CartaCapital
PGR/ Engavetador engavetado
Augusto Aras deixa, sem saudades, o comando do Ministério Público Federal


O mandato de Rodrigo Janot, pistoleiro lavajatista que ameaçou atirar em ministros do Supremo Tribunal Federal, parecia marcar o fundo do poço da Procuradoria-Geral da República. Havia, no entanto, um alçapão e por ele se embrenhou Augusto Aras, eternamente grato ao seu padrinho, Jair Bolsonaro. Aras não só deu outro significado à alcunha de engavetador-geral, antes associada a Geraldo Brindeiro, o PGR de Fernando Henrique Cardoso. Sua conivência dolosa com os crimes praticados durante o governo Bolsonaro, da omissão assassina durante a pandemia de Covid-19 às articulações golpistas, fará com que seja associado ao período mais obscuro e vexatório de uma instituição que se autodestruiu na extrapolação autoritária dos deveres funcionais e constitucionais. Por conta dos delírios de poder da “República de Curitiba”, o Ministério Público tornou-se uma facção no seio do Estado, partidarizada e movida por interesses mesquinhos. O Brasil precisa ser salvo do messianismo do MP e caberá ao sucessor de Aras assumir esse compromisso. O mandato na PGR do aliado de Bolsonaro terminou na terça-feira 26, sem deixar saudades. Lula tem se esquivado das pressões para anunciar o substituto “às pressas”. Há dois nomes no páreo: Paulo Gonet Branco, indicado por Gilmar Mendes, e Antonio Carlos Bigonha, preferido de alas progressistas do direito. A despudorada campanha de certo colunismo político contra Bigonha, intensificada nos últimos dias, talvez seja o sinal da força do nome do procurador no Palácio do Planalto.
Escudo removido
Jair Bolsonaro virou réu na Justiça do Distrito Federal por incitação ao crime de estupro. A denúncia refere-se a um lamentável episódio ocorrido em 2014, no qual o então deputado federal declarou, na tribuna da Câmara, que só não estupraria a colega Maria do Rosário, do PT gaúcho, porque ela era “muito feia” e “não merecia”. O caso corria no Supremo Tribunal Federal porque o parlamentar, depois eleito presidente em 2018, tinha foro privilegiado. Com a derrota para Lula nas eleições do ano passado, o processo foi encaminhado à primeira instância. O ex-capitão já havia sido obrigado a publicar um pedido de desculpas formal a Rosário. Agora, o juiz Omar Dantas Lima, da 3ª Vara Criminal de Brasília, acolheu a denúncia do Ministério Público.
Congresso/ O vexame de Salles
Após meses de pirotecnia, a CPI do MST termina sem aprovar relatório final
O boiadeiro só desperdiçou verba pública – Imagem: Gilberto Soares/MMA
Proposta por bolsonaristas com a nítida intenção de criminalizar a luta pela reforma agrária, a CPI do MST encerrou suas atividades, na quarta-feira 27, de forma melancólica e vexaminosa, sem aprovar o relatório final da “investigação”. Durante meses, a comissão tomou o depoimento de lideranças do movimento, extraiu “confissões” de dissidentes do grupo, consultou representantes do Incra e especialistas, além de torrar 66 mil reais em viagens inúteis. Sem maioria para aprovar seu texto, a propor o indiciamento de dez pessoas, entre elas o general Gonçalves Dias, ex-chefe do GSI, e José Rainha, afastado do MST há mais de 15 anos, o deputado Ricardo Salles, do PL paulista, ainda tentou barganhar um prazo maior para concluir os trabalhos com o presidente da Câmara, Arthur Lira. Não colou.
O relatório ficará apenas nos registros da Câmara, sem qualquer efeito legal. Foi a terceira comissão instaurada contra o movimento social que terminou sem desfecho. A despeito do fracasso estrondoso de sua investida, o ministro boiadeiro de Jair Bolsonaro não pode se queixar do resultado. Sua intenção sempre foi usar a CPI para abastecer as redes bolsonaristas com fake news e intimidar os trabalhadores sem-terra. Em maio, durante um de seus arroubos autoritários, Salles chegou a invadir domicílios de camponeses assentados no interior de Goiás. Acabou denunciado por abuso de autoridade por parlamentares do PSOL.
Paridade de gênero
O Conselho Nacional de Justiça aprovou, na terça-feira 26, uma regra de alternância de gênero no preenchimento de vagas para a segunda instância do Judiciário. A ideia é que os tribunais mantenham duas listas paralelas: uma mista, formada por juízes e juízas, e outra somente por magistradas. As promoções devem ser intercaladas entre essas duas listas, até atingir a paridade de gênero. Em 2022, a participação feminina na magistratura brasileira era de 38%, segundo um relatório do CNJ.
2022/ Agente 86 nas eleições
Dossiê feito pelo GSI de Bolsonaro trazia dados defasados de Lula
O coronel que recebeu a papelada interagiu com os golpistas do 8/1 – Imagem: Redes sociais
Às vésperas do primeiro turno das eleições de 2022, militares do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência levantaram dados sigilosos sobre o então candidato Lula, principal adversário de Jair Bolsonaro na disputa, e de familiares do líder petista. O dossiê consta em uma comunicação recebida por e-mail, em 29 de setembro, pelo coronel Wanderli Baptista da Silva Júnior, então diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial. Ele é um dos servidores do GSI exonerados por ter interagido com os invasores do Palácio do Planalto em 8 de janeiro.
O conteúdo foi revelado pela Folha de S.Paulo na terça-feira 26. Em resposta ao jornal, o órgão e o coronel dizem que o procedimento é corriqueiro em eleições e visa garantir a proteção de quem possa a vir a assumir a Presidência da República. A justificativa parece plausível, mas chama atenção o amadorismo da turma. Boa parte das informações estava defasada ou trazia dados irrelevantes, como o endereço de uma lan house frequentada por Luís Cláudio, um dos filhos de Lula. Um relatório de 2003 dizia que outro filho do presidente, Fábio Luiz, era a “voz mais ativa” e parecia “mandar nos irmãos”. Nem o atrapalhado Agente 86 se fiaria em uma impressão subjetiva colhida 20 anos atrás.
Canadá/ “Herói ucraniano”
Chefe do Parlamento canadense renuncia após homenagear soldado nazista
No embalo, Zelensky também aplaudiu o ex-combatente – Imagem: Presidência da Ucrânia
O presidente do Parlamento do Canadá, Anthony Rota, renunciou ao cargo na terça-feira 26, após ter homenageado um soldado nazista durante uma visita do premier canadense Justin Trudeau e do presidente da Ucrânia Volodimir Zelensky. Em dado momento, o parlamentar celebrou a presença de um homem de 98 anos na galeria do edifício, Yaroslav Hunka. Segundo Rota, ele era “um herói ucraniano e um herói canadense” que atuou na Segunda Guerra Mundial. “Nós agradecemos a ele pelo serviço.”
Hunka lutou, porém, em uma divisão militar nazista contra o Exército Vermelho da União Soviética. Muitos aplaudiram o ex-combatente, inclusive Zelensky. Embora a maior parte dos ucranianos tenha se unido aos soviéticos para combater os nazistas, um parcela expressiva deles preferiu lutar na companhia de soldados de Hitler. O incidente despertou críticas da comunidade judaica canadense e também do governo da Rússia, que há tempos acusa Zelensky de abrigar grupos neonazistas em suas tropas.
Derretimento acelerado
O gelo marinho que se forma ao redor da Antártida atingiu o nível mais baixo dos últimos 44 invernos no Hemisfério Sul, informou, na segunda-feira 25, o Centro Nacional de Dados de Neve e Gelo dos EUA (NSIDC, na sigla em inglês). O recorde negativo acendeu o sinal de alerta quanto aos impactos das mudanças climáticas nessa sensível região do planeta. Essa camada de gelo costuma derreter no verão, alcançando seu nível mais baixo entre fevereiro e março, e depois volta a se formar no inverno. Em 10 de setembro, a cobertura atingiu 16,96 milhões de metros quadrados, a menor máxima para a stação do ano, desde o início dos registros por satélite, em 1979.
Cáucaso/ Evacuação em massa
Ocupação militar do Azerbaijão provoca êxodo de armênios
Ao menos 28 mil civis fugiram da região de Nagorno-Karabakh – Imagem: Alain Jocard/AFP
Mais de 28 mil refugiados da região de Nagorno-Karabakh cruzaram a fronteira com a Armênia até a terça-feira 26, segundo um balanço divulgado pelas autoridades de Yerevan. O êxodo ocorre após a vitoriosa ofensiva militar do Azerbaijão, que retomou o controle sobre o enclave do Cáucaso após 32 anos de conflitos com rebeldes separatistas. Apesar de habitado por armênios desde o século II a.C., o território ficou sob o controle azerbaijano após a implosão da União Soviética, em 1991.
Em um episódio ainda não esclarecido, ao menos 68 civis morreram e mais de 300 ficaram feridos na explosão de um posto de combustíveis perto da cidade de Stepanakert, a capital regional. O incidente ocorreu em meio à corrida por gasolina entre os armênios em fuga. Organizações internacionais têm manifestado preocupação com a possibilidade de haver uma limpeza étnica em curso, promovida pelas forças militares do Azerbaijão. O presidente azerbaijano, Ilham Aliyev, assegurou, porém, que respeitará os direitos humanos de todos os cidadãos que permanecerem na região, independentemente da etnia.
Publicado na edição n° 1265 de CartaCapital, em 04 de Outubro de 2023.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Muita gente esqueceu o que escreveu, disse ou defendeu. Nós não. O compromisso de CartaCapital com os princípios do bom jornalismo permanece o mesmo.
O combate à desigualdade nos importa. A denúncia das injustiças importa. Importa uma democracia digna do nome. Importa o apego à verdade factual e a honestidade.
Estamos aqui, há 30 anos, porque nos importamos. Como nossos fiéis leitores, CartaCapital segue atenta.
Se o bom jornalismo também importa para você, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal de CartaCapital ou contribua com o quanto puder.
