Política

Governo admite que recebeu oferta de vacinas da Pfizer, mas diz que acordo seria frustrante

Em nota, Executivo diz que empresa americana impôs ‘cláusulas leoninas e abusivas’ e tenta ‘desconstruir trabalho de imunização’ no Brasil

Governo admite que recebeu oferta de vacinas da Pfizer, mas diz que acordo seria frustrante
Governo admite que recebeu oferta de vacinas da Pfizer, mas diz que acordo seria frustrante
Vacina da Pfizer é aplicada em hospital na Alemanha. Foto: Ina Fassbender/AFP
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O governo federal admitiu que recebeu oferta de vacina pela empresa americana Pfizer, mas alegou que o acordo “causaria frustração” aos brasileiros pela baixa quantidade de doses e por regras “abusivas”. A declaração consta em nota publicada na noite de sábado 23, assinada também pelo Ministério da Saúde.

 

Segundo o texto, o governo recebeu uma carta do CEO da Pfizer, Albert Bourla, em 12 de setembro de 2020, e reuniu-se várias vezes com os seus representantes, mas não houve consenso.

“Apesar de todo o poder midiático promovido pelo laboratório, as doses iniciais oferecidas ao Brasil seriam mais uma conquista de marketing, branding e growth para a produtora de vacina, como já vem acontecendo em outros países. Já para o Brasil, causaria frustração em todos os brasileiros, pois teríamos, com poucas doses, que escolher, num país continental com mais de 212 milhões de habitantes, quem seriam os eleitos a receberem a vacina”, afirmou o governo.

Em seguida, o governo elenca cinco trechos que apresentam o que chamou de “cláusulas leoninas e abusivas” que “criam uma barreira de negociação e compra”.

  • Que o Brasil renuncie à soberania de seus ativos nos exterior em benefício da Pfizer como garantia de pagamento, bem como constitua um fundo garantidor com valores depositados em uma conta no exterior;
  • O afastamento da jurisdição e das leis brasileiras com a instituição de convenção de arbitragem sob a égide das leis de Nova York, nos Estados Unidos;
  • Que o primeiro e segundo lotes de vacinas seja de 500 mil doses e o terceiro de um milhão, totalizando dois milhões no primeiro trimestre, com possibilidade de atraso na entrega (número considerado insuficiente pelo Brasil);
  • Que, havendo atraso na entrega, não haja penalização;
  • Que seja assinado um termo de responsabilidade por eventuais efeitos colaterais da vacina, isentando a Pfizer de qualquer responsabilidade civil por efeitos colaterais graves decorrentes do uso da vacina, indefinidamente.

Além disso, o governo diz que a Pfizer não disponibiliza o diluente para cada dose, o que ficaria a cargo do comprador. Também destaca que é a vacina que demanda a temperatura mais fria para o armazenamento e transporte, e que a empresa não se responsabilizaria pela substituição do refil de gelo seco para a conservação das doses, que deve ser reposto a cada cinco dias.

Ainda de acordo com o governo, a Pfizer não apresentou sequer a minuta do seu contrato, conforme teria solicitado em oportunidades anteriores, e não haveria data prevista para que a companhia solicite a autorização do uso emergencial da vacina à Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

A nota acusa a Pfizer de tentar “desconstruir um trabalho de imunização que já está acontecendo” no Brasil, “criando situações constrangedoras para o governo brasileiro”. O Executivo afirma ainda que “não aceitará imposições de mercado”.

“Em nenhum momento, o Governo Federal, por meio do Ministério da Saúde fechou as portas para a Pfizer. Em todas as tratativas, aguardamos um posicionamento diferente do laboratório, que contemple uma entrega viável e satisfatória, atendendo as estratégias do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, uma ação de valores mercadológicos e aplicação jurídica justa que atenda ambas as partes”, escreveu o governo.

https://twitter.com/govbr/status/1353121276508958722

CEO da Pfizer pediu rapidez na negociação

A nota do Executivo foi publicada após a emissora CNN Brasil divulgar a carta do CEO da Pfizer na íntegra. No documento, ele insistiu para que o presidente Jair Bolsonaro fechasse o negócio com rapidez, devido à alta demanda de outros países.

“A potencial vacina da Pfizer e da BioNTech é uma opção muito promissora para ajudar a mitigar esta pandemia. Quero fazer todos os esforços possíveis para garantir que doses de nossa futura vacina sejam reservadas para a população brasileira, porém, celeridade é crucial, devido à alta demanda de outros países e ao número limitado de doses em 2020”, afirmou Albert Bourlan.

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