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Selo de qualidade

O Sistema B propõe-se a combater o greenwashing e criar uma certificação mundialmente confiável para a sociedade

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Jornada. A Hering, do CEO Thiago, descobriu múltiplas vantagens de ser sustentável. Francine Lemos, do Sistema B, destaca o interesse crescente pela certificação - Imagem: Sistema B
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O greenwashing, estratagema marqueteiro de ostentar ações de sustentabilidade sem efetivamente praticá-las, é bastante comum. Relatório de 2022 produzido pelo New ­Climate Institute, em parceria com a ­Carbon Market Watch, entidades com credibilidade no tema, e divulgado no início do mês, aponta que 25 das maiores empresas do mundo que dizem assumir compromissos para atingir o chamado “net zero” em emissões de carbono, de fato se comprometem em reduzi-las em 40%, em média, e não em 100% como anunciam. Entre as companhias analisadas estão gigantes como Apple, Google e Walmart, assim como as brasileiras Vale e JBS. Um antídoto para essa prática é a certificação, a emissão de selos de qualidade por uma entidade independente, como o Sistema B, movimento global surgido nos Estados Unidos em 2006 com o ambicioso propósito de redefinir os parâmetros de sucesso no mundo dos negócios, que há séculos se atém exclusivamente ao desempenho financeiro, sem considerar o bem-estar da sociedade e do planeta.

Francine Lemos, diretora-executiva do Sistema B Brasil, afirma que, desde 2019, cresce o número de empresas interessadas em integrar o Sistema B, quando os princípios ESG (sigla em inglês para meio ambiente, responsabilidade social e governança corporativa) ganharam impulso e tornaram-se alvo de empresas desejosas de incorporá-los. A pandemia acentuou o movimento, porque despertou ainda mais atenção para os maiores desafios deste início do século XXI: a emergência climática e a desigualdade no mundo. Somente no ano passado, foram 71 empresas certificadas no Brasil, 30% sobre o total do ano anterior.

Além disso, cresceu o número de empresas em busca de informações e orientações sobre o processo, pressionadas pelas cobranças de investidores e consumidores para que adotem práticas socialmente responsáveis. “Dobrou a procura pela plataforma BIA, uma ferramenta de gestão e avaliação de impacto, online, confidencial, gratuita e disponível para qualquer companhia”, destaca a executiva. No ano passado, a BIA registrou 2,8 mil acessos. O dispositivo analisa o estágio de cada empresa com base em 200 indicadores, agrupados em cinco pilares, desde a adoção de políticas e ações de governança, até as práticas estabelecidas para os funcionários, passando pelo mapeamento da comunidade do entorno da empresa, sua cadeia de fornecedores e o uso eficiente dos recursos naturais, para, finalmente, mostrar como a empresa, a partir do seu modelo de negócio, resolve um problema socioambiental ou impacta positivamente o seu público. Lemos considera esse indicador um importante ponto de diferenciação das empresas no seu mercado consumidor. Ou seja, o Sistema B avalia a companhia não só no contexto tradicional dos princípios e práticas ESG, mas como o seu negócio afeta positivamente os envolvidos na operação e os clientes.

De acordo com a executiva, “quanto maior a empresa, maior o potencial de impacto positivo ou negativo do seu negócio, portanto, mais complexo é o processo, que leva, em média, dez meses até ser concluído”. No caso de uma companhia pequena, o maior problema é cultural, porque são informais em termos de processos, políticas e práticas. Por isso, acrescenta, “é importante uma preparação prévia, a fim de que estejam conscientes do que vão enfrentar, porque o próprio processo de certificação é uma jornada de grande transformação para elas”.

Cada vez mais empresas descobrem as vantagens econômicas e sociais de aderir ao programa

Com mais de 140 anos, 700 franquias, 8 mil pontos multimarcas, 4 mil colaboradores, unidades administrativas, fabris e centros de distribuição em Goiás, Santa Catarina e São Paulo, a tradicional Cia. Hering levou cerca de nove meses para ser certificada, “um tempo recorde para empresas do nosso porte”, segundo o CEO Thiago Hering. “O maior esforço esteve relacionado à profundidade das análises, à comprovação das evidências e ao levantamento de documentos. E isso faz parte do processo, é exatamente o que torna a metodologia do Sistema B tão confiável”, esclarece.

Como exemplo, o CEO cita a preservação de uma reserva ambiental de 4,2 milhões de metros quadrados e o pioneirismo em processos de tratamento de água e a oferta de produtos ecoeficientes desde 1990. Tais iniciativas resultaram na redução de 35% no consumo de água, sobre a média dos últimos dois anos, em 2021. Além disso, acrescenta, hoje 93% da matriz energética provém de fontes renováveis e seu produto mais icônico, a camiseta World, tornou-se carbono negativo, ou seja, quando chega às mãos do cliente, o processo terá compensando o dobro das emissões de gases de efeito estufa durante a fabricação. Além da “relação de confiança” advinda de serem referência em ESG, serem valorizadas por investidores e bem-vistas pelos clientes, outra vantagem consiste em atrair talentos que preferem trabalhar nessas empresas com propósito, sustenta Hering.

Felipe Ufo, CEO e fundador da Naveia, fabricante de leite vegetal à base de aveia, assegura que, mais do que ter um selo para apresentar aos consumidores, a certificação do Sistema B possibilita aprender a ser uma empresa melhor, o que inclui entender que informação é fundamental nas escolhas do consumidor. “Quanto mais ele recebe, mais consciente fica. Se temos o privilégio de poder escolher o que colocamos no nosso copo, no nosso prato, temos o dever de fazer escolhas conscientes, entendendo todos os impactos que aquele produto causa no nosso planeta. O Selo B ajuda o consumidor a fazer essas escolhas.”

Não só o consumidor: a gestora de investimentos Rise Ventures decidiu apostar suas fichas em empresas que geram impacto socioambiental positivo. “Acreditamos em modelos de investimento mais inclusivos, que gerem mais valor para além do financeiro”, diz seu CEO, Pedro Vilela, que fundou a Rise, em 2016, com Tiago Longuini e Daniel Madureira, todos profissionais dos segmentos de ­Private Equity, M&A (fusões e aquisições), consultorias e empreendimentos. O portfólio da gestora inclui a Beleaf, do setor de alimentação à base de plantas, a Alba Energia, que trabalha com energia limpa, e a Okena, que atua na gestão de resíduos industriais. O gestor destaca que, pelo fato de o Sistema B permitir olhar todos os aspectos relacionados a produtos e serviços que geram impactos mensuráveis positivos de cada venda de uma empresa, é possível medir concretamente os indicadores que contribuem para a inclusão social ou para a restauração e preservação de recursos naturais, ou para a saúde preventiva. Dessa forma, observa, é possível disseminar a cultura ESG. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1197 DE CARTACAPITAL, EM 2 DE MARÇO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Selo de qualidade”

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