CartaCapital
São Paulo/ Botão “liga e desliga”
Novas câmeras vão permitir que o policial escolha quando iniciar gravação


Concebidas para coletar provas contra suspeitos, mas também para fiscalizar a atividade policial, as câmeras corporais da PM de São Paulo passarão a ter um botão de “liga e desliga”, que permitirá ao policial decidir quando iniciar a gravação. Ao anunciar a aquisição de 12 mil novos equipamentos com essa funcionalidade, o governo paulista justificou que o registro ininterrupto de imagens traz elevados custos de armazenamento, além de “comprometer severamente a privacidade” dos agentes em serviço.
Na segunda-feira 27, a Defensoria Pública de São Paulo encaminhou uma petição ao Supremo Tribunal Federal, solicitando mudanças no edital da Secretaria de Segurança Pública. Na peça, a defensora Fernanda Balera, coordenadora do núcleo de Direitos Humanos do órgão, observa que as mortes em intervenções policiais despencaram após a instalação das câmeras que não poderiam ser desligadas em momento algum. “É justamente a partir dessa mudança que se começa a observar a queda nos índices de letalidade.”
Na campanha eleitoral, Tarcísio de Freitas prometeu retirar as câmeras das fardas da PM paulista. Com a repercussão negativa da proposta, decidiu manter o programa, mas cortou os investimentos para sua expansão. Agora, finalmente, anuncia a compra de novos equipamentos, mas com o dispositivo que permite ao policial desligar o aparelho, embora ele seja formalmente obrigado a gravar todas as ocorrências. “É uma farsa”, reagiu o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida. “Essa medida privilegia os maus policiais, aqueles que não respeitam a lei e fazem uso excessivo da força.”
Cores da violência
Em dez anos, disparos de armas de fogo em vias públicas mataram quatro vezes mais negros que brancos no Brasil. De 2012 a 2022, ao menos 149,7 mil homens pretos e pardos foram assassinados nesse contexto. Nesse mesmo período, os óbitos de homens brancos somaram 38,2 mil. Os dados constam no Boletim Saúde da População Negra, divulgado na segunda-feira 27 pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) e pelo Instituto Çarê. Entre as mulheres, também se constatou maior vitimização da população negra, mais que o dobro da verificada entre as brasileiras brancas.
Rio de Janeiro/ “Era uma sociedade”
Ronnie Lessa matou Marielle por promessa de chefiar nova milícia
O sicário animou-se com a oferta de um loteamento clandestino – Imagem: Redes sociais
Em sua delação, Ronnie Lessa revelou a tentadora proposta que recebeu para matar a vereadora Marielle Franco em 2018. Segundo o sicário, Domingos Brazão, ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, e seu irmão, o deputado federal Chiquinho Brazão, ofereceram a ele e a um de seus comparsas, o ex-policial militar Edimilson de Oliveira, conhecido como Macalé, um loteamento clandestino na Zona Oeste do Rio.
“Era muito dinheiro envolvido. Na época, daria mais de 20 milhões de dólares”, disse à Polícia Federal. “Eu não fui contratado para matar Marielle como um assassino de aluguel. Fui chamado para uma sociedade.” Registrado em vídeo, esse trecho do depoimento foi exibido pelo programa Fantástico, da Rede Globo, no domingo 26. Para Lessa, a proposta representava a oportunidade de liderar uma nova milícia, que teria como base territorial o loteamento clandestino prometido pelos irmãos Brazão.
Rio de Janeiro/ Jogo viciado
Delator aponta Romário e Marcos Braz em esquema de corrupção
A dupla é acusada de desviar recursos públicos de projetos de esporte – Imagem: Alexandre Vidal/Flamengo e Pedro França/Ag. Senado
O Ministério Público Federal e a Polícia Federal investigam o senador Romário e o vereador Marcos Braz, também vice-presidente do Flamengo, por envolvimento em suposto esquema de desvio de recursos de projetos de esportes da Prefeitura do Rio de Janeiro. Iniciada com base na delação do empresário Marcus Vinícius Azevedo da Silva, a investigação apura indícios de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Sob sigilo, o inquérito está sob a relatoria do ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal.
Preso em 2019 pela Operação Catarata, Silva assinou um acordo de colaboração com a Procuradoria-Geral da República no ano seguinte. Segundo o delator, houve desvios em contratos da prefeitura com o Centro Brasileiro de Ações Sociais para Cidadania (Cebrac), celebrados por Braz quando ele esteve à frente da Secretaria Municipal de Esportes. A ONG teria recebido ao menos 13 milhões de reais para a gestão de vilas olímpicas.
Apontado como responsável pela nomeação de Braz na administração municipal e como possível beneficiário do esquema, Romário afirmou ao portal UOL, o primeiro a noticiar o caso, que “não responde pelas ações do secretário no exercício de suas funções”, além de negar qualquer enriquecimento ilícito. Já Braz preferiu não se manifestar. Ambos são filiados ao PL do Rio.
Apelação negada
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, rejeitou um recurso extraordinário apresentado pela defesa de Jair Bolsonaro e de Walter Braga Netto contra decisão da Corte que os declarou inelegíveis por abuso de poder político e econômico. A apelação está relacionada ao processo em que foram acusados de usar as celebrações do 7 de Setembro como palanque eleitoral. Antes disso, o ex-presidente já havia sido condenado à inelegibilidade por reunir embaixadores no Palácio da Alvorada para atacar o processo eleitoral e espalhar fake news sobre as urnas eletrônicas. Neste caso, contudo, Braga Netto foi absolvido. Moraes deixará o comando TSE em 3 de junho, quando será substituído por Cármen Lúcia.
Ensino superior/ “Respirando por aparelhos”
Conselho Universitário da UFRJ pede socorro ao governo Lula
A universidade deve encerrar 2024 com déficit de 380 milhões de reais – Imagem: SintUFRJ
Em carta aberta, o Conselho Universitário da UFRJ pediu socorro ao governo federal para se recuperar de uma prolongada crise financeira, agravada pelos numerosos cortes orçamentários que sofre desde 2013. “Sucessivas reitorias têm feito o esforço monumental de manter a universidade aberta no contexto de um processo inexorável de degradação de sua infraestrutura, mas estamos respirando por aparelhos.”
Centenária, a UFRJ é a maior universidade federal do Brasil, com cerca de 65 mil estudantes e mais de 4 mil professores. A instituição deve encerrar 2024 com um déficit de 380 milhões de reais, estima a Pró-reitoria de Finanças. O valor supera em 97 milhões o orçamento de custeio para este ano, de 283 milhões. O Conselho reconhece que o governo Lula iniciou um processo de recomposição orçamentária da rede federal de ensino, mas enfatizou que, no caso da UFRJ, ele “está muito aquém das necessidades e nem de longe cobre o passivo dos últimos anos”.
Após a publicação da carta, os alunos da UFRJ aprovaram uma greve prevista para começar em 11 de junho. Eles reivindicam a recomposição do orçamento da universidade, reajuste salarial para os seus trabalhadores e um plano nacional de assistência estudantil.
Desastre geológico
Uma avalanche deixou ao menos 2 mil soterrados em Papua-Nova Guiné, informou o Centro Nacional de Desastres no país. O gigantesco deslizamento de terra pegou moradores da província de Enga, a 600 quilômetros da capital Port Moresby, desprevenidos na madrugada da sexta-feira 24. Vilarejos inteiros foram varridos do mapa, ao menos 150 casas foram sepultadas. Na terça-feira 28, a ONU informou serem remotas as chances de encontrar sobreviventes. “Não é uma missão de resgate, é uma missão recuperação”, lamentou Niels Kraaier, representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) para o país da Oceania, localizado ao norte da Austrália.
Gaza/ “Trágico acidente”
O mundo assiste inerte a mais um massacre promovido por Netanyahu
Um bombardeio israelense matou ao menos 45 civis em acampamento de refugiados – Imagem: Eyad Baba/AFP
Em evidente afronta à decisão da Corte Internacional de Justiça que ordenou a suspensão da ofensiva militar em Rafah dias antes, Israel bombardeou a cidade palestina no domingo 26, provocando a morte de ao menos 45 pessoas em um acampamento de refugiados. Os alvos, segundo o governo israelense, eram dois líderes do Hamas, mas um “acidente trágico”, nas palavras do premier Benjamin Netanyahu, provocou um incêndio de grandes proporções nas tendas que abrigavam civis no bairro de Tel Al-Sultan. Ao menos metade das vítimas eram crianças, mulheres e idosos.
As cenas do acampamento consumido pelas chamas e do desesperado socorro prestado pelo Crescente Vermelho a vítimas mutiladas ou com graves queimaduras pelo corpo escandalizaram o mundo. “Indignado com os ataques israelenses que mataram muitos refugiados em Rafah”, afirmou o presidente francês, Emmanuel Macron. “Não há lugar seguro em Gaza. Este horror deve parar”, acrescentou António Guterres, secretário-geral da ONU.
O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, disse estar “horrorizado com as notícias vindas de Rafah sobre os ataques israelenses que mataram dezenas de pessoas deslocadas”. O governo brasileiro também repudiou o bombardeio. “Essa nova tragédia demonstra o efeito devastador sobre civis de qualquer ação militar israelense em Rafah, conforme manifestações e apelos unânimes da comunidade internacional, e diante dos deslocamentos forçados por Israel, que concentraram centenas de milhares de refugiados, em condições de absoluta precariedade, naquela localidade”.
Indiferente aos apelos por um cessar-fogo, Netanyahu mantém a ofensiva na cidade palestina e não demonstra qualquer constrangimento de violar repetidamente o direito internacional. Pudera. O governo dos EUA, principal aliado e fornecedor de armas de Tel Aviv, continua a lavar as mãos diante da carnificina. “Israel tem o direito de perseguir o Hamas. (…) Mas deve tomar todas as precauções possíveis para proteger os civis”, disse um porta-voz da Casa Branca. Enquanto isso, os “trágicos acidentes” se sucedem.
Publicado na edição n° 1313 de CartaCapital, em 05 de maio de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’
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