Henry Bugalho

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Henry Bugalho é curitibano, formado em Filosofia pela UFPR e especialista em Literatura e História. Com um estilo de vida nômade, já morou em Nova York, Buenos Aires, Perúgia, Madri, Lisboa, Manchester e Alicante. Por dois anos, viajou com sua família e cachorrinha pela Europa, morando cada mês numa cidade diferente. Autor de romances, contos, novelas, guias de viagem e um livro de fotografia. Foi editor da Revista SAMIZDAT, que, ao longo de seus 10 anos, revelou grandes talentos literários brasileiros. Desde 2015 apresenta um canal no Youtube, no qual fala de Filosofia, Literatura, Política e assuntos contemporâneos.

Opinião

Os 300 que não são de Esparta (liderados por Sara Winter)

É impossível não associar um movimento que visa exterminar outro grupo a terrorismo, e que tem como meta realizar avanços através do medo

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Nestas últimas semanas, vimos algumas cenas que pareciam extraídas das mais pavorosas páginas da História: de um grupo paramilitar armado marchando pelas avenidas e acampando em praças de Brasília.

Liderado pela bolsonarista extremista Sara Winter, este grupo tinha, de acordo com mensagens que circularam nos chats deste movimento, objetivos claros, dentre eles formar uma militância em defesa do Bolsonaro, com treinamento de táticas de “desobediência civil”, defesa pessoal e, o que realmente é o mais preocupante, “exterminar a esquerda do Brasil”.

Mesmo se déssemos o benefício da dúvida e não lêssemos literalmente este propósito – o que nos levaria a pensar na possibilidade de assassinatos políticos em massa, por exemplo –, certamente o espírito que motiva este grupo batizado de 300 do Brasil não é o da democracia nem do espaço da divergência racional. Pelo contrário, é um credo autoritário até o osso.

É impossível não associar um movimento que visa exterminar outro grupo a terrorismo, que, em sua concepção mais própria, tem como meta realizar avanços políticos, ideológicos ou religiosos através do medo da violência física. Sem dúvida que, se alguma organização de esquerda propagasse publicamente que deseja o extermínio de direitistas brasileiros, seus líderes e integrantes seriam rapidamente encarcerados, mas, no caso dos 300 do Brasil, como se autodenominou este grupelho liderado por Winter e que, até onde sabemos, é composto na verdade por umas 30 pessoas, eles transitavam livremente sem qualquer constrangimento pela capital do país, nas proximidades do Palácio do Planalto, do Congresso Federal e do Supremo Tribunal Federal.

 

Mas as coisas escalaram quando Sara Winter foi alvo de uma operação da Polícia Federal relacionada ao inquérito das fake news, sob supervisão do ministro do Supremo Alexandre de Moraes, que investiga notícias falsas e ameaças destinadas a ministros do STF. Segundo a própria Sara em vídeos publicados em suas redes no dia 27 de maio, a PF bateu cedo em sua casa, realizou busca e apreensão, levando seu celular e o tablet de seu filho.

A mesma militante bolsonarista que dias antes desfilava à frente dos 300… quer dizer, dos 30 do Brasil, agora ameaçava diante das câmeras Alexandre de Moraes, prometendo acabar com a paz dele, da família dele e chegando inclusive a dizer que queria “trocar socos” com o ministro na rua.

Ou seja, diante da possibilidade de punição por seus atos, Sara Winter, em vez de se acuar, fez o oposto, que aliás é o modus operandi do Bolsonaro e de seus asseclas: ela dobrou a aposta. Praticamente implorou para ser presa.

Há poucas dúvidas de que o principal intuito dela é aparecer e é até difícil afirmar se ela realmente tem de fato um compromisso ideológico com qualquer causa. Vale lembrar que até alguns anos atrás, Winter era integrante do Femen, grupo feminista radical com origem na Ucrânia. Não que seja difícil encontrar pessoas como ela, que sempre transitam pelos extremos, sempre no campo do radicalismo, mas aparentemente Sara Winter buscar criar para si capital político com fins eleitoreiros.

Isto explicaria todo o caráter teatral, quase circense dos 300 do Brasil. Todo o aspecto performático, ritualístico e simbólico visa dotar este grupo com uma profundidade que ele não possui.

O próprio nome remonta à legendária história dos 300 guerreiros espartanos que, em Termópilas, segundo Heródoto, valentemente se sacrificaram para atrasar os avanços do exército persa sob comando de Xerxes. Um sacrifício que permitiria que os atenienses e seus aliados pudessem se preparar, evacuar a cidade de Atenas, recuar com suas naus até Salamina e de lá infligir uma devastadora derrota aos persas em uma batalha naval.

Os 300 do Brasil, que na verdade são apenas uns 30, talvez queiram recriar simbolicamente este sacrifício dos espartanos e, na cabeça deles, que certamente tentarão revestir a prisão de Winter com uma narrativa épica, dirão que ela se sacrificou, tal qual o rei Leônidas e seus homens, para salvar o Brasil da esquerda malévola.

Só que a realidade não poderia estar mais longe disto. Sara Winter e os 300 estão possivelmente cometendo crimes contra a Segurança Nacional de acordo com uma denúncia feita pelo Ministério Público do DF. Não são personagens heroicos; são figuras patéticas protagonizando um espetáculo bizarro.

Os 300 de Esparta se tornaram lendas, já os 300 do Brasil serão apenas motivo de chacota e riso, mais um lastimável retrato das forças estranhas e medonhas despertadas pelo tosco conservadorismo do Bolsonaro.

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