

Opinião
Primeiro ou segundo?
Para Lula, não faz diferença ganhar em 2 ou 30 de outubro. Para o Brasil, o quanto antes, melhor


A pouco mais de uma semana da eleição, a dúvida que resta é se Lula derrota Bolsonaro no primeiro ou no segundo turno. Fora as “pesquisas” divulgadas pelo bolsonarismo, não há uma sequer que indique um desfecho diferente.
O motivo de continuar tão elevada a probabilidade da vitória de Lula é que nenhuma das apostas do capitão para melhorar suas chances deu certo. Tomou todas as medidas sugeridas por seus “estrategistas” e nada funcionou. Tentaram o que puderam, especialmente de junho em diante: mexeram no preço dos combustíveis (prejudicando as finanças estaduais com pedaladas no ICMS), despejaram bilhões para comprar o apoio do eleitorado popular, diretamente (com “auxílios” descaradamente populistas) e indiretamente (canalizando dinheiro para obras e serviços de interesse de aliados), exigiram dos bispos amigos a contrapartida das benesses recebidas (retribuídas com uma militância partidária escandalosamente imoral), mantiveram o tom abertamente ameaçador dos pronunciamentos militares (para assustar os eleitores), abusaram da usurpação de recursos e símbolos públicos, dando-lhes uso privado na campanha. Isso tudo, à vista de todos. Sem contar a bandalheira de sempre nos subterrâneos da internet (onde repetem a prática de disseminar mentiras e caluniar adversários).
O saldo? Lula perdeu pouquíssimo da vantagem anterior (2 pontos) e Bolsonaro viu-se obrigado a se contentar com o crescimento de míseros 2 pontos na média das pesquisas. Nunca fizemos uma eleição com tamanho desvio de dinheiro público, tanta falta de escrúpulos e tanta intimidação, com consequências tão pífias.
Quando chegamos a meados de agosto, Lula obtinha, na média das pesquisas presenciais divulgadas, 53% dos votos válidos no primeiro turno e 60% no segundo. Ficava com os mesmos números de maio, quando estava em seu máximo. Fracassaram os coelhos da cartola, os ases na manga, as balas de prata do bolsonarismo. A 45 dias da eleição, confirmava-se a chance da vitória de Lula e era considerável a probabilidade de uma decisão no primeiro turno.
No conjunto das pesquisas, Bolsonaro não ganhou, desde então, 1 ponto sequer nos votos válidos, o que significa que não conseguiu se beneficiar do início da propaganda eleitoral na televisão e no rádio, tampouco da temporada de debates e entrevistas com candidatos promovida pelos meios de comunicação. Mais crucialmente para ele, deu chabu o festival bolsonarista no 7 de Setembro. Saudado como o “dia da virada”, não virou nada. Outra decepção.
As últimas três semanas trouxeram, no entanto, mudanças nas outras candidaturas, que afetaram os prognósticos. Não a respeito de quem ficaria no segundo lugar, pois, embora sem crescer, o capitão permanecia estacionado no posto. Mas na possibilidade de uma solução no primeiro turno. A partir do fim de agosto, com o começo da campanha, as pesquisas registraram um discreto crescimento de Ciro Gomes e Simone Tebet. A soma de ambos com os demais candidatos foi de 9 para 14 pontos. Como são candidaturas apoiadas por eleitores e eleitoras majoritariamente antibolsonaristas, os 5 pontos de aumento afetaram mais Lula do que Bolsonaro.
O reflexo foi a redução da possibilidade da vitória de Lula no dia 2 de outubro, sem comprometer o resultado final. Ou seja, o favoritismo de Lula não mudou, pois os eleitores que pensam votar em Ciro, Tebet e outros nomes, no primeiro turno, preferem Lula no segundo, como mostram as pesquisas. Elas não nos permitem dizer, hoje, quão intensa será a antecipação desse voto contra Bolsonaro e a favor de Lula no primeiro turno. Se for pequena, permanece a chance de vitória do ex-presidente no dia 2, mas o mais provável é que a margem seja estreita. Se for grande, a possibilidade de um resultado dilatado aumenta.
Em eleições normais, nas quais a disputa se trava entre candidatos de bem, que compartilham valores humanos e democráticos, é possível dizer que uma vitória folgada, em um segundo turno, pode ser até melhor, no médio prazo, do que uma apertada no primeiro. Não é, no entanto, o que temos hoje no Brasil.
Bolsonaro é uma ameaça grave ao nosso presente e futuro. Sua vileza de caráter e incapacidade de convivência na democracia, que suscitam e estimulam o pior em muita gente, tornam imperativo que seja removido o mais cedo possível. Para Lula, não faz tanta diferença se ganha por pouco, no primeiro turno, ou por muito, no segundo. Para o Brasil, o quanto antes, melhor. •
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1227 DE CARTACAPITAL, EM 28 DE SETEMBRO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Primeiro ou segundo? “
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Muita gente esqueceu o que escreveu, disse ou defendeu. Nós não. O compromisso de CartaCapital com os princípios do bom jornalismo permanece o mesmo.
O combate à desigualdade nos importa. A denúncia das injustiças importa. Importa uma democracia digna do nome. Importa o apego à verdade factual e a honestidade.
Estamos aqui, há 30 anos, porque nos importamos. Como nossos fiéis leitores, CartaCapital segue atenta.
Se o bom jornalismo também importa para você, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal de CartaCapital ou contribua com o quanto puder.