CartaCapital
Governo/ Apetite irrefreável
Lula anuncia criação de seu 38º ministério para acomodar o Centrão


Lula anunciou, na terça-feira 29, a criação do Ministério da Pequena e Média Empresa, sua 38ª pasta. Durante a sua transmissão semanal na internet, o presidente justificou a necessidade de haver uma estrutura específica para “cuidar dessa gente que precisa de crédito e de oportunidade”. O anúncio ocorre, porém, em meio às negociações para abrigar o PP, partido do presidente da Câmara, Arthur Lira, e o Republicanos, ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, em seu governo.
PP e Republicanos integraram formalmente a base de apoio do governo de Jair Bolsonaro, mas ambas as siglas possuem alas que se alinharam a Lula durante a corrida presidencial de 2022, quando o líder petista já despontava como favorito nas pesquisas de intenção de voto.
Publicamente, o senador Ciro Nogueira, que comanda o PP, e o deputado Marcos Pereira, bispo licenciado da Universal e presidente do Republicanos, dizem que as siglas continuarão independentes. Avalizaram, porém, os acordos para que os deputados André Fufuca e Sílvio Costa Filho sejam ministros de Lula, ainda que as pastas não estejam definidas.
O apetite do Centrão estende-se à Caixa Econômica Federal, que detém o maior número de correntistas do País (148 milhões). Funcionária de carreira do banco, Rita Serrano pode ser substituída por Margarete Coelho, atual diretora financeira do Sebrae. Ela é filiada ao PP e foi indicada por Lira.
Pego na mentira
Um relatório produzido pela Agência Brasileira de Inteligência desmente o depoimento de Silvinei Vasques à Polícia Federal. Enviado em 27 de outubro à Polícia Rodoviária Federal, então sob o comando de Vasques, o documento da Abin alertava para os riscos de caminhoneiros bloquearem as estradas após o segundo turno das eleições. “(Existem) chamamentos para que os caminhoneiros parem à beira de rodovias, visando uma eventual paralisação, em caso de derrota do atual Presidente da República (Jair Bolsonaro)”, dizia o texto. Ao depor na PF, Vasquez disse não ter recebido qualquer alerta. O informe foi revelado pelo portal Metrópoles na terça-feira 29.
Investigação/ Ninho de cobras
Planalto exonera coordenador da segurança presidencial
Sindicância apontou a ligação do coronel com os golpistas – Imagem: Marcelo Camargo/ABR
O Gabinete de Segurança Institucional exonerou, na terça-feira 29, o coronel Carlos Onofre Serejo Luz Sobrinho, que ocupava o cargo de coordenador-geral de Operações da Segurança Presidencial. A dispensa ocorre após a conclusão de uma sindicância, que apontou a deficiência no fluxo e na qualidade de informações como determinantes para a falta de reforço militar durante a invasão do Palácio do Planalto, no dia 8 de janeiro.
O oficial também é investigado pela CPI dos Atos Golpistas no Congresso Nacional. “Na sindicância instaurada no âmbito do GSI para apurar as ocorrências relacionadas ao 8 de janeiro de 2023, e compartilhada com esta CPMI, o agente público acima foi identificado como envolvido”, diz um trecho do requerimento aprovado pelos deputados e senadores para a quebra do sigilo telefônico e telemático do coronel da reserva.
8 de Janeiro/ Dia do Golpista
STF barra homenagem da Câmara de Porto Alegre aos “patriotas”
Para o ministro Luiz Fux, a infame data merece “repúdio constante” – Imagem: Arquivo/STF
Pode parecer inacreditável, mas a Câmara Municipal de Porto Alegre aprovou um Projeto de Lei que transforma o 8 de janeiro, data dos atos golpistas que devastaram Brasília, no “Dia do Patriota”. A iniciativa é do vereador bolsonarista Alexandre Bobadra, do PL, cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul por abuso de poder econômico na última eleição municipal. A efeméride não foi aprovada em plenário, mas passou incólume por três comissões da Casa. O prefeito Sebastião Mello, do MDB, devolveu o projeto ao Legislativo e o presidente da Câmara, Hamilton Sossmeier, do PTB, encarregou-se de promulgar a patetice.
Provocado pela Advocacia-Geral da União e pela Procuradoria-Geral da República, o Supremo Tribunal Federal considerou a homenagem uma afronta ao Estado Democrático de Direito e anulou a decisão da Câmara de Porto Alegre. Em decisão monocrática, o ministro Luiz Fux observou que “o dia 8 de janeiro não merece data comemorativa, mas, antes, repúdio constante”. Os vereadores da capital gaúcha já haviam se mobilizado para revogar a iniciativa, mas não conseguiram evitar o vexame.
Quem, eu?
Depois de promulgar uma lei que batiza um complexo viário com o nome do coronel Erasmo Dias, que comandou a repressão aos estudantes paulistas durante a ditadura, Tarcísio de Freitas se fez de desentendido. “Não nos cabe fazer censura ao Parlamento”, disse o governador de São Paulo na segunda-feira 28, enfatizando que a proposta partiu do Legislativo e o Executivo apenas a sancionou. O Centro Acadêmico 22 de Agosto, da Faculdade de Direito da PUC, universidade invadida pela tropa de Dias nos anos de chumbo, e diversos partidos protocolaram na Suprema Corte uma ação direta de inconstitucionalidade contra a absurda homenagem. A ministra Cármen Lúcia deu prazo de cinco dias para o governador e o presidente da Alesp, André do Prado, do PL, justificarem a patacoada.
França/ Sob o véu da intolerância
Governo proíbe o uso de vestimenta muçulmana em escolas públicas
Apenas 23% dos franceses não se incomodam com o uso da abaya – Imagem: iStockphoto
O Ministério da Educação da França anunciou, no domingo 27, a proibição do uso da abaya, vestimenta que cobre quase todo o corpo das mulheres em países árabes de maioria muçulmana, nas escolas públicas francesas. “Não deveria ser possível identificar a religião de um aluno quando ele entra em uma sala de aula”, justificou o ministro Gabriel Attal.
Sob o pretexto de preservar a laicidade do ensino, a iniciativa do governo francês foi saudada por políticos conservadores, mas repudiada por ativistas de direitos humanos e parlamentares de esquerda. A “política da vestimenta”, como alertou a deputada progressista Clémentine Autain, só reforça o estigma contra os imigrantes árabes e o discurso nacionalista.
A iniciativa tem, porém, apelo popular. Segundo uma pesquisa do Instituto Francês de Opinião Pública, apenas 23% dos entrevistados em junho eram favoráveis à permissão do uso da abaya nas escolas públicas.
Argentina/ Polarização reforçada
Pesquisas indicam segundo turno entre Javier Milei e o ministro Sergio Massa
O ultradireitista quer dinamitar o Estado e extingir as políticas redistributivas. O governista aposta no reforço dos programas sociais para amparar os argentinos na crise- Imagem:
As primeiras pesquisas divulgadas após as primárias na Argentina, em 13 de agosto, indicam que a corrida presidencial será decidida em um segundo turno disputado por Javier Milei e o ministro da Economia, Sergio Massa. Nas sondagens, Patricia Bullrich, líder da coligação de centro-direita Juntos pela Mudança e ex-ministra de Mauricio Macri, não parece capaz de romper a polarização entre o ultradireitista e o governo peronista.
Nas primárias, Milei ficou em primeiro lugar, com 30% dos votos. Massa terminou em segundo, com 21,4%, e Bullrich ocupou o terceiro posto, com 16,98%. Agora, segundo a empresa de consultoria Analogias, o candidato da extrema-direita ampliou a vantagem para 32,1% das intenções de voto, seguido por Massa (26,8%) e Bullrich (20,9%). Já a pesquisa da Opiniaia aponta Milei com 35%, contra 25% do ministro da Economia e 23% da candidata da Juntos pela Mudança. Num eventual segundo turno, o “anarcocapitalista” derrotaria qualquer um de seus dois rivais.
O cenário ainda é extremamente desfavorável aos peronistas, mas não se confirmaram as previsões de analistas que apostavam em dois candidatos da direita no segundo turno. No domingo 27, Massa anunciou uma série de medidas econômicas destinadas a aliviar a grave crise que castiga os argentinos. Elas incluem benefícios para aposentados, incentivos para pequenas e médias empresas, apoio a trabalhadores independentes, bem como redução de impostos para os setores mais combalidos. O ministro anunciou ainda 770 milhões de dólares para financiar as exportações.
O êxito (ou fracasso) dessas iniciativas será determinante para os rumos da eleição. Enquanto o governo de Alberto Fernández reforça as ações de proteção social, Milei defende exatamente o oposto: o enxugamento da estrutura do Estado e o fim de todas as políticas redistributivas. Sua agenda inclui abolir o sistema de ensino público da Argentina e desmantelar os serviços de saúde gratuitos, além de fechar os ministérios da Mulher, da Ciência, da Saúde, da Educação, do Trabalho e das Obras Públicas. A despeito do evidente radicalismo, metade dos eleitores acredita que a Argentina estaria em melhor situação com Milei no poder, segundo uma pesquisa realizada pela Universidade Nacional de Buenos Aires, a UBA.
A lição chilena
Enquanto o Brasil ainda presta homenagens a agentes da repressão na ditadura, a Suprema Corte do Chile condenou sete militares pelo sequestro e assassinato do cantor e compositor Victor Jara em 11 de setembro de 1973, poucos dias após o ditador Augusto Pinochet tomar o poder. A duas semanas do 50º aniversário do golpe de Estado que depôs o socialista Salvador Allende, o tribunal condenou os sete oficiais da reserva do Exército a penas que variam de 8 a 25 anos de prisão. Jara, uma das vozes mais conhecidas da música popular latina, foi torturado e executado com 44 tiros após ser detido na Universidade Técnica do Estado, onde lecionava.
Publicado na edição n° 1265 de CartaCapital, em 6 de setembro de 2023.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’
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