CartaCapital
Defesa/ Brincando de guerra
Justiça suspende compra de blindados do Exército por 5 bilhões de reais


O Tribunal Regional Federal da 1ª Região suspendeu a compra de 98 blindados Centauro 2, da marca italiana Iveco-Oto-Melara, prevista para ser concluída na segunda-feira 5 pela bagatela de 5 bilhões de reais. A aquisição faz parte do programa de renovação da frota do Exército. Em resposta a uma ação popular, o juiz federal Wilson Alves de Souza concedeu liminar para barrar o negócio. Considerou a despesa desnecessária diante da crise nas finanças públicas, com “sabidos cortes de verbas da educação e da saúde que ultrapassam 3 bilhões de reais”.
A gestão de Jair Bolsonaro traçou um plano para comprar 221 blindados desse modelo até 2037, um despropósito em tempos de paz. “Ao que consta a todos, a única guerra que se está a enfrentar neste momento é a travada contra a Covid-19, que permanece e recrudesce no atual momento – e isso também é fato público e notório –, a exigir mais investimentos em lugar de cortes, exatamente na área da saúde”, acrescentou o magistrado.
Depois da gastança eleitoral, Bolsonaro anunciou, no fim de novembro, o bloqueio de 5,7 bilhões de reais no Orçamento de 2022, para evitar o estouro do teto de gastos. Restaram apenas 2,4 bilhões para custear todas as despesas discricionárias – aquelas que não são de pagamento obrigatório, como os salários de servidores. Áreas como Saúde, Educação e Meio Ambiente estão estranguladas e com diversas atividades paralisadas.
A carne é fraca
A Polícia Civil investiga um caso de tortura em um supermercado de Canoas (RS). Dois homens, um deles negro, foram espancados por 45 minutos após serem flagrados com dois pacotes de picanha furtados em uma unidade da Unisuper. A polícia só soube do crime porque uma das vítimas procurou um hospital com fraturas na cabeça e no rosto, e precisou ser colocada em coma induzido. Como de praxe nesses casos, a rede gaúcha disse repudiar a tortura e jogou a responsabilidade para uma empresa terceirizada, a Glock Segurança. Quando o caso veio à tona, circulavam nas redes sociais as cenas de um jantar de Ronaldo Fenômeno e quatro amigos da Seleção brasileira no Catar. Eles saboreavam uma bisteca folheada a ouro, preparada pelo chef turco Salt Bae pela bagatela de 9 mil reais. Criticado pela ostentação diante de 33 milhões de brasileiros famélicos, Ronaldo disse não ver nada de errado. “Inclusive, pode ser inspirador”.
Tarcísio/ “Nunca fui bolsonarista raiz”
O governador paulista é o enésimo aliado a apunhalar Bolsonaro
O ex-ministro nega a disposição de travar uma “guerra ideológica” – Imagem: MInfra
As lágrimas de Jair Bolsonaro em uma cerimônia de promoção de oficiais das Forças Armadas, na segunda-feira 5, em Brasília, não verteram ao acaso. Inconsolável com a derrota na corrida presidencial, mesmo após despejar dezenas de bilhões de reais em benefícios para comprar a reeleição, ele amarga o abandono de aliados que até ontem o paparicavam, e agora cortejam Lula. A mais recente punhalada foi desferida por Tarcísio de Freitas, eleito governador em São Paulo com o apoio do ex-capitão. Em entrevista à CNN Brasil, o ex-ministro da Infraestrutura disse nunca ter sido um “bolsonarista raiz” e descartou a possibilidade de iniciar uma “guerra ideológica” contra o governo federal sob o comando do líder petista.
“Nunca fui bolsonarista raiz. Comungo das ideias econômicas, a valorização da livre iniciativa, os estímulos ao empreendedorismo, a busca do capital privado, a visão liberal. Sou cristão, contra aborto, contra liberação de drogas, mas não vou entrar em guerra ideológica”, disse Tarcísio. Nem mesmo o tucano João Doria foi tão rápido em se livrar do ex-aliado, após se eleger governador, em 2018, com o mote “BolsoDoria”.
Peru/ Triste fim
Contra a chantagem do processo de impeachment, Pedro Castillo fracassa no golpe
Castillo, o Sassá Mutema da esquerda sul-americana – Imagem: Luis Iparraguirre/Presidência do Peru
A crise institucional no Peru atingiu o fundo do poço. Acuado pelo terceiro pedido de impeachment em 18 meses de mandato, em um país que se acostumou a derrubar presidentes como quem troca de roupa, Pedro Castillo lançou-se em uma aventura golpista e se deu mal. Na quarta-feira 7, horas antes de o Parlamento julgar o processo de destituição, Castillo decretou em rede nacional estado de exceção, a dissolução parcial do Congresso e a convocação de novas eleições para a escolha de uma Assembleia Constituinte, além de acusar o Legislativo de “querer dinamitar a democracia”. As medidas incluíam o toque de recolher noturno e a reestruturação do Poder Judiciário. Sem apoio político, popular e das Forças Armadas, o presidente conseguiu apenas precipitar de forma dramática a própria derrocada. O general Walter Córdova Alemán, comandante do Exército, foi o primeiro a renunciar ao cargo. Vários ministros fizeram o mesmo. Em nota conjunta, as Forças Armadas e a polícia recusaram-se a seguir as ordens. O Ministério Público decidiu denunciar o mandatário, enquanto os parlamentares ignoraram as ameaças e mantiveram o julgamento do impeachment, cujo resultado, antes incerto, passou a ser de favas contadas. Sem conseguir asilo no México, Castillo saiu do palácio diretamente para a cadeia. Aos peruanos, resta o caos.
Cerco ao “ogronegócio”
Acabou a tolerância com os produtores e exportadores de mercadorias associadas ao desmatamento de florestas tropicais. Na terça-feira 6, o Parlamento Europeu e os Estados membros da UE chegaram a um acordo para proibir a entrada desses produtos no bloco. Os ambientalistas celebram a iniciativa, que deve ferir de morte os setores mais atrasados do agronegócio brasileiro – alguns deles a financiar atos golpistas.
O texto aprovado pelos europeus cita nominalmente diversas commodities que figuram no topo das exportações brasileiras, como soja, carne bovina, cacau e café. As empresas importadoras ficarão responsáveis por monitorar toda a cadeia de abastecimento, além de comprovar a sua rastreabilidade por meio de dados de geolocalização das safras e fotos de satélite.
China/ Revolta zero
Para pacificar protestos, Xi Jinping flexibiliza restrições anticovid
Após três anos, os chineses estão fartos das medidas sanitárias – Imagem: Peter Parks/AFP
Após a onda de protestos contra a draconiana política de “Covid Zero”, várias cidades chinesas flexibilizaram, na sexta-feira 2, as medidas para deter o avanço do Coronavírus. A iniciativa conta com o aval do próprio presidente chinês, Xi Jinping, a justificar que a atual onda de contágio, com a variante Ômicron, é menos agressiva e letal que as anteriores. “Isso abre a possibilidade de mais abertura nas restrições”, afirmou o líder chinês ao presidente do Conselho Europeu, Charles Michel.
Frustrados com a manutenção das medidas restritivas após três anos de pandemia, os chineses tomaram as ruas dos maiores centros urbanos para exigir maior liberdade de ir e vir. Somente então funcionários do alto escalão do governo entenderam que era o momento de amenizar a política de “Covid Zero”. No fim de novembro, em discurso à Comissão Nacional da Saúde, a vice-premier chinesa, Sun Chunlan, já havia reconhecido que a Ômicron era menos perigosa e a taxa de vacinação cresceu de forma expressiva. Foi a primeira sinalização da abertura ocorrida dias depois.
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1238 DE CARTACAPITAL, EM 14 DE DEZEMBRO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “A Semana”
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