Política
A Semana: Vergonha alheia
Moro cada vez mais alijado do processo


O ex-juiz Sergio Moro é mais simplório do que se pensa. Sua última cartada para permanecer no jogo eleitoral foi o anúncio de um movimento “popular” contra os caciques partidários do União Brasil que barram suas ambições. Infelizmente para Moro, faltam populares dispostos a defender sua candidatura e a celebração da mídia não tem mais o mesmo efeito. Sem uma legenda que banque sua campanha à Presidência ou mesmo ao Senado, reduzido à alternativa cruel de disputar uma vaga de deputado federal por São Paulo, estado em que nunca morou, o ex-magistrado viu-se obrigado a admitir na segunda-feira 25: “Pode ser que eu não seja candidato a nada”. O fracasso, no entanto, subiu-lhe à cabeça. Com o traquejo e a argúcia peculiares, Moro afirmou que vai trabalhar para “romper a polarização” (?) e fortalecer o “centro democrático” (???). Ninguém lhe disse, mas, aparentemente, a terceira via, cheia de problemas, dispensa outro estorvo. A aliança entre UB, MDB e PSDB parece ter no ex-governador paulista João Doria um entrave. Um jantar que seria oferecido na segunda 25 pelo pré-candidato tucano à senadora emedebista Simone Tebet e ao presidente do UB, Luciano Bivar, foi desmarcado na última hora e causou embaraço. Tebet e Bivar, segundo fontes, decidiram não dar protagonismo a Doria na condução dos debates.
Bíblia e bala
Bolsonaristas e armas de fogo: a perigosa combinação por pouco não provocou uma morte no aeroporto de Brasília na segunda-feira 25, quando o ministro da Educação, Milton Ribeiro, disparou acidentalmente sua pistola e atingiu com estilhaços uma funcionária da Latam. Em depoimento à PF, Ribeiro, que infringiu várias regras, contou que tentava desacoplar a arma de seu carregador antes de despachá-la no balcão, quando ocorreu o disparo. Ele manuseava a pistola dentro da pasta para não chamar atenção.
Assédio/ Corda no pescoço
Processo contra o vereador Gabriel Monteiro avança
Assédio sexual parece ser uma bandeira da “nova política” – Imagem: Redes sociais
Na quarta tentativa de encontrar Gabriel Monteiro, o Conselho de Ética da Câmara Municipal do Rio de Janeiro finalmente conseguiu notificar o vereador do PL. A contar desta data, Monteiro terá dez dias úteis para apresentar defesa prévia no processo em que é acusado de estupro, assédio sexual e moral contra funcionários, manipulação de vídeos e conteúdo falso e atentado aos direitos da criança e do adolescente. Se todos os prazos forem cumpridos, em 45 dias o vereador poderá ter a cassação recomendada pelo conselho. Em seguida, o processo será encaminhado à Mesa Diretora da Câmara para votação em plenário, onde dois terços dos votos serão necessários para a perda de mandato. Em sua última aparição pública, o vereador bolsonarista comentou a acusação, feita por um ex-assessor, de ter filmado relações sexuais com uma menor de idade: “Só quero que as pessoas compartilhem as provas da minha inocência como compartilharam as acusações”.
Redes sociais/ O pássaro da mentira
Elon Musk compra o Twitter em nome da “liberdade de expressão”
Musk vai fazer do Twitter a arena dos tolos – Imagem: Justin Pacheco/Força Aérea dos EUA
Filho de um empresário que enriqueceu durante o apartheid na África do Sul, defensor de golpes de Estado como aquele na Bolívia, Elon Musk, o homem mais rico do planeta, acaba de pagar 44 bilhões de dólares pelo controle do Twitter, rede social com 217 milhões de usuários. A extrema-direita e os propagadores de fake news do mundo inteiro celebraram. Musk reclamava dos critérios de medição da plataforma e alegou que a aquisição visa defender “a liberdade de expressão”. No caso, o direito de mentir e espalhar desinformação. O bilionário é uma prova de que acumular muito dinheiro nada tem a ver com inteligência ou razão: uma de suas teses é de que as pirâmides do Egito foram construídas por extraterrestres. Prova também que neoliberalismo e democracia não guardam nenhuma relação entre si. O anúncio do negócio atraiu de volta ao Twitter a malta de bolsonaristas que havia abandonado as redes por não poder mais compartilhar impunemente discursos de ódio e mentiras deslavadas. É bom o Tribunal Superior Eleitoral e a oposição ficarem de olho.
Inflação persistente
Apesar do pacote de Bolsonaro e Paulo Guedes para tentar aliviar o bolso do trabalhador em ano eleitoral, a realidade econômica do País joga contra o governo. Medida pelo IPCA, a taxa mensal de variação da inflação de março em relação a fevereiro deste ano foi de 1,62%. Trata-se do maior aumento em um mês desde 2003, quando esse mesmo índice chegou a 2,25%. É também a maior taxa para março desde o lançamento do Plano Real, em 1994. No momento, os maiores vilões da inflação são os transportes e os alimentos, ambos influenciados pela política de preços de combustíveis da Petrobras.
Chile/ Início difícil
Gabriel Boric enfrenta queda de popularidade
Boric não teve direito à tradicional “lua de mel” – Imagem: Presidência do Chile
Completados dois meses de mandato, o presidente do Chile, Gabriel Boric, amarga uma inesperada queda de popularidade. Segundo pesquisa divulgada pelo instituto Cadem na terça-feira 26, o apoio despencou de 50% para 36% nas duas últimas semanas. Vencedor da eleição com 55% dos votos em uma disputa apertada contra o candidato de extrema-direita José Antonio Kast, Boric, ex-líder estudantil, chegou ao poder com a desconfiança de parte da sociedade chilena. Ainda assim, a abrupta redução do número de eleitores que considera o governo bom contraria o período de “lua de mel” que presidentes recém-eleitos costumam atravessar. A pesquisa foi realizada dois dias depois de o Congresso rejeitar duas propostas do governo que permitiriam o saque de até 10% dos fundos de aposentadoria dos chilenos. O revés político foi sentido no bolso, sobretudo, dos trabalhadores mais pobres, setor do qual Boric ainda precisa se aproximar. Segundo a pesquisa, a rejeição ao novo presidente chileno chega a 61% nas duas faixas mais pobres da população.
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1206 DE CARTACAPITAL, EM 4 DE MAIO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “A Semana”
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