Política
Berlinck Neto é afastado da presidência da Fecap
O gestor é acusado de superfaturamento e desvio de recursos. CartaCapital antecipou as denúncias de irregularidades nas contas da fundação


Alvo de denúncias de superfaturamento e desvio de recursos, Horácio Berlinck Neto foi afastado da presidência e do Conselho de Curadores da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap). Na sexta-feira 7, o gestor renunciou ao cargo, que passa a ser ocupado hoje pelo advogado Shigeaki Ueki, ministro de Minas e Energia durante o governo de Ernesto Geisel (1974-1979). Enredados nas denúncias, Creusa Monzani, funcionária do Teatro Fecap, Marcelo Camargo, superintendente da instituição de ensino, e Ronaldo Ramos, gerente financeiro, também foram afastados e devem ser demitidos pela nova administração.
Em 2012, professores e alunos da Fecap se uniram em ruidosos protestos contra a alardeada venda de seu centro universitário a um grupo privado. A pressão surtiu efeito e o negócio, estimado em 65 milhões de reais, foi descartado. Nem por isso a paz voltou aos corredores da centenária instituição de ensino, que criou os primeiros cursos de Economia (1934) e Contabilidade (1939) do País. Em meio à crise, o movimento de resistência tomou conhecimento de indícios de fraude nas contas da fundação. A denúncia partiu do gerente de Controladoria da Fecap, Carlos Augusto Carrara, e resultou na abertura de um inquérito pelo Ministério Público e na contratação de uma auditoria externa, a PricewaterhouseCoopers, para apurar as irregularidades.
CartaCapital antecipou com exclusividade as principais denúncias em dezembro de 2012 (clique aqui para ler a matéria), quando o promotor Airton Grazzioli, curador de fundações do Estado de São Paulo, ainda iniciava os trabalhos de investigação e a oitiva dos acusados. Em março de 2013, voltou a trazer novas revelações sobre o caso (leia a íntegra do texto), antes mesmo de auditoria ter concluído seu relatório, confirmando as denúncias de Carrara e acrescentando outras, como o pagamento irregular de despesas de viagem de parentes de Berlinck Neto e Camargo.
Tanto o Ministério Público quanto a PricewaterhouseCoopers confirmaram as suspeitas de superfaturamento em serviços de propaganda prestados pela Wapt Mídia à Fecap. Nos últimos seis anos, os pagamentos somaram mais de 10,7 milhões de reais. A empresa pertence a Creusa Monzani, funcionária do Teatro Fecap, mas até abril de 2001 tinha outro nome e quadro societário. Chamava-se Berlinck & Monzani Marketing e Representações Ltda, na qual Monzani figurava como sócia de Berlinck Neto. A manobra parece ter sido uma forma de encobrir o fato de a fundação, naquele mesmo ano, ter contratado uma empresa ligada ao então presidente da Fecap, e só destituído na sexta-feira 7.
Não foi apenas a suspeita forma de contratação da empresa, aparentemente sem tomada de preços ou licitação, que despertou a atenção do controller da Fundação. Carrara encontrou notas fiscais emitidas pela Wapt contra a Fecap por serviços realizados, na realidade, por outras empresas, e a um custo até cinco vezes menor. Da extensa relação de notas fiscais suspeitas apresentadas pelo denunciante ao Ministério Público, surgiram novas revelações. O professor de Teorias da Administração da Fecap, Jésus Lisboa Gomes, decidiu investigar aquelas emitidas para a locação de espaços publicitários nas estações do Metrô. E encontrou uma diferença de quase 4 milhões de reais.
Com base na Lei de Acesso à Informação, Gomes solicitou a relação de todas as notas fiscais emitidas pelo Metrô contra a Wapt. Descobriu que a empresa estatal cobrou cerca de 2 milhões de reais para abrigar propagandas da Fecap entre janeiro de 2007 e setembro de 2012. Mas a Wapt, intermediária na locação dos espaços publicitários, repassou para a fundação cobranças que somam 5,9 milhões de reais. Os dados foram repassados à PricewaterhouseCoopers, que teve o cuidado de checar com o Metrô a autenticidade da lista. Era verdadeira. Por recomendação da Promotoria, todos os pagamentos à Wapt foram suspensos.
O Ministério Público encontrou ainda pagamentos por serviços não realizados a outra empresa. Os repasses foram autorizados por Marcelo Camargo, superintendente da Fecap, e Ronaldo Ramos, sobrinho de Creusa Monzani e gerente financeiro da entidade. As denúncias de irregularidades nos pagamentos foram confirmadas por funcionárias do setor financeiro e gestores acadêmicos, surpresos com a contração de uma consultoria para a criação de novos cursos na Fecap sem que eles tivessem conhecimento. “A discussão sempre passa pela área acadêmica, mas ninguém sabia nada disso, nem mesmo a reitoria”, afirmou, em março, o diretor-geral da pós-graduação, Alexandre Garcia.
“Ficamos satisfeitos com a nomeação de Ueki, que teve uma postura correta na apuração das irregularidades e na construção de um caminho para resolver a crise”, afirma o professor Jésus Gomes, um dos principais articuladores do movimento que exigia o afastamento de Berlinck Neto. “Mas esperamos que o Ministério Público, em parceria com a nova cúpula da Fecap, dê continuidade à investigação e ajuíze uma ação indenizatória contra os acusados, para tentar reaver o dinheiro desviado.”
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