente de trabalho equilibrado é possível, utilizando o conceito de Homeostase Organizacional (HO). “Empresas que mantêm parâmetros básicos ajustados podem se autorregular, neutralizando gradativamente os eventos estressores”, afirma.

“Equipes com alta confiança, boa comunicação, engajadas e mentalmente saudáveis têm mais sucesso na resolução de problemas que demandam criatividade, agilidade e adaptabilidade, em comparação com equipes estressadas e conflituosas”, explica Thaís.

Em um mundo que demanda resiliência e agilidade, a gestão deve considerar as dinâmicas fisiológicas e psicológicas dos seres humanos. “Empresas são organismos vivos, movidos por pessoas. Um modelo de gestão otimizado precisa ser biodirecionado, levando em conta as dinâmicas humanas para processos funcionais, flexíveis e sustentáveis”, conclui a neurocientista.

ENTENDA MAIS SOBRE: ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.

CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.

Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal da revista ou contribua com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo