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Obesidade e câncer

Estudo recente indica que a reversão da obesidade por meio de cirurgia bariátrica reduz o risco de aparecimento de tumores malignos

Obesidade e câncer
Obesidade e câncer
Foto: IstockPhoto
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A obesidade está se estabelecendo como uma das maiores pandemias do mundo moderno. Em estudos epidemiológicos atualizados recentemente, estima-se que mais de 40% da população americana esteja obesa, com todas as consequências a longo prazo desse distúrbio metabólico grave.

Além da clássica associação de sobrepeso e obesidade com diabetes e doenças cardiovasculares crônicas importantes, como infarto do coração, derrame ou acidente vascular cerebral, apneia do sono e doenças renais, estudos na última década identificaram uma correlação entre obesidade e risco de diversos tumores malignos. Vários mecanismos atuam na pessoa obesa para aumentar o risco de desenvolvimento de um câncer, como alterações metabólicas e hormonais significativas que persistem por muitos anos.

Um estudo recentemente publicado na revista Jama, liderado pelo doutor Ali Aminiam, da Cleveland Clinic, em Ohio, nos Estados Unidos, mostrou que a reversão e o controle da obesidade, por meio de cirurgia bariátrica, conseguiram impactar favoravelmente o risco de aparecimento de um câncer nessa população.

Conversamos com Ricardo Cohen, cirurgião-coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes e pesquisador dedicado ao tratamento cirúrgico da obesidade no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, para entender as implicações deste estudo.

CartaCapital: O que este estudo trouxe de novidades?
Ricardo Cohen:
 Ele fornece mais evidências de que a perda substancial de peso alcançada com a cirurgia bariátrica oferece proteção de longo prazo contra o câncer. O estudo descobriu que adultos com obesidade que fizeram cirurgia bariátrica tiveram risco 32% menor de desenvolver câncer e 48% menor de ­morrer de câncer, em comparação com os que não fizeram a cirurgia. A magnitude do benefício foi muito grande e relaciona a magnitude da perda de peso à maior redução no risco de câncer.

CC: Como foi feito o estudo?
RC:
 O estudo Splendid envolveu 30.318 adultos com obesidade (idade média de 46 anos; 77% mulheres; IMC mediano, 45 kg/m2). Os 5.053 pacientes submetidos ao bypass gástrico em Y de Roux (66%) ou gastrectomia vertical (34%) foram pareados a 25.265 pacientes que não foram submetidos à cirurgia bariátrica. Em dez anos, os pacientes que fizeram a cirurgia bariátrica perderam dez vezes mais peso do que os que não foram operados.

CC: E em relação ao aparecimento de câncer?
RC:
 Durante um acompanhamento médio de 6,1 anos, 96 pacientes no grupo de cirurgia bariátrica e 780 pacientes no grupo de controle não cirúrgico desenvolveram câncer. A incidência cumulativa de câncer associado à obesidade foi significativamente menor no grupo de cirurgia bariátrica

CC: Algum tipo específico de câncer foi mais impactado?
RC:
 A maioria dos tipos de câncer foi menos comum no grupo de cirurgia bariátrica. No entanto, uma análise abrangente do impacto da cirurgia bariátrica em tipos de câncer individuais não foi possível nesse estudo.

CC: Por que não se viu redução de risco de câncer no grupo controle, apesar de alguns terem perdido peso?
RC: 
Para o efeito protetor do câncer, os pacientes precisam perder, pelo menos, de 20% a 25% do peso corporal, o que é quase impossível apenas com modificações de estilo de vida. Os novos fármacos prometem melhores resultados em relação à perda de peso, mas os estudos, até o momento, têm curto prazo de seguimento – 1,5 ano, em média. A obesidade perde apenas para o tabaco como causa evitável de câncer e o estudo Splendid fornece a melhor evidência possível sobre o valor da perda de peso intencional para a redução do risco de câncer e mortalidade.

CC: O estudo Splendid já é definitivo?
RC:
 Esta publicação é importante, mas restam dúvidas. Ela é baseada numa análise populacional e estimula estudos futuros a examinar os fatores potenciais que influenciam a associação entre cirurgia bariátrica e risco reduzido de câncer, com o objetivo de individualizar tratamento e descobrir quem se beneficiará mais. É provável que a redução do risco de câncer após a cirurgia bariátrica varie de acordo com sexo, idade, raça e etnia, tipo de cirurgia bariátrica, álcool e tabagismo, localização do câncer, diabetes, índice de massa corporal e outros fatores. Além disso, precisamos investigar melhor os mecanismos biológicos específicos responsáveis ​​pela mudança observada no risco de câncer – eles ainda não foram claramente elucidados em humanos. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1237 DE CARTACAPITAL, EM 7 DE DEZEMBRO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Obesidade e câncer”

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