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Reino Unido “tenta censurar” relatório sobre tortura

Documento do Senado dos EUA pode confirmar que ilhas Diego Garcia foram usadas depois do 11 de Setembro

Reino Unido “tenta censurar” relatório sobre tortura
Reino Unido “tenta censurar” relatório sobre tortura
Militares norte-americanos correm na base de Guantánamo, em Cuba. Território do Reino Unido pode ter sido usado para transportar detidos que seriam torturados
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Por Jamie Doward e Ian Cobain

O governo britânico é acusado de tentar ocultar o papel do Reino Unido na “rendição extraordinária”, antes da divulgação de um relatório da inteligência que expõe o uso da tortura nas prisões secretas dos Estados Unidos ao redor do mundo.

O relatório do Senado americano sobre o programa de interrogatórios da CIA, que deverá ser divulgado em poucos dias, vai confirmar que os EUA torturaram suspeitos de terrorismo depois do 11 de Setembro. Antes da divulgação, o presidente Barack Obama admitiu na sexta-feira: “Nós torturamos algumas pessoas. Fizemos algumas coisas que eram contrárias a nossos valores”.

Agora, em uma carta ao grupo de direitos humanos Reprieve, o ex-secretário das Relações Exteriores William Hague confirmou que o governo do Reino Unido teve discussões com os EUA sobre o que pretende revelar no relatório, que, segundo a rede de TV Al Jazira, admite que o território britânico de Diego Garcia foi usado para a rendição extraordinária.

“Fizemos representações para buscar garantias de que os procedimentos habituais para a liberação de material do Reino Unido serão seguidos caso o material do Reino Unido fornecido à comissão do Senado seja revelado”, escreveu Hague.

Cori Crider, diretora da Reprieve, acusou o governo britânico de tentar emendar informação embaraçosa: “Isto mostra que o governo britânico está tentando censurar o relatório sobre tortura do Senado dos EUA. Em inglês simples, é um pedido para que os EUA mantenham o papel da Grã-Bretanha na rendição fora do domínio público”.

Advogados que representam vários suspeitos de terrorismo detidos em Guantánamo acreditam que seus clientes foram rendidos via Diego Garcia. Documentos encontrados na Líbia indicaram que os EUA planejavam transportar Abdul-Hakim Belhaj, um adversário de Muammar Gaddafi, e sua esposa passando pelo território, um atol no oceano Índico emprestado pelo Reino Unido aos EUA. O governo negou que Belhaj tenha sido rendido via Diego Garcia, mas há suspeitas de que outros foram detidos no atol.

Crider disse que as tentativas do Reino Unido de pressionar os EUA a emendar partes do relatório “colocam a defesa do governo no caso das rendições líbias de Abdul-Hakim Belhaj e sua esposa totalmente de ponta-cabeça”.

O governo tentou constantemente impedir Belhaj de mover um processo contra ele.

“O governo protestou que os EUA ficariam irritados se esse caso de sequestro fosse a julgamento – e agora sabemos que o governo britânico está pressionando os americanos para não divulgar a roupa suja do Reino Unido. Isso expõe sua posição de litígio como mera pose”, ela acrescentou.

A confirmação de que um território britânico esteve envolvido na rendição extraordinária poderia deixar o governo de Londres vulnerável a uma ação legal. No mês passado o Tribunal Europeu de Direitos Humanos decidiu que o governo polonês ajudou ativamente o programa europeu da CIA “local negro”, em que os detidos eram interrogados em prisões secretas em todo o continente.

O tribunal concluiu que foi “estabelecido além de qualquer dúvida razoável” que Abu Zubaydah, um detido em Guantánamo que os EUA erroneamente acreditaram que fosse um membro importante da Al-Qaeda, foi levado de avião de um local secreto na Tailândia para outra prisão da CIA em Stare Kiejkuty, no norte da Polônia.

Os juízes concluíram que não apenas a Polônia foi “informada e envolvida na preparação e execução do programa [Detidos de Alto Valor] em seu território”, mas também “para todos os fins práticos, facilitou todo o processo, criou as condições para que ele acontecesse e não tentou evitá-lo”, levando os advogados a perguntarem o que mais foi usado desde então.

Leia mais em Guardian.co.uk

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