Opinião

Reunião ministerial mostra que Bolsonaro não passa de um bolsonarista

Mesmo em meio à mais grave crise sanitária da história, no Planalto só se fala em outra coisa

Reunião ministerial mostra que Bolsonaro não passa de um bolsonarista
Reunião ministerial mostra que Bolsonaro não passa de um bolsonarista
(Foto: Marcos Corrêa/PR)
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Jair Bolsonaro não é um presidente. Não é um líder. Não é Bolsonaro. É, ele próprio, um bolsonarista. O ex-capitão não espalha fake news e teorias conspiratórias. Mas acredita, ele mesmo, nessas mentiras e teorias. A reunião ministerial que veio a público por ordem do Supremo Tribunal Federal, nesta sexta 22, reforça essa impressão.

Contrariando certa expectativa, o presidente mostrou que é exatamente o que aparenta, mesmo a portas cerradas. Não há nenhum plano oculto. A paranóia, a tacanhice, os palavrões, e a obsessão com os quartéis e o seio familiar continuam ali. Bem picotadas, suas declarações até reforçam a narrativa bolsonarista.

Sobra também absoluto desprezo pela crise coronavírus. Mesmo entre seus ministros. Em sua única menção ao coronavírus, Nelson Teich preocupado com o lucro dos hospitais privados, impedidos de realizar cirurgias eletivas. Damares Alves, temia que o STF e as feministas do Ministério da Saúde avançassem com a descriminalização do aborto. Paulo Guedes, temia a morte de CNPJs no setor aéreo. Disse ele: “Nós vamos ganhar dinheiro usando recursos públicos pra salvar grandes companhias. Agora, nós vamos perder dinheiro salvando empresas pequenininhas.”

Nem toda pauta era reativa. A preocupação do ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio, por exemplo, era destravar a legalização de resorts integrados (um singelo eufemismo para cassinos) – com o apoio de Paulo Guedes, mas não sem a objeção de Damares Alves. Ricardo Salles sugeriu aproveitar o “momento de tranquilidade no aspecto de cobertura da imprensa” para “ir passando boiada” no atropelo de normas e regras. Ernesto Araújo, destacou a chance de aproveitar a crise do covid-19 para instaurar uma “nova ordem mundial”.

Se não desmoraliza Bolsonaro junto aos seus, a gravação serve, sim, como evidência no inquérito que apura sua interferência na Polícia Federal. O presidente diz explicitamente que interferiria na PF para proteger família e amigos. “Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira.” 

Também defende armar a população por razões políticas. “Por isso que eu quero, ministro da Justiça e ministro da Defesa, que o povo se arme! Que é a garantia que não vai ter um filho da puta aparecer pra impor uma ditadura aqui!”. Terá ainda que esclarecer qual é e como funciona o seu “sistema de informação particular.” 

O ministro Abraham Weintraub, que sugeriu cadeia aos “vagabundos” do STF, também terá que se explicar. E também Damares, que ameaçou pedir a prisão de governadores e prefeitos. Já o vice Hamilton Mourão fez brevíssimas intervenções, nenhuma digna de nota. Mais vistosos foram seus risinhos  e trejeitos de canto enquanto falavam os colegas.

Naquele 22 de abril, o Brasil tinha 46 mil casos de coronavírus e pouco menos de 3.000 mortes. Um mês depois, a contaminação e letalidade aumentaram 7 vezes. E o Brasil é vice-líder no ranking mundial da doença. Poderia ter sido diferente.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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